EVIDÊNCIAS
Naquela
semana que antecedia ao dia dos pais, a professora do jardim da infância, pediu
às crianças que fizessem um desenho bem bonito para o pai e também ensinou uma
bela canção para elas cantarem no domingo, do dia dos Pais, quando iriam
entregar o lindo desenho que tinham feito.
Era uma tarde fria de agosto e Paula foi
buscar sua filha Raquel na escola e a encontrou encolhida em um canto do pátio
com os olhos vermelhos de chorar. Paula ficou apreensiva, o que teria
acontecido?
--
O que aconteceu minha filha?
--
Todos os meus colegas tem pai, eu não.
Por quê?
--
Tu tens pai sim. Ele se chama Luis Joaquim Bordado Rosado.
--
Então por que eu não o conheço?
-- Bem isso é uma história muito longa.
Falamos disso em casa. Agora vamos até a padaria e comprar um pão quentinho
para nós. Vem minha filha.
Paula queria distrair a filha, para não
precisar contar a verdade para a menina, que tinha apenas cinco anos, e que não
iria compreender sua história. Também
não queria negar o fato.
Paula sabia que tinha errado. Ela sempre foi
muito desfrutável , desde a
adolescência. Seu próprio pai havia mandado ela embora de casa, por causa de
seu comportamento escandaloso. Ela saiu de sua cidade aos 18 anos e nunca mais
entrou em contato com sua família.
Ela
era uma jovem técnica de enfermagem e se
apaixonou perdidamente pelo doutor Joaquim, que era um homem alto e forte,
moreno de olhos verdes, lindo e com um sorriso sedutor, mas ele era casado e tinha dois filhos.
Ela tinha conhecimento de que Joaquim jamais
deixaria sua família, mas queria conquistá-lo de qualquer jeito. E conseguiu sair
com ele algumas vezes. Desses encontros nasceu sua linda filha Raquel. E o
doutor a reconheceu como filha, e, inclusive, queria criar a menina. Mas Paula
não quis e o proibiu de se aproximar dela.
Paula foi enviada para outro setor do hospital. E afastou-se definitivamente dele. Ele sempre esteve consciente a existência da
filha, apenas não a visitava, mas mandava mensalmente através de seu advogado
uma boa quantia em dinheiro para o sustento de Raquel, e assim nada faltava à
menina. E procurava saber se ela estava bem, e muitas vezes a observava de
longe, na entrada de escola.
Naquela tarde logo que elas chegaram a casa
Paula preparou um lanche para filha e ligou a TV e sintonizou no canal de desenhos que ela
gostava, e não voltaram a falar mais do assunto.
Mas Raquel não havia esquecido, só não queria
aborrecer sua mãe. Sua mãe era muito nervosa e por qualquer coisa ela gritava
com a filha. E naquela noite antes de dormir a menina idealizou como seria seu
pai. E em sua imaginação infantil, viu o pai como um príncipe dos contos de
fadas, que no fim sempre salvava a princesa do perigo. E dentro dela nasceu a
esperança de que um dia ele viria visitá-la. E passou a esperá-lo em datas
especiais, no seu aniversário...Natal...Páscoa...
Os anos foram passando e Raquel foi se
decepcionando com seu pai e por tabela com todos os homens do planeta. Pois sua mãe tivera vários namorados e ela
assistiu a muitas brigas de sua mãe com os seus namorados, e todos eles tinham
ido embora.
Raquel sempre foi muito quieta, não ia a festas
e tinha poucos amigos. Agora com vinte anos, as suas únicas amigas eram Lizandra e Gabriela que namoravam Tiago
e Leandro. E Carla, irmã de Tiago, que era sua colega desde o colegial.
Era com esse grupo ela saia algumas vezes.
Nunca tinha se interessado em namorar, seu conceito a respeito do gênero
masculino era muito baixo. Não acredita que os homens pudessem amar.
Mas Tiago chamava muito sua atenção. Ele era
um cara legal, alegre, divertido e parecia gostar de Lizandra. Pelo menos eles
não brigavam tanto, como Gabriela e Leandro. E ela não percebia porque aqueles
dois, Leandro e Gabriela ainda estavam juntos. Estavam sempre de mau humor e
fazendo pirraça um para o outro.
Raquel entendia que o amor deveria levar a
paz, a harmonia entre o casal. Se não fosse assim não era amor. Mas como ela
nunca tinha amado, não podia dar opinião. Apenas analisava os amigos.
Um dia Carla disse a Raquel:
-- Meu irmão vai terminar com a Lizandra.
-- Como assim? Ele te falou alguma coisa?
-- Não, mas eu o observo e vejo o jeito dele.
E o conheço muito bem.
-- Está imaginando coisas... Ele gosta dela!
-- Acho que não.
-- Coitada! Acho que ela gosta muito dele.
-- Não sei não.
-- Por que tu estás me falando isso?
-- Nada... Só acho que ele está ligado em
outra pessoa...
-- Vamos torcer para que eles continuem.
Formam um lindo casal, não achas Carla?
-- Talvez...
Os dias passaram, o fim do ano estava próximo
e havia muito que estudar para as
provas. E foi um longo tempo que Raquel não saiu com a turma. E nesse período
foi que Tiago terminou o namoro com Lizandra.
Lizandra estava inconsolável, queria Tiago de
volta. E foram tantos os arranjos que eles reataram o namoro. Mas Raquel notava
que não era mais a mesma coisa.
Ela comparava a relação de Tiago e Lizandra
com uma peça de cristal que tinha se quebrado, e que foi colada, mas não ficou
igual ao que era antes. A marca permanecia.
Elas estavam de férias, o Natal estava se
aproximando e Raquel e Carla passavam juntas. Raquel costumava dormir na casa
da amiga e isso fez com que ela e Tiago conversassem mais.
Quando Raquel estava com Carla, Tiago dava um
jeito de não sair e ficava por ali esperando a oportunidade de participar da
conversa delas. Elas se davam muito bem e riam muito das bobagens que diziam e
faziam.
Os pais de Carla gostavam muito de Raquel,
que era uma moça serena e muito educada e zelosa com todos. Mesmo sabendo que
Paula, a mãe de Raquel, era muito namoradeira, eles percebiam que a filha era
muito ponderada.
Uma tarde, quando estava de folga em casa, Tiago foi questionado por sua mãe:
-- Tu gostas muito da Raquel?
-- Sim
eu gosto...
-- Mas não queres ser apenas amigo dela.
-- Por que tu estás falando isso?
-- Pelo jeito como a olhas.
-- Eu... Como eu olho para ela?
-- Com um jeito diferente, e que eu nunca vi
quando estás com a tua namorada.
-- A Lizandra... A coisa está esquisita mãe.
Eu tinha terminado tudo, e ela implorou para voltarmos. Disse que precisávamos
de outra chance. Ok. Concordei, mas não está legal.
-- Claro que não está legal. Tu não gostas
mais dela. Teus olhos estão em Raquel, até tua irmã já notou.
-- Bah... Ela não falou nada para a Raquel,
falou?
-- Acho que não. Pedi para ela não se intrometer
nisso. É coisa tua. Tu que precisa
resolver, é a tua vida. Só te peço que não namores a Raquel se não tiveres
certeza do que queres.
-- Eu preciso pensar sobre isso. Não sei
mesmo. Mãe eu estou indo, prometi ao pai
que não me atrasaria.
Ele deu um beijo em sua mãe e saiu para a
loja de seu pai.
Tiago estudava Ciências Contábeis à noite e
durante o dia trabalhava na empresa do pai, uma Revenda Multimarcas de Motocicletas. E ele
gostava muito de estar lá vendendo as motos, falando sobre o desempenho de cada
máquina. Ele mesmo só andava de moto.
Naquela noite depois da faculdade, já em
casa, Tiago tomou um copo de leite e foi
para seu quarto. Deitou-se, mas não conseguiu dormir. Aquilo que a mãe havia
falado não saia do seu pensamento. Ele
sabia que o namoro com Lizandra não
tinha mais jeito. Antes ela exercia uma sedução sobre ele, mas agora não
existia mais nada. Ela aparentava ser apaixonada por ele, mas amor unilateral
não dava certo.
Então decidiu que após as festas de fim de
ano, ele teria uma conversa definitiva com ela. Mas quanto a ele gostar de
Raquel... Claro que ele gostava dela, ela era uma garota muito legal, sempre na
dela, não se envolvia em fofocas, era divertida, inteligente, espontânea,
elegante e muito bonita... Ela tinha um rosto perfeito, aqueles olhos verdes
eram fascinantes, os cabelos escuros e muito sedosos, e a boca... Ah! A boca
era sedutora. Raquel era muito provocante, e despertava nele o apetite
sexual...
E desde aquele dia, ele passou a olhar para
Raquel com outros olhos. E começou a descobrir mais predicados nela. A lista já
era bem extensa. E se deu conta de que ele ficava nervoso quando a via, seu
coração se agitava e seu desejo também.
Mas com Raquel não poderia se enganar, não
poderia brincar. Se ele se aproximasse dela teria que ser para assumir um
compromisso sério. Ele sabia que dona Carmem e seu Ângelo, seus pais, não o
perdoariam.
Tiago decidiu deixar rolar, ia dar um tempo
depois que terminasse seu namoro com Lizandra. Afinal eram todos da mesma
turma. Mas ia ficar de olho em Raquel.
Raquel por sua vez, notou que Tiago a olhava
muito, a encarava algumas vezes e ela sustentava o olhar quando estavam
sozinhos. Ela tentava disfarçar para Carla não notar. Às vezes ela sentia suas
faces ruborizar de tão intenso que era o olhar de Tiago.
Aquele Natal ela aceitou o convite de dona
Carmem para ficar com eles. E Raquel aceitou com alegria, pois nos últimos anos
ela tinha ficado só em casa. Sua mãe sempre tinha uma festa para ir.
A família toda participou da missa do Galo, e
depois foram para casa e comemoram em torno da mesa, onde havia uma variedade
de pratos. E só a meia noite que distribuíram os presentes.
Ela tinha comprado presentes para cada um
deles. Ela nem estava preocupada em receber algum presente, ela só queria
demonstrar gratidão aquela família que era tão acolhedora e amorosa com ela. Tiago
ainda estava comprometido com Lizandra. Ele deveria ter ido passar o Natal e o
fim do ano com a família dela na fazenda do avô. Mas quando soube que Raquel
tinha aceitado o convite de sua mãe, mudou os planos.
Ele estava feliz. O presente que ele escolheu
para dar para Raquel foi um livro que ele sabia que ela estava querendo. E ela
gostou muito, e entregou para ele uma caixa de madeira entalhada para guardar
pequenos objetos. Ele também tinha gostado muito.
Aquela noite foi memorável, ficaram
conversando até tarde. Seu Ângelo e dona Carmem foram se deitar e deixaram os
jovens bebendo e conversando. Carla acabou dormindo no sofá, mas eles queriam
aproveitar o tempo e flertaram muito, até quase o amanhecer, quando trocaram um
beijinho de boa noite.
Raquel também aceitou o convite para o fim do
ano. Iam todos para a praia. Foi incrível! Era uma praia pequena, com casas
simples, mas um lugar sensacional. E a noite depois da meia noite, Tiago
convidou as “garotas” para uma caminhada na praia.
Era uma noite de lua cheia, o céu limpo e
estrelado. Tiago caminhava ao lado dela, enquanto que Carla corria feito uma
criança. E carinhosamente ele pegou sua mão e caminharam como se fossem
namorados.
E como Carla estava bem distante, ele ousou
beijar sua face e dizer:
-- Que tenhas um ano cheio de coisas novas,
de coisas boas e com muitas alegrias.
Ela olhou para ele sorrindo e disse:
-- Obrigada! Desejo o mesmo para ti.
Tiago parou e olhou para ela e a beijou nos lábios com ternura.
E daquele momento em diante o clima entre
eles mudou. Havia um novo entendimento. Não eram namorados, mas também não eram
apenas amigos.
Retornaram a cidade. Raquel e Tiago não se encontraram mais.
Carla tinha voltado para praia com sua madrinha. Iria ficar pelo menos 30
dias. E neste período Raquel e Tiago ficaram sem se ver. Ele estava com
saudades dela, pois adora a sua companhia. Ela por sua vez também estava triste
por não poder estar com ele. Raquel até
pensou em aparecer por lá, com a desculpa de fazer uma visita a dona Carmem,
mas não teve coragem.
E quando Carla voltou da praia, tinha uma
novidade para contar. Ela havia conhecido um cara muito bacana e estavam
namorando. Ele se chamava Cristiano. Era estudante de direito e morava ali
perto, no mesmo bairro.
Raquel ficou feliz por sua amiga, mas agora
ficaria mais difícil para ela ir para casa da Carla, já que ela estava sempre saindo com o
namorado.
Os casais de namorados saiam juntos,
convidavam Raquel para ir com eles, mas ela se afastou da turma, não queria ficar “segurando vela”. E os fins
de semana de Raquel era ficar sozinha em casa, lendo ou assistindo TV e sempre
trancada em seu quarto.
Sua mãe saia sempre e não a convidava para ir
com ela. E ela tinha até um pouco de vergonha do comportamento de sua mãe, que
saia para a balada e sempre tinha um novo namorado ou simplesmente trazia para
casa um cara para dormir com ela.
Raquel reconhecia que sua mãe era “muito
gata”, e que tinha só quarenta e três anos e gostava de se divertir, mas não
concordava com a mãe, sobretudo, no seu jeito de pensar e viver. Evitava
brigas, mas essa mania de levar para dentro de casa homens estranhos a irritava
profundamente.
Raquel tinha vontade de ir morar sozinha. Mas
com que dinheiro? Sabia que seu pai ainda mandava uma boa quantia por mês, mas
era sua mãe que administrava. Não faltava nada para ela, até a faculdade ele
pagava, mas Raquel só queria viver a sua vida, afastada a mãe.
Os dias passavam e Carla não tinha mais tempo
para amiga. As aulas logo reiniciariam, mas Carla havia trocado de turno. Iria cursar
a noite, pois assim estaria junto com Cristiano.
Carla e Cristiano estavam muito apaixonados
um pelo outro. Era um namoro do jeito que Raquel achava que deveria ser. Eles
estavam felizes, não brigavam e passavam todo o tempo que podiam juntos.
Cristiano estava no penultimo semestre, e ele
era muito compenetrado e estudioso, e embora eles tivessem se conhecido há
pouco tempo, ele estava pensando no futuro deles. Fazia planos de noivado e
casamento dentro de no máximo dois anos.
As aulas recomeçaram. Raquel que sempre
gostou de estudar, andava desanimada. Sentia falta de Carla, sentia-se muito
só. E distante de Carla, e por tabela, também estava distante de Tiago. Raquel
estava deprimida e reservada. Algo havia mudado nela.
O tempo corria...
Até que um dia Raquel recebeu uma ligação de
Carla, que desesperada falava:
-- Raquel o Tiago sofreu um acidente.
-- O quê? Um acidente?
-- Sim, e muito grave. Eu estou com muito
medo...
-- Onde tu estás?
-- No Hospital Público. Trouxeram ele para cá...
-- Estou indo... Espera-me no saguão...
Era um dia de sábado, ainda era cedo, devia
ser 9 horas. Raquel vestiu a primeira roupa que encontrou, jogou uma água no
rosto, escovou os dentes e saiu apressada. Ela não morava muito longe do
hospital.
Em quinze minutos Raquel estava chegando.
Entrou no saguão e logo avistou Carla, foi até ela e a abraçou e ambas
choraram. Dona Carmem estava por ali e também chorava.
Raquel queria saber o que tinha acontecido e
então seu Ângelo, que tinha ido até o local do acidente relatou:
-- Tiago vinha na mão dele, na velocidade
permitida e trafegava na via junto a calçada. E de repente uma pessoa se atirou
na frente da moto e ele precisou dar uma guinada para não atropelar a mulher e
foi pego pelo carro que trafegava na faixa ao lado. Ele voou com o impacto e
caiu em cima de um carro a cerca de dez metros dali e foi impulsionado para o
chão.
-- Que horror – disse Raquel – e como ele
está?
-- Está sendo atendido ainda. Foi para sala
de cirurgia. Precisamos esperar.
-- Muito tempo?
-- Não sei...
-- Aqui perto tem uma igreja. Carla vem
comigo, vamos rezar e pedir por Tiago.
-- Boa idéia. Eu e teu pai vamos ficar aqui aguardando.
Quando elas retornaram, encontraram seu
Ângelo e dona Carmem mais sossegados. O médico tinha vindo falar com eles e
Tiago estava na sala de recuperação. A cirurgia tinha sido perna esquerda.
Mas Tiago permanecia na UTI e já fazia uma
semana. Apenas seus pais podiam entrar para vê-lo. Mas Raquel todos os dias, depois da faculdade, ia para o
hospital. Ficava aguardando noticias dele, ou oportunidade de entrar para olhar
um pouquinho para ele.
Naquela tarde dona Carmem saiu da UTI, muito
preocupada. Tiago estava com muitas
dores, a perna operada não estava bem. Ela estava achando que tinha havido um
erro médico no atendimento de emergência, ou talvez ele tivesse algo a mais que
não tivesse sido detectado.
Ela estava telefonando para seu marido. Pedindo
que viesse ao hospital, pois tinha uma coisa errada. Raquel tentou acalmar dona
Carmem, quando veio a idéia de ir falar com seu pai, que era um médico muito
conceituado. E disse:
-- Meu pai é ortopedista, e muito afamado. Eu
nunca estive com ele, porque ele nunca me procurou. Só me manda dinheiro. Se a
senhora permite vou pedir para ele vir examinar o Tiago, posso?
-- Sim minha querida. Mas tu farias isso, ir
atrás do pai que nem te conhece?
-- Sim, eu vou. É por uma boa causa. Nós
queremos ver o Tiago bem, não é verdade?
-- Sim. Aprecio tua coragem e a estima que
tens por meu filho...
-- Eu amo vocês como se fossem a minha família.
A senhora sabe como é a minha mãe...
-- Nós também te amamos e a consideramos como
da família.
-- Estou indo lá. A senhora vai ficar bem?
Ah... Seu Ângelo está chegando. Assim saio mais tranqüila.
Raquel abraçou dona Carmem e deu um beijo em
sua face, acenou para seu Ângelo e saiu.
E Raquel pegou seu celular para descobrir o endereço do consultório dele e o telefone, pois
ela sabia muito pouco sobre ele. Pegou um taxi, e foi para Clinica de Ortopedia
de seu pai. Era um prédio moderno e muito bonito. Mas isso não a inibiu.
Na portaria não a queriam deixar entrar, pois
ela não tinha consulta marcada. Mas isso não fez Raquel recuar. Ela pediu para
falar com a secretária e muito
imperativa disse:
-- Eu preciso falar com o Dr. Joaquim. É
urgente. Diga a ele que quem está aqui é a Raquel, a filha de Paula. Eu vou
ficar esperando a tua resposta aqui em baixo.
Raquel esperou um pouco e logo foi convidada
para subir para a sala de espera no consultório. E lá esperou mais um pouco. E
foi chamada.
Ela foi conduzida para uma saleta, e não para
o consultório. Raquel estava nervosa. Tinha sido tudo tão de repente, que agora
não sabia o que dizer para aquele homem, um estranho, mas seu pai.
Ele entrou e parou e olhou para ela. Ele
também parecia apreensivo. Então Raquel tomou a iniciativa de falar:
-- Oi... Eu estou aqui...
-- Tu és igual a tua avó. Não te parece nem
um pouco com Paula.. Mas és igual a
minha mãe. Os mesmos olhos... Me dá um
abraço...
Raquel não se mexeu. Não esperava uma atitude
dessas daquele homem, que nunca quis conhecê-la. E falou:
-- Bem, eu estou aqui porque um amigo meu
sofreu um acidente de moto, ele foi para emergência e está na UTI, passou por uma cirurgia na perna, mas
continua com muita dor e pouca sensibilidade. Então estou aqui porque sei que
tu és muito bom e eu vim te pedir ajuda.
-- Mas onde ele está? Não é em todos os
lugares que eu posso atender. Somos credenciados em determinados hospitais. Não
é assim... Eu não posso interferir no tratamento de um colega, ainda mais se
ele está na UTI.
-- Então está certo. Se não podes... Obrigado
e desculpe por tomar teu tempo.
-- Raquel! Minha filha, eu preciso de mais
informações. O nome do rapaz, do hospital,
do médico que está cuidando dele. Eu tenho muitos amigos, e talvez eu
possa chegar até ele. Eu quero ajudar, porque percebi que esse rapaz é muito
importante para ti.
-- Sim, eu gosto muito dele.
-- Vamos combinar para logo mais nos
encontrarmos. Tu és minha convidada, vamos jantar juntos, e tu me traz essas
informações e todas mais que puderes. Certo?
-- Sim. Obrigada pai.
-- Me passa o numero do teu telefone. Esse é
o meu. Aguarda que eu te ligo.
-- Ok. Tchau...
-- Espera... Não saia assim sem me dar um
abraço...
E Raquel atendeu ao pedido do pai e o abraçou
e ele a apertou em seus braços e depois a afastou e a beijou na testa. Raquel
ficou emocionada e percebeu que ele também estava. Ele segura suas mãos. Após
alguns minutos ele a liberou e Raquel saiu com o coração aos pulos, suas mãos
tremiam e seus joelhos também.
Depois que saiu do prédio ela se encostou a
uma parede e esperou ficar mais firme das pernas para seguir. Tomou um taxi e
voltou para o hospital.
Ao chegar encontrou seu Ângelo e dona Carmem
parados no corredor próximo a UTI com lágrimas nos olhos. Ela se aproximou e os
abraçou e perguntou:
-- O que aconteceu com Tiago?
-- Ele está na mesma, com muitas dores, Vão
induzir o coma... – falou seu Ângelo.
Então Raquel relatou para eles a conversa que
tinha tido com seu pai. E pediu para eles todas as informações que tinham para
passar para o pai. Foi neste momento que Raquel pensou:
-- Ele me convidou para jantar e é para eu
levar todas as informações para ele. Mas se vocês conversassem diretamente com
ele? Que acham de ir também?
-- Não. – disse dona Carmem—Hoje tu levas as
informações que ele pediu. E pergunta se ele deseja conversar conosco.
-- Sim. Vou perguntar para ele. Mas eu acho
que ele vai querer passar o Tiago para a Clínica dele.
-- Se for para o bem do meu filho, a gente dá
um jeito – disse dona Carmem.
-- Obrigado Raquel – disse seu Ângelo – Tu és
um anjo na vida de meu filho.
Por volta das 20h o telefone de Raquel tocou,
era seu pai.
Joaquim a levou em uma cantina italiana. Era
um restaurante pequeno, acolhedor e com uma massa magnífica. Comeram e depois
conversaram. Raquel passou todas as informações que tinha sobre Tiago.
Seu pai
anotou e depois perguntou sobre os recursos da família. E Raquel disse
que eles tinham plano de saúde e que Ângelo era comerciante, tinha uma loja de
motos. Que moravam em uma casa muito boa, que era propriedade deles.
Joaquim não fez mais perguntas, apenas marcou
para que no dia seguinte eles fossem conversar com ele às 10h, na Clinica. Ele
estaria esperando por eles no
consultório.
Então se voltou para a filha e fez muitas
perguntas. Raquel estava muito reservada, e respondia com monossílabos. Até que
ele disse:
-- Eu sempre me preocupei contigo. Eu já era
casado quando conheci tua mãe, que era muito bonita e atraente. Eu era muito
jovem e fui fraco e não resisti aos
encantos de Paula. E ficamos algumas
vezes juntos. Então ela engravidou, e eu me assustei. Eu já tinha dois filhos
pequenos e amava minha esposa e tinha medo de perdê-la.
-- Entendo... – comentou Raquel.
-- Tua mãe era muito namoradeira e deixava os
homens loucos por ela. Não foi só comigo que ela andou. Ela não servia para
casar. Desculpe-me, mas essa é a verdade.
-- Eu sei, até hoje ela é assim. Eu não gosto
do jeito como ela vive. Ela ainda é muito bonita, gosta de ir para a balada e
sempre volta acompanhada. E eu não gosto disso. Fico trancada em meu quarto.
Ah... Um dia saio de lá.
-- E esses caras te molestam?
-- Não. Fico trancada. E quando posso durmo
na casa de minha amiga Carla, que é irmã de Tiago. Como tu tinhas certeza de
que eu era tua filha?
-- Não tinha. Mas o fato é que quando ela engravidou,
resolveu ficar sossegada, e eu fui o ultimo que esteve com ela, então...
-- E fez DNA?
-- Não. Resolvi assumir o teu sustento. Por
que se eu não fizesse isso, não sei como teria sido a tua vida.
-- Obrigada. É por isso que nunca quis me
conhecer?
-- Não! Foi Paula que nunca deixou. Até
propus para Paula deixar para mim a tua criação. Eu tinha falado com Olivia,
minha esposa, e ela tinha aceitado.
-- Ela que não quis?
-- Exatamente! E o dinheiro que ela recebia?
Ela não queria perder. Tu disseste uma
coisa que me deixou preocupado, que tens vontade de sair de perto de tua mãe? É
isso?
-- Sim. Eu tenho vergonha do modo de vida
dela.
-- Acredito. Hoje eu tive a certeza de que tu
és mesmo minha filha. Pois tu és igual a minha mãe, até no jeito de falar. E és
muito diferente de Paula. Se tu aceitas, eu tenho um apartamento de um quarto,
mobiliado que é de aluguel. E ele está desocupado. Se quiseres podes morar lá,
e eu vou falar com meu advogado para passar diretamente para ti o cheque de
mando todos os meses.
-- Eu quero. Obrigada. Poderemos nos ver de
vez em quando? Sempre sonhei em encontrar com meu pai.
-- Sim querida. Hoje eu sou viúvo. Meus
filhos estão estudando na Inglaterra e vivo sozinho. Será uma alegria sair
contigo. Vou te levar para conhecer tua avó. Ela sabe de tua existência. Não
sei viver em meio a mentiras. Aliás, como já disse, minha família sempre soube, e
teus irmãos sempre tiveram o desejo de te conhecer.
Conversaram mais um pouco e depois ele a
deixou em casa.
Naquela noite Raquel não conseguiu dormir.
Seus pensamentos giravam, seu coração se acelerava. E lembrava-se do príncipe
que chegava para salvar a princesa. Ela estava muito contente. No outro dia bem
cedo, ela ligou para dona Carmem, avisando do encontro de que deveria ter com
Dr. Joaquim.
Raquel foi para faculdade e depois foi ao
hospital como de costume. Ao chegar ela soube que Tiago estava sendo removido
para a Clínica do D. Joaquim. Então foi para casa.
Naquela tarde sua mãe estava de folga. E
Raquel aproveitou e contou para sua mãe que iria morar sozinha. Que tinha
conhecido seu pai. E que Tiago iria ser tratado por seu pai. Ela estava cheia
de esperanças.
Paula não disse nada. Apenas escutou o que
sua filha tinha a dizer. Ela sabia que Raquel era o oposto dela. Muitas vezes
discutiram por causa disso. E pensava que era melhor a filha buscar seu próprio
caminho. Não ia interferir. Não queria brigar.
Tiago foi
operado novamente, e talvez ele ficasse com alguma seqüela. Ainda era
muito cedo para prever as conseqüências. Mas ele estava bem. As dores tinham
passado e ele estava em franca recuperação.
Raquel saiu da casa de sua mãe, e estava
muito alegre em seu apartamento, que era bem perto da casa de Carla, na mesma
rua a três quarteirões de distancia.
Tiago foi para o quarto, e Raquel passava as
tardes com ele. Conversando, contando fatos, dizendo bobagens, mesmo preocupada
com ele, Raquel conseguia disfarçar e ser divertida. Os pais de Tiago percebiam
o bem que aquela moça estava fazendo filho. E o Dr. Joaquim todos os dias
visitava o jovem Tiago.
E quando Tiago recebeu alta do hospital, e foi para casa, Raquel praticamente se mudou
para a casa de sua amiga. E ficava com Tiago o tempo todo. Carla parava pouco
em casa. Os fins de semana ela ia para a casa dos pais de Cristiano, que
moravam num sitio a 100 km da capital.
Naquele domingo os pais de Tiago estavam
fazendo um churrasco em comemoração a recuperação do filho. E tinha um
convidado especial, além de alguns amigos do filho.
Raquel não tinha idéia quem seria o convidado especial, e quando seu
pai chegou ela o abraçou muito contente. E foi então que descobriu o seu pai
não tinha cobrado por seu serviço. O pagamento foi relativo apenas ao material
usado, que foi coberto pelo plano de saúde.
Raquel ficou orgulhosa de seu pai. Ele era um
homem de bom coração, ajudava quem necessitava sem pensar em retribuição
financeira. Ele era muito rico e sua clinica muito bem conceituada.
O tempo passou e Tiago estava em uma cadeira
de rodas. Fazia fisioterapia para recuperar alguns movimentos, mas tinha ficado
com uma perna mais curta do que a outra como conseqüência da quebradura que
teve no tornozelo. E depois teria que usar um apoio para se locomover.
E isso o deixou arrasado.
Ele amava muita a Raquel. Ela era uma garota linda e sincera. E nos
momentos mais difíceis ela tinha ficado ali junto dele, segurava sua mão, acariciava
seus cabelos e sempre o olhava com ternura. Sempre com uma palavra de ânimo e
esperança.
Não era com Lizandra que jurava amor eterno e
na primeira semana depois do acidente sumiu. E ele que tinha continuado com o tal namoro por “pena” dela.
Embora Tiago estivesse bem, apenas precisando
de apoio para caminhar, Raquel continuava a visitá-lo e ficando com ele nos
sábados à noite e aos domingos.
Ela estava sempre muito perto dele e
demonstrava abertamente a paixão que sentia por ele. E ele queria resistir aos
seus encantos, mas não conseguia. E em uma noite enquanto eles assistiam um filme ele se aproximou mais dela,
tomou sua mão e isso fez ela olhar para ele.
Então ele se achegou bem a ela, a olhou nos
olhos e seus lábios se tocaram e ele a beijou com ternura, e descobriu o gosto
daquele beijo, e sem poder resistir, ele aprofundou o beijo, forçando ela abrir
a boca para invadi-la e absorver todo o sabor daquela boca provocante. Afastou-se um
pouco, olhou para aquele lindo rosto e sussurrou palavras de amor. Retomou o
beijo e se perdeu de tanto amor.
Raquel se entregou ao beijo e aos carinhos de
Tiago. Seu corpo tremia e sua pulsação estava a mil. Isso era amor... Nunca
tinha imaginado que um beijo pudesse causar tanta emoção, tanta loucura. E
procurou desesperadamente retribuir o beijo. Também disse coisas para ele, coisas
que estavam guardadas as sete chaves em seu coração.
Era tanta emoção que ela chorou. Quando Tiago
percebeu que ela estava chorando ficou assustado. Ele tinha sido rude para com
ela. Sabia que ela nunca tivera um namorado e que tinha problema em relação ao
sexo masculino. Ele tinha sido imprudente.
-- Tu estás chorando... Desculpe, eu fui
muito grosseiro contigo...
-- Não! Não é isso. Eu que sou uma boba... Eu
gostei do teu beijo... Fez uma revolução dentro de mim.
Tiago sorriu e a abraçou. E continuaram a ver
o filme. Mas Raquel não prestou mais atenção ao filme. Olhava para Tiago e que
também olhava para ela. Queria ser
beijada outra vez e o provocou e entre eles
rolou muitos beijos e carícias um pouco mais ousadas.
Estava chovendo. Ela tinha que ir embora. Era
quase meia noite. Raquel se despediu de foi para seu apartamento.
Em sua cama, Tiago não conseguia dormir e
pensava em Raquel... No ardor daquele beijo... E como ela era perfeita, tinha
um corpo lindo e era doce e meiga, carinhosa e respondia com sinceridade aos
seus avanços. Nossa! Ele quase tinha avançado o “sinal”. Isso não poderia mais
acontecer. Mas estar tão perto dela, sentir seu perfume e ter que resistir, era
demais. Ele estava louco por ela. Quer dizer, sempre foi... Sua mãe já o tinha
alertado e ele nem tinha se dado conta que Raquel era o amor de sua vida.
O que ele faria?
Se estava tão evidente que ele a amava...
Não podia deixar ir adiante. Raquel merecia
um cara perfeito, não um aleijado como ele tinha ficado... Ele seria um estorvo
na vida dela. Teria que apagar as evidências, desfazer os rastros e libertar
Raquel para ela ser feliz.
Raquel chegou ao seu apartamento, tomou um
banho quente para se livrar do frio úmido. Fez um chá e sentou no sofá pensando
no que tinha acontecido entre eles. E o
telefone tocou, era Tiago perguntando se estava tudo bem com ela. Ele sempre foi
assim em relação a ela, telefonava preocupado em saber se estava tudo bem.
Ah... Ele era um amor...
E
Raquel continuou pensando, lembrando o que tinham dito enquanto se
beijavam e se acariciavam... Tiago tinha dito “eu te amo”, ela tinha escutado
perfeitamente, e ela também declarou a ele o seu amor. Ele era tão carinhoso,
tão gentil e aquele beijo a tinha enlouquecido. Agora entendia porque as
“coisas pegavam fogo” no namoro. O que tinha sido aquilo!
Se ele não tivesse parado ela teria se
entregado para ele, ali mesmo na sala... E agora! Será que estavam namorando?
Não tinha nem idéia... E não ia perguntar para ninguém. O que tinha acontecido
era segredo deles. Dizia respeito apenas a eles dois.
Bem, depois disso, ela não iria passar o domingo lá. Os pais de Tiago
não estariam em casa, eles iam ao aniversário de quarenta anos de casado de um
casal amigo. Seria um almoço no clube.
Era madrugada quando Raquel foi para cama.
Dormiu e acordou tarde no domingo. Estava chovendo e muito frio. Levantou,
tomou café e ligou seu computador. Navegou pela internet, mas não prestou
atenção em nada que viu. Seu pensamento estava em Tiago.
Será que ele iria ligar?
Mas quem ligou foi dona Carmem:
-- Oi Raquel. Tudo bem?
-- Oi, tudo certo...
-- Que horas pretendes vir para cá. O Ângelo
vai te pegar.
-- Bah... Não sei acordei tarde... Ainda
estou de pijama...
-- Tu sabes que temos uma festa para ir, e eu
estou preocupada com o Tiago. Ele não acordou muito bem, e eu ficaria mais tranqüila
se tu estivesses aqui com ele.
-- O que ele tem?
-- Ele diz que não tem nada, mas está muito
estranho... Está abatido, com os olhos fundos... Bem “pra baixo”...
-- Certo, Eu me visto rápido, em quinze
minutos estou pronta... Não precisa vir me pegar. Não está mais chovendo, eu
vou a pé.
-- Obrigada. Nós já estamos saindo, queremos assistir a
missa com a renovação dos votos do casal. Tem uma lasanha pronta. Só precisa
aquecer...
-- Ok. Tchau...
Quando Raquel olhou para Tiago, ele entendeu
a preocupação de sua mãe. Ele realmente estava muito abatido, estava distante e
muito calado. E logo que ela chegou, ele pediu licença e foi para seu quarto
com desculpa que sua perna estava doendo. Iria ficar na cama com a perna em
repouso e aquecida pelas cobertas. Estava muito frio.
Raquel não disse nada, apenas ficou olhando
ele se afastar.
Caramba! Nem um sorriso ele tinha dado para
ela, apenas resmungou um bom dia. E tão pouco olhou para ela... E agora? O que
ela deveria fazer? Ficar na sala assistindo TV, ou ir lá, no quarto tomar
satisfação dele?
Resolveu ficar quieta na sala. Talvez ele
estivesse mesmo com dor e essa reação dele não tivesse nada a ver com ela.
Aqueceu a lasanha, arrumou a mesa e foi
chamá-lo:
-- A tua mãe deixou uma lasanha. Está
aquecida... Queres almoçar aqui?
-- Estou sem fome...
-- Ah não! Isso está demais. Como não vai
comer. Pelo menos um pouco, eu te trago aqui. Assim não pega frio na tua perna.
-- Obrigado, mas não precisa...
-- Já volto.
Raquel arrumou o prato dele em uma bandeja própria para cama
e levou para ele. Ajeitou junto dele para que ele pudesse comer
confortavelmente. Sentou na beira da cama e ficou olhando para ele.
Ele comeu um pouco e disse que ela podia
levar o resto. Ele precisava se levantar para ir ao banheiro, e ela o ajudou e
com todo cuidado alcançou a muleta para ele.
Ela removeu a bandeja e a levou para a
cozinha. Escutou o movimento dele no banheiro. Parecia que algo tinha caído no
chão. Ele até que podia se abaixar para pegar, mas com a perna doendo seria
difícil.
Então Raquel bateu de leve na porta e
perguntou:
-- Está tudo bem? Precisa de ajuda?
-- Não! – gritou ele..
Raquel saiu dali. Estava assustada. Ele que
sempre era tão gentil... Agora estava sendo tão mal educado! Nossa... Que coisa
complicada...
Ela ficou na cozinha, comeu muito pouco,
também. Arrumou tudo e foi lá espiar no quarto dele. Foi pé por pé, não queria
fazer barulho, talvez ele estivesse dormindo.
E o que ela viu?
Raquel viu o seu amado, recostado na cama,
com os olhos fechados e o rosto banhado em lágrimas. Era um choro silencioso.
Afastou-se. Ele não podia nem sonhar que ela
o tinha visto assim, tão vulnerável, tão derrotado.
Foi para a sala, pegou um livro na estante e
tentou ler. Deixou passar um tempo, e ela voltou ao quarto para saber se ele
precisava de alguma coisa. E o encontrou mais calmo, com um olhar duro.
Ofereceu para ele um café. Voltou a cozinha enquanto o café passava ela serviu
um pedaço de bolo para ele. Ela levou. Ele aceitou, comeu e disse:
-- Senta. Nós precisamos conversar.
-- Sobre?
-- Sobre ontem. O que houve entre nós, não
podia ter acontecido. Eu me aproveitei de tua ingenuidade. Peço desculpas. Não
vai mais acontecer....
-- Mas...
-- Tu não podes ter acreditado nas coisas que
falei... Foi só um momento de envolvimento... Só isso. Acabei dizendo coisas
que não sinto.
Enquanto falava Tiago não olhava para ela.
Estava com os olhos fixos na parede. Não fez nenhum gesto, nada! Estava um
gelo...
Ela
estava quieta, feito uma múmia e também não olhava para ele, só escutava.
Quando ele terminou de falar, ela se levantou e saiu do quarto. Foi para a
cozinha, lavou a louça, deixou no escorredor, pegou suas coisas e foi embora.
Ia pela rua como se estivesse em transe. Com
o coração aos pedaços ela só queria chegar a seu apartamento rapidamente.
Entrou, fechou a porta e explodiu num choro desesperado. Sua cabeça parecia que
ia estourar... Tomou um comprimido, desligou o telefone e se deitou.
E dormiu... Muito...
Na segunda feira, Carla ligou para Raquel,
queria levar para ela algumas laranjas de céu que tinha trazido do sitio dos pais
de Cristiano. Mas o telefone estava desligado. Ela estranhou.
Conversou com seu irmão e o achou muito
quieto, sem disposição para falar. Então se preocupou com ele e perguntou:
-- O que há contigo? Tu estás muito
esquisito. Está com dor?
-- Não, eu não tenho nada, só não estou para
conversa fiada...
-- Credo! E a Raquel?
-- O que tem ela?
-- Como estão as coisas entre vocês?
-- Não sei do que tu estás falando...
-- Ora, meu irmão vocês são apaixonados um
pelo outro...
-- Apaixonados? De onde veio essa idéia?
-- Ora, é evidente. O jeito como vocês se
olham... Escuta, tu estás zoando de mim?
-- Não. Estou falando sério.
-- Sabe que eu não consegui falar com a
Raquel... Eu estou achando estranho, ela nunca desliga o telefone... Será que
aconteceu alguma coisa com ela?
Tiago ficou lívido e disse:
-- O que poderia ter acontecido?
-- Não sei...
É um pressentimento... Bobagem minha.
Carla saiu da sala, foi ajudar a sua mãe na
cozinha. Mas Tiago ficou pensando, muito preocupado, pois ele sabia o que tinha
dito para ela. E é claro que havia evidências que os dois se gostavam muito.
Mas ele precisava negar e disfarçar a sua tristeza.
Era quarta feira, quando o pai de Raquel
ligou para Tiago:
-- Olá Tiago! Como está?
-- Alô!. Como vai Dr. Joaquim. O que manda?
-- Eu quero saber de Raquel. Estou tentando
falar com ela desde segunda feira, o telefone sempre desligado. Pensei que ela
pudesse estar ai...
-- Não! Ela esteve aqui no domingo.
-- Então tem algo errado. Eu vou manda abrir
a porta do apartamento dela. Eu me preocupo dela ficar sozinha. Obrigado.
-- Não me deixe sem informação...
-- Sim.
Bateu o desespero em Tiago. Se ela tivesse
doente, ou sido assaltada... No domingo ele não tinha checado se ela tinha
chegado bem em casa. Ah... Senhor! O que eu fiz?
Depois de algum tempo o telefone tocou, era
Dr. Joaquim informando que encontrou Raquel em um estado de forte depressão.
Ele a estava levando para morar com ele. Ela precisava de cuidados.
A depressão que acometeu Raquel, caiu como
uma bomba na casa de Tiago. Carla não se conformava, conhecia bem sua amiga, e
para ela ter ficado assim, devia ter sofrido uma forte decepção. Voltou-se para
o irmão:
-- O que aconteceu entre vocês?
-- Por que perguntas?
-- Outro dia nós falamos sobre como vocês tentam disfarçar e não conseguem... Vocês se gostam e ficam negando... Ela se decepcionou contigo, tenho
certeza...
-- Comigo?
-- Desde quando tu ficaste idiota, foi com a
batida? Eu conheço muito bem a Raquel, ela é muito sensível, e tu sabes toda a
situação de vida dela. A mãe dela é uma vagabunda, o pai ela só conheceu recentemente. Ela não acredita
nos homens, e tu eras a única exceção, o único que ela confiava em todo o
planeta. E tu, com certeza, deves ter
dito ou feito alguma coisa que a levou a essa tristeza profunda. Confessa... Eu
sei que aconteceu algo...
Tiago não respondeu para sua irmã. Saiu dali
e foi para o seu quarto. Mas Carla foi atrás, insistindo:
-- Se eu souber talvez eu possa ajudá-la.
Desembucha...
-- Eu só falei que não vai rolar nada entre
nós.
-- Só isso?
-- Carla me ouve. Raquel é linda, inteligente
e merece um cara legal. Eu desejo tudo de bom para ela.
-- Mas por quê? Explica-me...
-- Se a gente já estivesse junto antes do acidente,
tudo seria diferente. Mas agora eu sou um aleijado, preciso de muleta para
andar... E eu gosto dela, não posso querer que ela se prenda a mim, por isso eu
falei, tirei todas as esperanças dela,
para ela ficar livre e ter a oportunidade de encontrar alguém melhor do que eu.
-- Tiago, definitivamente, a batida fez mal
para a tua inteligência. Dá a ela a chance de decidir se ela quer ficar
contigo. É diferente. Tu fizeste tudo errado. Eu vou lá ver se consigo
consertar essa tua burrada.
Carla saiu, e Tiago ficou cabisbaixo
pensando. Raquel tinha se dedicado a ele, desde o acidente ela tinha agido
sempre pensando no melhor para ele. Ela o amava com sinceridade. Lizandra tinha
sumido, mas Raquel, ao contrário, se fez presente. Sua irmã tinha razão, ele
era mesmo um idiota. Pegou o telefone e ligou para a casa do Dr. Joaquim, e
pediu para falar com Raquel, e a resposta que obteve foi que Raquel estava
hospitalizada e ninguém estava
autorizada a dar mais informações. Ele agradeceu e desligou o telefone.
Com essa história de ela está internada era
sinal que ela tinha tentado contra a própria vida. E a “ficha caiu”. Ele tinha
sido o causador de tudo isso, era mesmo um imbecil. Quem não merecia viver era
ele. E Tiago chorou...
Os dias passaram...
Tinham passados dois meses e Raquel agora
morava com seu pai. Ele a tratava com carinho e a mimava. Apesar da dor que
permanecia em seu intimo, Raquel estava bem. Seu pai era uma pessoa incrível, agora que o conhecia
melhor, gostava muito de estar perto dele. Seus irmãos tinham vindo conhecê-la.
Eles eram bem legais.
Mas Tiago continuava em seu pensamento. Ela
tinha falado algumas vezes com Carla, mas era mais saudável elas permanecerem
um pouco distantes. Às vezes em que se encontravam, nenhuma delas falou sobre Tiago.
Raquel trancou sua matricula na faculdade,
naquele semestre. Tinha outros planos. Iria viajar com seu pai. Ela estava
feliz e ansiosa. Era uma experiência nova. A presença de seu pai estava se
tornando muito forte em sua vida, e isso era bom, pois a fazia
rever os seus conceitos acerca do sexo oposto.
Fazia oito meses que Tiago estava afastado de
Raquel. Ele estava bem, sentia muita falta dela e não procurou compensar a sua
ausência na companhia de outra namorada. Ele queria permanecer só.
Tinha procurado a assistência de um
psicólogo, que o ajudou muito. E agora
ele estava aceitando bem as conseqüências do acidente. O seu tornozelo que foi
esfacelado e recomposto com metal, não
tinha mais o movimento e nem a firmeza de antes, além de a perna ter ficado um
pouco mais curta. Isso causava algum desconforto e a necessidade de usar uma
muleta.
Tiago estava aos poucos voltando a rotina.
Retomou os estudos, e no fim daquele semestre estaria se formando. E retornou
ao trabalho. Estava mais animado, mas de sua mãe ele não conseguia esconder a
tristeza que carregava no olhar.
Dona Carmem desconfiava que tivesse
acontecido alguma coisa mais seria entre eles, pois as evidências levavam ela
acreditar nisso. Embora negasse, Tiago era apaixonado por Raquel, que por sua
vez, também deixava muito claro que o amava com profundidade.
A fuga de Raquel naquele domingo, e a
amargura de seu filho eram argumentos para ela pensar que tinha havido um
envolvimento físico entre eles. Só não sabia até que ponto eles tinham chegado.
Tinha muita vontade de perguntar, mas era
avançar na intimidade deles.
Carla e Cristiano tinham noivado, e
comemoraram em família. Os preparativos para o casamento era o assunto. Carla
planejava convidar sua querida amiga Raquel para ser sua madrinha. Mas tinha
receios.
Mas resolveu arriscar. Sabia que Raquel tinha
retornado de viagem. Ela tinha ficado três meses na Europa. E acompanhada de
seus irmãos viajou para vários lugares.
Carla telefonou e foi visitar a amiga, que a
recebeu com muita alegria, como nos velhos tempos. Carla observou que Raquel
estava muito diferente, mais segura de si, muito bonita e definitivamente muito
divertida.
Raquel com um sorriso imenso aceitou ser
madrinha de casamento de sua querida amiga Carla. Naquele momento Carla avisou
que seu par seria o Caio, irmão de Cristiano.
Os dias passavam e inúmeras vezes Raquel e
Carla saíram juntas para escolher peças para o enxoval, fazer a lista de
presentes, verem as novidades... E foi numa dessas visitas ao shopping que
Raquel contou para Carla que iria acompanhada no casamento, pois ela estava
saindo com um jovem médico, assistente de seu pai. Ele se chamava Daniel.
Naquele dia ao chegar em casa, Carla contou
para sua mãe a novidade. E ela tinha que prevenir o seu irmão, para que no dia do casamento ele
pudesse agir com naturalidade.
Tiago escutou o que sua irmã falou, e não
comentou nada, apenas agradeceu. Mas naquela noite ele não conciliou o sono.
Não saíam de sua cabeça as palavras de sua irmã: “ a Raquel virá acompanhada ao
meu casamento, Ela está saindo com um médico assistente do pai dela.” Essas
palavras foram escritas a fogo em seu coração.
Ele também seria padrinho, e ficaria de
frente para ela, no presbitério, durante a cerimônia de casamento. Ele estaria
acompanhado pela prima de Cristiano. Que situação!
O
dia do casamento estava próximo, e Raquel decidiu que iria arrasar. Escolheu
para ela usar no casamento um vestido lindíssimo, na cor verde esmeralda, que combinava com seus olhos, num
modelo que realçava as curvas de seu corpo.
Dois dias antes do casamento Raquel e Carla
foram à modista, para a ultima prova do vestido de Carla. Ela tinha ficado
magnífica, naquele vestido de noiva. Era um modelo simples, num tecido lindo e
tinha ficado realmente muito bem em Carla. Era uma noiva romântica, bem de
acordo com o seu jeito de ser. Raquel até se emocionou quando viu sua amiga tão
linda e tão feliz.
O dia do casamento chegou e Raquel estava
inquieta. Sabia que encontraria com Tiago, era inevitável, mas não conseguia
prever qual seria a sua reação. Então resolveu tomar um banho de imersão
relaxante. Colocou sais em sua banheira e imergiu seu corpo naquela água morna.
Fechou os olhos e sonhou...
Vestiu-se com cuidado, e ao final se olhou no
espelho e até se assustou de sua imagem. Ela estava muito elegante e sexy. Seu
vestido era “tomara que caia” e ressaltava sobremaneira os seus seios. Ela se
achou um pouco decotada demais, mas a vendedora a tinha incitado para comprar o
vestido, pois era o vestido ideal para mostrar todo o “conteúdo que ela tinha.”
Raquel olhou-se mais uma vez no espelho e
sorriu. Ela iria abafar... Pegou a echarpe do mesmo tecido do vestido e jogou sobre os
ombros. Não deveria entrar na igreja com esse decote.
Daniel conversava com Dr. Joaquim enquanto
esperava por Raquel. Mas quando ele a viu entrar na sala sua expressão mudou e foi ao encontro daquela
esplendida mulher. Dr. Joaquim virou-se para ver a filha, e ficou muito
orgulhoso de ser pai de uma moça tão linda e elegante.
Daniel e Raquel entraram no átrio da igreja.
E ela logo viu Tiago, que estava encostado em uma coluna. Seu corpo reagiu como
se tivesse recebido uma descarga elétrica, todas as fibras vibraram, e quando
seus olhos se encontraram foi um turbilhão de emoções que tomou conta de
Raquel. Ela tremia.
Daniel percebeu e perguntou
-- Tudo bem contigo?
-- Sim... Respondeu Raquel num sussurro.
Dona Carmem se aproximou dela, a olhou com
admiração e sorriu, pegou suas mãos, que estavam geladas, a abraçou e disse ao
seu ouvido:
-- Que saudade... Tu estás linda demais! Vai
deixar meu filho sem fôlego.
Raquel corou e olhou para Tiago que não
tirava os olhos dela. E para deixar ainda pior a situação ele se aproximou
também, para cumprimentá-la.
Tiago a abraçou e beijou sua face e murmurou:
-- Isso é jogo sujo... Estás muito sedutora.
Ela olhou para ele com os olhos arregalados.
Riu de nervosa e Tiago percebeu que ela estava muito apreensiva. E continuou:
-- Calma. Vai ficar tudo bem... E afastou-se
dela.
Daniel estava ao lado dela, e ocupado com
dona Carmen que estava conversando com ele. Raquel respirou fundo e foi para
perto de Daniel. Logo os pares foram
organizados e o cortejo dos padrinhos entrou pelo corredor principal da igreja.
Daniel esperou e então procurou um lugar para
ele, assistir o casamento.
A noiva surgiu no fundo da igreja, e de onde
estava Raquel pode ver como sua amiga estava radiante de felicidade. À medida
que Carla avançava pelo corredor, seus olhos se tornavam mais iluminados. Ela
estava esplendida.
Durante a cerimônia Raquel tentava não olhar
para Tiago que estava bem a sua frente do outro lado do presbitério. Mas
parecia que havia um imã que puxava seus olhos para ele, que se mantinha com os
olhos presos nela. Olhar nos olhos de Tiago a deixava sem ar. Aliás, estava
respirando com dificuldade desde que entrou no templo.
Com certeza, todos os presentes, naquele
templo, incluindo Daniel, tinham percebido que Tiago e Raquel estavam com os
olhos fixos um no outro. Isso passava pela cabeça de Raquel, que estava com as
pernas bambas e estava com medo de desabar em plena cerimônia de casamento de
sua amiga.
Dona Carmem a olhava também. Mas com um olhar
atencioso, que emitia uma mensagem de força.
Daniel e Raquel chegaram ao salão onde seria
a recepção, e já estava sendo servido
coquetéis e salgadinhos. Os noivos estavam sendo aguardados. Raquel
encontrou com Gabriela e Leandro, que por incrível que fosse, estavam casados e
muito felizes. A conversa estava bem animada, quando Daniel recebeu um chamado
do hospital. Havia uma emergência, ele precisava ir. Daniel saiu discretamente.
Tiago de longe viu tudo. E esperou um pouco
para se reunir aquele grupo que conversava animadamente. Ele chegou e foi logo
puxando assunto com seu amigo Leandro, deixando elas em uma conversa paralela.
Só depois quando Gabriela fez uma pergunta a ele, que a conversa ficou
generalizada.
Os noivos chegaram.
E todos foram convidados a se dirigirem para
o salão de jantar. Os lugares não eram marcados e Tiago perguntou para Raquel:
-- O teu namorado onde está?
-- Ele foi chamado ao hospital, uma
emergência... E ele não é meu namorado, apenas um bom amigo.
-- Hum... Então estás sozinha. Posso te fazer
companhia?
-- Sim, como nos velhos tempos...
-- Como nos velhos tempos, retrucou Tiago.
O jantar foi servido a francesa e a conversa
na mesa foi divertida. Leandro continuava
do mesmo jeito, sempre fazendo os outros rir. E então a musica deu
inicio as danças.
Caio, convidou Raquel para dançar.
Tiago ficou pensando enquanto olhava Raquel
dançar. Ela estava irresistível, aquele vestido realçava sua beleza, e como ela
dançava com leveza, se movia com elegância e sorria e falava com muita
desenvoltura. Era a mulher mais bonita da festa, a mais sedutora do planeta.
Céus! Ele estava louco por ela.
Quando
ela entrou naquela igreja ele quase foi ao chão. Suas pernas falsearam, seu
corpo inteiro foi tomado por um curto circuito, que fez todas as células
reagirem. Ela estava estonteante, linda demais.
Ver Raquel ao lado de outro homem o deixou cheio de
ciúmes. Ele a queria, ela era a mulher de sua vida. Precisava agir...
E enquanto sua irmã se casava, eles se olharam
com muita intensidade. Ela estava visivelmente perturbada. Assim como ele.
Quando ele a tinha cumprimentado, ela
estava com as mãos geladas e suadas. Ela tinha se emocionado... Talvez ele ainda tivesse uma chance...
Agora ela dançava com Caio, e mais uma vez o
ciúme tomou conta dele. Já tinham dançado três musicas, será que ela não iria
pedir para parar? E ele nem podia dançar com ela.
Mas, Raquel parou de dançar e voltou para mesa.
Tiago esperou um pouco e a convidou para dar
uma volta pelo jardim, que estava lindamente decorado. Ela aceitou. Ele
levantou-se sorrindo e a conduziu para o jardim.
O jardim estava muito bonito, todo decorado
com lanternas coloridas, deixando na penumbra alguns recantos. E foi num desses
recantos que eles sentaram.
Subitamente eles ficaram tímidos, apenas se
olharam. E foi Raquel que rompeu o silêncio e perguntou:
-- Como tu estás? A perna ainda dói?
-- Eu estou bem, já me acostumei com a
situação, não tem jeito mesmo... E a perna não incomoda mais, a não ser quando
o tempo está para chover...
Raquel também falou de si, de sua viagem com
seus irmãos, e que estava no ultimo semestre que em dezembro seria a sua
formatura. Ele contou que tinha conseguido se formar em agosto. E que
continuava trabalhando com o pai. E que agora não vendiam apenas motos, mas
estavam focando mais no automóvel. Que depois do acidente ele só andava de
carro. Sua mãe havia lhe pedido para não voltar a andar de moto.
Então Tiago se encheu de coragem e fez a
pergunta que estava em sua mente desde que ele a viu, na igreja.
-- Faz tempo que namoras o Daniel?
-- Nós não estamos namorando! Eu já falei
isso. Apenas saímos algumas vezes juntos. Ele é um bom amigo.
-- Amigo... – murmurou Tiago, sabendo que o
tal “amigo” estava mesmo de olho nela. Estava só esperando o momento oportuno. Então ele tomou
a mão de Raquel e acariciou e disse:
-- Sinto muita falta de ti...
-- Eu também – respondeu Raquel com os olhos
marejados. E sua vontade era de se aconchegar a ele, sentir seu cheiro, sua
respiração e beijá-lo. Mas, levantou-se e disse que estava na hora de ir embora.
Já era tarde.
Tiago se
levantou e disse:
-- Eu te levo. Também vou embora.
-- Eu aceito. Obrigada.
Ele colocou a mão nas costas de Raquel e a
conduziu de volta para o salão. Ali as danças estavam muito animadas e o salão estava repleto.
Tiago estacionou em frente ao prédio em que
Raquel morava com seu pai. Era um edifício moderno e de luxo. Ele olhou e
admirou o lugar dizendo:
-- Estas morando em um lugar bacana.
-- Sim. Eu nunca imaginei isso na minha vida.
Meu maior sonho era sair de perto de minha mãe.
-- É mesmo. E como está a relação entre
vocês.
-- Bem. No fundo ela gostou... Ainda mais
agora que estou com meu pai. Ela está livre de mim. Vivendo do jeito que gosta.
-- Eu ainda não te agradeci por toda a tua
dedicação...
-- Deixa disso. Amigos são para isso.
-- Eu sei.
Então ela se movimentou para descer e Tiago a
pegou pelo braço e ela se voltou e ele a beijou. E ela retribuiu. Olharam-se e ela saiu rapidamente do carro, e
entrou correndo no prédio, sem se virar para trás.
Raquel estava agitada. Aquele beijo a tinha
deixado assim. Sua cabeça estava girando, seu coração estava em disparada e um
sorriso surgiu. Ele ainda gostava dela. As evidências apontavam para isso.
Nossa! Em plena igreja eles se olhavam como
se apenas eles dois estivesse ali, como apaixonados! Bah... Todos os que estavam na igreja deviam ter percebido...
Que vontade de ligar para ele.
E ela ligou.
-- Oi, já chegou em casa?
-- Sim, mas essa não é a minha “fala”?
Raquel riu.
-- É, mas às vezes dá para inverter.
-- Ainda não dormiu?
-- Não consigo... Eu te acordei?
-- Não! Eu estava pensando em ti...
-- Eu também. Gostei muito de te rever, foi
uma noite maravilhosa...
-- É foi uma noite maravilhosa, tirando
aquela parte em que dançaste com o Caio.
-- Mas eu não podia fazer desfeita. Ele foi tão
gentil.
-- Entendo.
E ficaram conversando Mais de hora, como dois
adolescentes. E combinaram de ir ao cinema.
Só então Raquel dormiu, e sonhou... Que
estava se casando com Tiago.
Tiago também sonhou com Raquel, mas sonhos
eróticos.
Domingo durante o dia fez um calor
insuportável. O ar estava pesado, abafado, prenúncio de temporal. E o temporal
veio muito forte, no meio da tarde. Derrubando árvores, postes e provocando alagamentos, causando muitos
transtornos na cidade.
Raquel ligou para Tiago cancelando o cinema,
mas se ele tivesse como chegar até a casa dela, eles podiam comer qualquer
coisa e assistir um filme. E Tiago aceitou a proposta dela.
Raquel estava sozinha em casa. Seu pai tinha
embarcado cedo da manhã, para São Paulo, onde participaria de um congresso.
Ficaria uma semana fora.
Raquel gostava de cozinhar e foi para a
cozinha preparar uns petiços para eles comerem. Arrumou tudo e foi tomar um
banho para se arrumar e esperar por Tiago.
Tiago chegou.
Ela o recebeu com um lindo sorriso. Raquel
estava usando um vestido com estampas coloridas, com um babado na bainha e na
frente um pouco mais curto. Seus cabelos estavam soltos e ela tinha pintado
levemente os lábios com um batom rosa.
Ela estava linda. Estava sedutora...
Ele a beijou de leve na face e disse a ela:
-- Oi. Nossa! Tu estás demais.
E
entrou no apartamento. E ele viu que era um apartamento muito grande e muito
bem decorado. E virando-se para Raquel
ele disse:
-- Que lugar bacana...
-- Sim. É o meu lar. Estou muito feliz, meu
pai me ama, meus irmãos também. Eu gosto muito de morar aqui, não tanto pela
beleza, mas pelo acolhimento.
Ela o
direcionou para a cobertura, onde ficava a sala de TV e ele sentou-se. Raquel
foi até a cozinha para buscar o que tinha preparado para eles. E colocou sobre
a mesa uma tábua com uma variedade de queijos e pães de queijo e copos de
vinho. Raquel escolheu o vinho, na adega climatizada, e pediu que Tiago abrisse a garrafa para
ela.
Estavam sentados no sofá assistindo o filme, que era um drama cheio de suspense, com um enredo bem complicado, quando a
campainha soou. Tiago pausou o filme, enquanto Raquel foi atender a porta. Era Daniel.
-- Olá, nossa como tu estás bonita!
-- Oi, o que houve?
-- Nada, sai do hospital e resolvi passar por
aqui para ver como tu estás?
-- Eu estou bem obrigada.
-- Tem alguém ai?
-- Sim, o Tiago e eu estamos vendo um filme.
-- Mesmo! Então vou ficar com vocês.
Raquel foi a frente e Daniel a seguiu até a
sala de TV. Os dois homens se cumprimentaram como se fossem entrar no ringue de
luta livre. O ambiente ficou tenso. Raquel não sabia como agir.
Ela sentou no sofá e Tiago sentou a seu lado.
Daniel escolheu a poltrona. E exclamou:
-- Bah... Um lanchinho! Eu estou fome. Raquel
tu podes ver uma água.
Raquel foi até o frigobar e alcançou uma garrafa e um copo. E Daniel
olhou para a tela que estava no modo pausa e continuou falando:
-- Esse filme eu já vi. É surpreendente o
final. Nada daquilo que se espera.
-- Não vai contar, por favor. – disse Raquel
com um jeito alterado.
Tiago que estava com a intenção de conversar
com Raquel e firmar o namoro entre eles, viu que não haveria oportunidade. A sua
vontade era dar um chega para lá no Daniel. Mas não podia, o cara era
assistente do pai de Raquel. Ele suspirou e ficou quieto. Mas aproximou-se um
pouco de Raquel e pegou a sua e a segurou em seu colo. Raquel olhou para ele e
deixou que ele segurasse sua mão.
Daniel viu o gesto de Tiago e não gostou. Ah,
ele não ia deixar ser fácil. Então disse:
-- Como está teu o tornozelo?
-- Está bem. – respondeu Tiago.
-- Cara, tu não tem idéia de como estava. Eu
assisti a cirurgia. Ainda bem foi Dr. Joaquim que te operou, ele é o melhor. Se
mesmo assim tu ficaste com problema de locomoção, se não fosse ele, talvez
tivesse que amputar o pé. Tu foste fotografado, em todas as etapas de cirurgia,
para material de estudos. Tu sabias disso?
-- Sim, meus pais autorizaram.
Caiu um silêncio.
Raquel nunca tinha visto Daniel assim, desse
jeito. Ele sempre tão educado, hoje estava muito inconveniente. Nem o filme
eles poderiam terminar de assistir. Ela levantou-se, pediu licença e desceu.
Foi para a cozinha fazer pipoca, já que
Daniel tinha terminado com o lanche deles. Ela estava furiosa com Daniel. Claro
que ele só queria perturbar. Mas Tiago tinha demonstrado que ele estava na
disputa e que não ia deixar fácil para Daniel. E pegar a sua mão foi genial.
Uma pequena mostra de que a posse era dele. Bem, isso era o que ele pensava. E
ela sorriu ao pensar.
Raquel retornou trazendo dois recipientes com
pipocas, um com pipoca doce e outro com pipoca salgada. Entregou o pote com a
pipoca salgada para Daniel, e pegou a pipoca doce e sentou junto de Tiago para
dividir com ele, pois sabia que, assim como ela, ele também preferia a pipoca doce.
A conversa entre eles girou para automóveis,
deixando ela completamente fora do assunto, e depois Daniel começou a falar de
mulheres, visivelmente provocando o Tiago para se manifestar sobre suas
preferências. Raquel estava furiosa.
Raquel simplesmente disse que estava com dor
de cabeça, e pediu que fossem embora, os dois. Então Daniel levantou-se e disse
para Tiago:
-- Vamos, acho que ela está chateada conosco.
Tiago rosnou e não disse nada. E ao
despedir-se disse ao ouvido de Raquel:
-- Eu vou dar um giro e volto. Pode me
esperar.
Raquel não disse nada. Apenas fechou a
porta. Chegou a rir sozinha. Os dois
pareciam dois garotos brigando pelo mesmo doce. No caso por ela. Ela estava
lisonjeada.
Meia hora depois, Tiago voltou, e sorrindo a
convidou para ver o resto do filme. Sentaram bem juntinhos e Tiago passou seu
braço sobre os ombros dela e a puxou para junto dele.
Quando o filme terminou, ele não se mexeu. E
a conservou junto dele. E ele disse que precisava dizer algumas coisas para ela.
E Tiago começou falando que ele tinha buscado
a ajuda de um psicólogo, que agora ele estava conformado e de como ele tinha
sido estúpido naquele domingo. Que ele tinha se arrependido muito, de ter
negado todas as evidências. Mas a verdade era que ele a amava. E por causa desse amor, foi que
ele não se achava mais a altura dela. Uma moça bonita e inteligente, ficar com
um cara como ele, que além de tudo, tinha ficado com um defeito, e sem
condições de andar sem auxilio de uma muleta.
Raquel apenas escutava, mas lágrimas escorriam
por suas faces. Lembrar aquele domingo era muito difícil. Tinha sido a maior
decepção de sua vida.
E Tiago continuou.
--Nós tínhamos nos beijado e trocado carícia
e algumas ousadas, e foi muito bom... Eu fiquei meio enlouquecido por ti. E sei
que tu sentiste algo parecido, pois o teu jeito de retribuir deixou isso muito
claro. Mas eu te rejeitei, neguei o meu amor e te decepcionei e te afastei de
mim, conscientemente, isso é o pior de tudo. Cada palavra que eu te falava me
cortava o coração, mas eu entendia de não devíamos continuar. Até a Carla
brigou comigo, me alertando que eu jamais deveria ter agido daquela forma, e ainda
salientou que devia ter deixado que a escolha fosse tua. Sei que eu te magoei,
mas do fundo do meu ser eu quero te pedir perdão por tudo.
Raquel estava emocionada, todo o seu ser
vibrava e seu coração estava acelerado. Ela tinha vontade de se jogar sobre ele
e cobri-lo de beijos.
Então Tiago olhou para ela e a pegou pelo
queixo e girou sua cabeça para ficar de frente para ele e olhando nos olhos
dela perguntou mais uma vez:
-- Raquel, tu me perdoa?
-- Sim. – disse Raquel chorando.
-- Eu te amo, mas vou pedir para que a
decisão seja tua.
-- Decisão?
-- Sim, se queres namorar comigo.
Foi nesse momento que o telefone de Raquel
tocou. Era sua mãe e ela levantou-se e foi falar com ela.
Tiago ficou ali sentado esperando, seu
coração aos pulos, mas cheio de esperanças. Raquel era tão doce, tão honesta e
tão transparente. Ele tinha certeza de que ela o amava também.
Mas pelo tom de voz de Raquel, Tiago percebeu
que tinha acontecido alguma coisa. E foi ao encontro dela, pensando que o
momento deles se foi.
Raquel desligou o telefone com um olhar
assustado, e ele perguntou:
-- O que aconteceu?
-- Minha mãe... Não sei! Ela não esta dizendo
coisa com coisa, ela chorou e falou e eu não consegui entender. Eu vou até lá.
-- Eu vou contigo.
Quando eles chegaram ao apartamento de Paula
a encontraram deitada no chão, despida e
completamente bêbada. Eles a levantaram, e levaram para o chuveiro, tentando
fazê-la reagir.
Depois de vesti-la com uma camiseta de
dormir, a levaram para cama e eles a deixaram recostada. Raquel foi até a
cozinha para fazer um café forte, e encontrou sobre a mesa um exame de
laboratório. Pegou o exame, confirmou o nome para ver se era mesmo de sua mãe e
então viu que o resultado era positivo, logo pensou em gravidez, mas quando leu
o tipo de reação, viu que o resultado era positivo para AIDS.
Raquel começou a chorar.
Depois de algum tempo ela se acalmou e levou
o café para a sua mãe, e disse ao ouvido de Tiago:
-- Olha em cima da mesa da cozinha o exame.
Raquel sentou perto da mãe e a faz beber um
pouco de café. Tentou conversar com ela, mas Paula estava muito grogue. Ajeitou
os travesseiros e a cobriu, deixou que ela dormisse.
Foi para sala onde Tiago a esperava. Ele a
abraçou, e Raquel se aninhou naquele abraço. Ela não sabia qual providencia devia
tomar. Então falou:
-- Eu sempre soube que algo assim iria
acontecer com ela. Com a vida que leva... Sempre foi assim. Eu suportei muitas
coisas dela, ela nunca se importou muito comigo. Só queria “festa”, mesmo quando
eu ainda era pequena ela me deixava sozinha para ir para a noite.
-- Eu sei... Eu sei... Não te atormenta. Ela
fez a sua escolha... E agora veio a cobrança.
-- É... Eu acho que ela não melhorou nada...
Será que não devíamos levá-la para o hospital?
-- Vamos chamar a emergência SOS. Eu tenho o
numero no meu telefone.
A emergência chegou e os paramédicos
decidiram levá-la para o hospital. Talvez não fosse só bebida, ela poderia ter
tomado tranqüilizantes. Eles procuraram pelo apartamento, até no lixo olharam,
e não encontraram nenhum vestígio.
Paula
ficou internada na UTI.
Raquel voltou para casa e pediu para Tiago
ficar com ela, pois não queria ficar sozinha. E ele ficou ao lado dela.
Dormiram abraçados no sofá da sala da TV.
Ele acordou cedo, era segunda feira ele teria
que ir trabalhar. Mas antes de levantar
ficou olhando ela dormir. Ela era linda... Ela abriu os olhos e sorriu.
Espreguiçou-se disse:
-- Bom dia. Obrigado por tudo. Não sei o que
eu faria sem ti.
-- Bom dia minha linda...
Raquel foi para a cozinha e fazer o café. E enquanto eles tomavam o café, quase
não falaram e Tiago saiu, ia para casa tomar um banho antes de ir para loja.
Ela o levou até a porta:
-- Tenha um abençoado dia. Vem jantar comigo,
vou fazer lasanha, sei que tu gostas...
-- Estás me comprando com uma lasanha. Nossa!
Eu estou valendo pouco.
-- Não! Ao contrário tu estas valendo muito,
pelo menos para mim.
-- O simpático do Daniel vai estar também?
-- Não. Hoje não atendo a porta...
-- Ok. Tchau... Que seja um ótimo dia para
ti.
Tiago
a beijou de leve nos lábios, e saiu.
Raquel estava contente por ter Tiago
novamente perto dela. Ele a tinha pedido em namoro e ela nem conseguiu
responder. Mas logo ela daria o seu sim.
Raquel tomou um banho e vestiu uma caça jeans e uma camiseta azul
clarinho e calçou uma sapatilha e ligou para o hospital para saber noticias de
sua mãe. E soube que ainda não tinham
liberado os boletins. Só mais tarde.
Então ligou para seu pai. Contou para ele a
situação de sua mãe, e ele disse que entraria em contato com o hospital, pois
ficou preocupado. Inclusive alertou a filha sobre a possibilidade dela não
superar a situação.
Dr. Joaquim conversou com seu colega e foi
informado de que Paula não tinha apenas ingerido grande quantidade de bebida
alcoólica, como também tinha feito um coquetel de medicamentos. A situação dela
era delicada.
O dia passou e Raquel se distraiu preparando
a lasanha, enquanto que a faxineira cuidava da casa. No fim da tarde tomou
outro banho e se arrumou para esperar por Tiago.
Ele chegou trazendo uma rosa para ela. E ela
ficou muito alegre por ele ter lembrado de que ela gostava de rosas vermelhas.
Jantaram, beberam vinho e depois sentaram
para conversar. Ela tinha preparado negrinho que eles comeram de colher.
Tiago olhou o relógio e viu que estava tarde.
Levantou-se para ir embora. Então Raquel se colocou de pé e disse enquanto
pousava suas mãos nos ombros de Tiago:
-- Eu te devo uma resposta.
-- Resposta? – brincou Tiago.
-- Sim. – provocou ela.
-- Fala. Estou esperando...
-- Falar o que? – riu Raquel.
-- Está me fazendo de bobo... Eu quero a
resposta. – disse Tiago.
-- Eu já falei...
Ele a abraçou e beijou, mas eu quero que me digas mais uma vez. E Raquel atendeu
ao pedido dele:
-- Minha resposta é sim. Eu quero ficar
contigo, sempre quis. Desde muito tempo...
-- Eu também, sempre te quis. Eu ainda estava
com a Lizandra, mas meu coração já era teu. Nós vamos ser felizes, vamos
superar todos os percalços do caminho, pois estaremos sempre juntos.
No dia seguinte Paula faleceu.
Só alguns amigos próximos foram se despedir
dela.
Raquel não se desesperou com a morte da mãe.
Ela amava sua mãe, mas elas nunca tinham sido amigas. Desde tenra idade Raquel
desenvolveu um escudo para se proteger de sua mãe. Que a deixava sozinha à noite
para sair e se divertir, e nem não se preocupava em saber se ela tinha medo de
ficar sozinha, se tinha feito as refeições, se tinha tomado banho e escovado os
dentes antes de dormir. Nunca perguntou como ela estava na escola. E algumas
vezes tinha tido atitudes de violência para com ela. Raquel não sabia definir o
que sentia... Mas com certeza, a morte
de sua mãe, era uma sensação de alivio.
Fazia duas semanas que estavam namorando e
eles queriam ter a sua primeira vez em um lugar especial. E foram para a costa
doce, a beira da lagoa dos Patos.
O hotel que eles escolheram para ficar era
muito bonito, na beira da lagoa, com uma vasta praia particular. Não era época
de alta temporada, e o hotel estava com poucos hospedes.
Eles chegaram e logo saíram para caminhar a
beira da lagoa, sentindo o vento no rosto. Eles andavam abraçados e paravam
para admirar a paisagem, trocavam beijos e estavam felizes.
E naquela noite, depois de um jantar
especial, eles foram para a suíte. Necessitavam de privacidade, pois o desejo
os consumia. Precisavam urgentemente se entregar ao amor, e com plenitude.
Depois do amor eles dormiram abraçados,
sonharam com a felicidade que invadia suas vidas.
E decidiram casar. Não precisavam namorar...
Eles se conheciam o suficiente.
E
depois de um mês, em uma cerimônia muito simples e intima eles casaram.
Um tempo depois.
Tiago estava muito feliz, carregava nos
braços uma princesa, a sua filhinha. Beijou carinhosamente a menininha, que já
estava dormindo e a colocou no berço.
Tiago abraçou Raquel e eles ficaram olhando o
fruto de amor deles. E ele chegou a
sorrir quando lembrou que ele tinha lutado contra esse amor, tinha se esforçado para disfarçar as evidências... Mas o amor é
mais forte, o amor sempre vence e supera tudo.
Maria Ronety Canibal
Fevereiro de 2018.
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