quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

A MAGIA DO NATAL

CONTO DE NATAL




                                      
 

                    A magia do Natal...

 

Valéria olhou em volta, havia pouca gente circulando pela rua, àquela hora. Era a noite mais especial do ano, e as pessoas costumavam comemorar com alegria, confraternizar em família.

Sentada sozinha na praça deserta, ela escutou os sinos da igreja tocar. Já era meia noite! Então é Natal... Valéria com tristeza pensou em seu pai. Sentia tantas saudades...

Lembranças vieram a sua mente. Reviveu a sua infância feliz, ao lado de seus pais, que se amavam muito. Mas essa felicidade foi interrompida abruptamente, com a morte prematura de sua mãe. Daí em diante tudo mudou. E ela tinha apenas 13 anos.

Outro momento surgiu em seu pensamento, e esse dia ela jamais esqueceria. Naquele dia, ela arrumou as suas poucas coisas, e sentou na pequena sala de sua casa, para esperar por sua tia Lilian.  Suspirou, Valéria estava com muito medo do futuro.

Seu pai não queria despedidas, por isso saiu cedo de casa. Ele não a queria por perto, depois da morte repentina da esposa. Ele afirmava que não tinha condições de educá-la adequadamente.  E a opção, era ela ir viver na casa da tia, irmã mais velha de sua mãe.

Seu pai dissera que a amava muito, por isso estava tão preocupado com o seu futuro. Ele confessara que não tinha recursos para bancar os seus estudos, pois, era o dinheiro que Albertina obtinha com a venda de doces, que sustentava a casa. Agora que ela se fora... E, ele era um fracassado!

Valéria teve um sobressalto com o soar da campainha. Sua tia havia chegado. Ela pegou a sua valise e se encaminhou para a porta. Uma lágrima insistia em escorrer em sua face. O seu coração sabia que nunca mais voltaria aquela sala, aquela casa, onde conheceu a felicidade de viver em família. Antes de abrir a porta, ela olhou em volta, tentando fixar em sua mente a imagem da casa em que nascera.

Com coragem ela abriu a porta.

Ali estava uma mulher elegante, e duas moças, bem vestidas, que a olhavam de alto a baixo, eram as suas primas. Ana Rosa e Ana Maria, a receberam com um sorriso, e a sua tia com um afetuoso abraço. O carro que a esperava era bonito.

Ela encheu-se de esperança.

Talvez não fosse tão ruim...

Tudo daria certo!

A casa, em que iria viver, era grande e bonita, tinha um jardim bem florido e Valéria se animou. Uma mesa cheia de coisas boas estava a sua espera. E ela comeu, e respondeu às perguntas de suas primas. A tia a olhava com atenção.

-- Já terminou o teu lanche? – Perguntou-lhe a tia. – Venha comigo, vou mostrar o teu quarto.

Valéria a seguiu escada acima. O quarto era grande e tinha até um banheiro, só para ela. O armário estava cheio de roupas. Eram as sobras de suas primas, mas eram bonitas. Não se importava. Ela nunca teve nada novo, mesmo! Sua mãe sempre comprava as roupas em brecho.

Valéria logo se adaptou a rotina da casa. Ela iria estudar na escola do bairro. Ana Rosa e Ana Maria estudavam em outra escola, mas elas já estavam no segundo grau.

A vida seguiu.

No entanto ela nunca mais viu seu pai.

Um dia ela recebeu uma correspondência do pai.

Era uma longa carta, onde ele explicava que mudaria de cidade, até de pais. Iria trabalhar na Argentina. Uma promessa constava no fim da missiva: Um dia virei te buscar. Te amo muito.

Valéria chorou, e não acreditou na promessa de seu pai. Dobrou a carta, e a colocou dentro do envelope e a guardou dentro de sua Bíblia.

Seis anos tinham se passado.

Durante esse período Valéria descobriu a razão de sua tia ser tão rica e sua mãe ter sido tão pobre. As duas não eram filhas do mesmo pai. Sua avó, Olinda, antes de morrer, confessou o seu pecado ao marido. José que ficou furioso com a traição da esposa, e se vingou em Albertina. Ele a expulsou de casa.

 A sua mãe, com apenas uma maleta, onde carregava algumas coisas, e sem opção, foi trabalhar em uma padaria e ali conheceu o amor de sua vida, o Jorge, seu o pai, que era padeiro. Agora ela entendia a razão do afastamento das irmãs.

A pobreza não impediu que Albertina e Jorge fossem felizes. O nascimento da filha foi uma alegria para o casal, que deu a menina muito amor. Valéria cresceu em uma família feliz. Só não esperava que a sua felicidade fosse tão breve.

Embora a sua vida tivesse mudado, e viver na casa da tia significasse segurança e conforto, para Valeria aquele ambiente era de hostilidade. Não havia paz e harmonia, e sim brigas e discussões.

E ela sonhava com um dia de paz...

O dia em que pudesse viver em outro lugar.

Valeria tinha terminado o segundo grau e parou e estudar. Trabalhava como secretária da tia. Ela recebia um pequeno salário, no entanto, a moradia e a comida eram descontadas. E praticamente não sobrava nada.

Ana Rosa havia se casado, Ana Maria foi estudar no Canadá, o tio Carlos havia saído de casa, e tia Lilian tinha se tornado uma pessoa insuportável.

Então Valéria decidiu ir embora. Arrumou suas poucas coisas, e abandonou o conforto e a segurança da casa da tia, para se aventurar na vida.

Naquela noite, Valéria saiu sorrateiramente pelos fundos. Caminhou devagar pela rua deserta. As casas estavam iluminadas, as famílias reunidas, a alegria imperava nos lares.

E era uma noite de dezembro, início do verão. Porém, uma noite atípica, para a época. A noite estava fria e chuviscava.

A praça estava toda decorada com lâmpadas coloridas e uma enorme árvore enfeitada com laços vermelhos, lembrava que era a véspera do Natal.

Ela sentou-se em um banco próximo a árvore. Apesar de todos os percalços de sua vida, Valéria acreditava na magia do Natal. Era a época mais bonita do ano!

Um sino badalava, anunciando o Natal.

Valéria levantou-se e encaminhou-se para a igreja. Entrou e sentou no ultimo banco. Fazia tanto tempo que não entrava em uma igreja. Lembrou-se dos bons tempos, quando a mãe e o pai a levavam, todos os domingos, à missa.

Isso tinha ficado no passado... Sua tia era agnóstica.

Atenta, ela escutou cada palavra que o padre proferiu, e sentiu-se bem. Ficou animada... Era Natal e tudo iria ficar bem. Seu coração encheu-se de esperança.

Esperou que as pessoas saíssem, só então levantou-se para ir embora. Mas ir para onde? Ela não tinha onde dormir. E se ficasse ali ... Era uma boa ideia.  Escondeu-se atrás de uma coluna.

-- Olá! Estamos fechando, moça. – Falou uma senhora bondosa.

-- Eu sei. Pensei que talvez eu pudesse dormir aqui, afinal é a casa de Deus. – Respondeu Valéria com sinceridade.

-- Sim, é a casa de Deus, mas esses bancos são desconfortáveis. Venha comigo, vou te arranjar uma cama para esta noite. – Disse a mulher com doçura na voz. – É Natal, uma noite especial. Teremos uma ceia que poderás partilhar conosco. Venha. Eu sou a irmã Adele.

-- Eu sou a Valeria. Obrigada, irmã.

Depois de fechar e trancar as portas a irmã caminhou pela lateral do templo, e entrou numa porta que ficava à esquerda do presbitério. Seguiram por um corredor e alcançaram o pátio. Andaram por um caminho ladeado por flores e chegaram a uma casa. Ali residiam as irmãs franciscanas. Valeria foi acolhida com carinho pela madre Josefa.

A refeição foi deliciosa. A cama era limpa e ela dormiu tranquilamente. Sonhou bons sonhos. Acordou revigorada. Na manhã seguinte a madre a chamou para conversar. E Valéria narrou as suas desventuras, sem esconder nada.

-- E o que pretendes fazer? – Perguntou a madre.

-- Eu preciso conseguir um trabalho, e um lugar para morar. Não tenho nenhuma formação. Mas gosto de fazer doces. A minha mãe era doceira e quando eu era menina, eu a ajudava. E tomei gosto pela cozinha. Mas minha tia nunca permitiu que eu desenvolvesse qualquer habilidade. Em sua casa havia profissionais para desempenhar as tarefas.

-- Gostaria de morar conosco e trabalhar na escola? Há diferentes tarefas...

-- Seria ótimo, irmã. Mas eu não tenho religiosidade, perdi o contato com Deus, já faz muito tempo.

-- Não vou te obrigar a nada, peço apenas que respeite a casa que te acolhe, e sobretudo a casa de Deus. Mais tarde se quiser ir em busca de outro trabalho, não vou te impedir.

-- Eu aceito, irmã, não estou em condições de rejeitar a sua oferta. Fico muito agradecida. Espero estar apta para as tarefas que farei. E lhe prometo que vou me aproximar de Jesus Cristo. Quero retomar a fé de meus pais.

-- Muito bem. Agora vamos tomar o nosso café. Depois vamos a missa.

Valéria tomou um banho e vestiu-se rapidamente. Não queria se atrasar para a mesa do desjejum. Ela sentia-se feliz naquela manhã de Natal.

O almoço de Natal na casa das irmãs teve um convidado especial, o sobrinho da madre Josefa. Giovani Dambróz, era um rapaz alegre e muito simpático.

Ele estava, temporariamente, em Porto Alegre para estudar, faltava pouco para terminar o seu curso. Logo voltaria ao convívio da sua família, no interior.

Enquanto comiam ele conversou animadamente, contando fatos engraçados que fez com que todos se divertissem. Uma troca discreta de pequenas lembranças encerrou a visita do rapaz.

Valéria pouco falou, mas ficou encantada com Giovani. Embora não fosse bonito, ele era gentil e tinha um sorriso cativante. Será que o encontraria novamente?

Os dias iam passando e Valéria estava se esforçando para fazer bem, o trabalho na secretaria de escola. As matriculas estavam abertas para os novos alunos e havia muito o que fazer.

Certa manhã o computador não funcionou, e um técnico veio resolver o problema. Entrando na sala ele falou.

-- Bom dia! Como vais Valéria?  -- Giovani ficou contente em revê-la.

-- Olá! Eu vou bem, obrigada, e tu como estás?

-- Bem, muito bem. O que aconteceu com a máquina?

-- Simplesmente não ligou...

Giovani sentou-se e concentrou-se em seu trabalho. Em outra escrivaninha, Valéria sentou-se e o observou trabalhar. Ela não conseguia desviar os olhos dele, que vez e outra a olhava de viés e sorria. Parecia que um magnetismo a envolvia.

-- Tu vais ser freira? – Perguntou ele.

-- Não! Eu estou morando temporariamente com as irmãs. Passei por uma dificuldade e elas me acolheram e me deram trabalho.  – Respondeu ela.

-- Hum... És do interior?

-- Não. Sou daqui. Mas é uma longa história.

-- Hoje é sábado. – Disse ele a encarando. – Aceitas passear comigo, à tarde?

-- Eu? Não sei... 

-- Acho que devias aceitar. É uma oportunidade para me contares a tua história. Fiquei curioso. Não te preocupa, sou de confiança. Sou sobrinho da madre Josefa.

-- Eu sei que és sobrinho da madre. – O interrompeu sorrindo.

-- A minha mãe e ela são irmãs. Vou pedir licença a tia para te levar para tomar um sorvete. Aceitas?

-- Eu que sempre pensei que as freiras ficavam distantes da família. – Disse Valeria pensativa.

-- Normalmente ficam. Minha família mora no interior, eu que vim para cá para trabalhar e estudar. Estou cursando a faculdade de tecnologia.

-- Sim, eu sei. – Disse Valéria.

-- Bom dia! – Disse a madre Josefa entrando na sala. – Como estás, meu querido?  -- Se aproximando de Giovani e o abraçando. – O que tem o PC.?

-- Estou fazendo uma limpeza. Pode ser vírus. – Respondeu ele retribuindo o abraço.

-- Vejo que a Valéria está te atendendo. Ela é nossa nova secretária. – Falou a madre sorrindo.

-- Tia, eu a convidei para tomar um sorvete... Ainda não obtive resposta. – Falou ele rindo.

-- Aceite o convite. – Disse a madre alegremente. -- Ele é um bom rapaz, também é sozinho nesta grande cidade. Será bom sair um pouco.

-- Está bem. Eu aceito.

A tarde foi especial. Eles conversaram como se fossem velhos amigos. Giovani gostou de estar com Valeria. Seu coração balançou, coisa que a sua razão não queria admitir.

Valéria também gostou muito da tarde que estiveram juntos. Embora nunca tivesse sentindo algo semelhante, ela sabia que estava apaixonada.

Para a alegria deles, aquele foi primeiro de muitos encontros. Eles formavam um belo casal, olhavam a vida sob o mesmo ângulo e tinham o mesmo ideal.

 

Uma ordem superior, transferiu a madre Josefa, assim como outras freiras para outras casas da congregação. A troca na casa das irmãs, fez com que Valéria se desacomodasse. Ela já tinha algumas economias, e isso a deixava mais segura. Era hora de mudança. Hora de procurar outro trabalho, e lugar para morar.

Com indicação da professora de português, a dona Mariel, ela conseguiu o lugar de auxiliar de confeiteira no supermercado do bairro. Agora com um salário regular, Valéria mudou-se para um minúsculo apartamento, que ficava bem próximo do mercado.

Ela estava realizada, pois estava fazendo o que tanto gostava. E conseguindo a sua independência financeira.

Sua vida fluía. O namoro com Giovani estava se firmando. Todavia a ausência do pai, não permitia que ela fosse completamente feliz.

Através da internet ela começou a procurar o senhor: Jorge Luís Silva Alves.

Giovani tinha terminado o seu curso, e iria visitar os seus pais, em Tenente Portela, na região noroeste do estado. Mas a sua intenção era ir para a sua cidade, definitivamente. Queria trabalhar na empresa da família.

A família Dambróz tinha uma pequena pousada, que ele desejava ampliar. Já a sua irmã Marcela e o marido Lucas, trabalhavam com turismo.

-- Valéria, eu quero que conheças a minha família. – Disse ele implorando. –  Eu vou voltar para o meu rincão.... E te quero ao meu lado.

-- Tu sabes que não dá. Não posso me arriscar a perder esse emprego, do qual eu tanto gosto. – Respondeu ela já irritada. – Além do mais, estou tentando encontrar o meu pai. Preciso permanecer por aqui.

-- Emprego terás por lá, isso eu te garanto. E quanto ao teu pai, de qualquer lugar poderás receber as informações. Acho que tu não estás querendo ir. – Falou Giovani chateado.

-- Tens razão. Não quero ir mesmo! A tua cidade é muito pequena, deve ser um buraco, e eu gosto daqui. Afinal foi aqui que sempre vivi. Se meu pai voltar, é aqui que ele vai me procurar. – Afirmou Valéria.

-- Então estamos terminando? É isso? – Perguntou Giovani contrariado. Ele tinha um amor enorme por ela, porém, agora estava percebendo que não era correspondido. O namoro deles se sustentava numa via de mão única. E o amor era uma via de mão dupla. Dar e receber. E com tristeza ele concluiu que nada recebia em troca de tudo que entregava.

Eles ficaram amuados. A despedida não foi seca. Apenas um tchau da parte dele. Valéria nem respondeu, na verdade, ela não esperava que o namoro fosse rompido. Mas foi...

Ainda era possível mudar de ideia e ir com ele.

No entanto, Valeria não quis ferir o seu orgulho. Viu ele se afastar, e nada disse para suavizar a tensão entre eles. Estava tudo acabado. Era o fim. Pronto!

 

Giovani chegou em casa, estava contente de ter retornado, mas seu coração continuava muito machucado.

Os dias passavam.

Depois uns dias, Giovani disse aos pais:

-- Eu vou ficar, estou cheio de ideias para o melhorar o nosso negócio.

-- Que bom! – Respondeu o pai o abraçando. – Eu estou ficando velho, e sei que tu farás a nossa hospedaria prosperar. Mas e a tua namorada?

-- Nós terminamos! – Falou com resignação. Tinha decidido tocar a vida para frente. Não iria insistir em alguém que não lhe tinha amor. – Ela tem lá os seus problemas. Depois que a mãe morreu, ela foi morar com a tia, e distanciou-se do pai. E agora está a procura dele. É isso. Então, que cada um siga o seu caminho.

-- Que pena. Estavas tão entusiasmado. A Josefa elogiou a moça. Eu tinha ficado bem contente. Mas se não deu certo, paciência! – Disse, Cristina, a sua mãe. – Será que essa moça é o que vocês estão pensando?

-- Mãe, a Valéria é uma pessoa direita, bem educada e trabalhadora. Só que é muito sozinha, e com uma trajetória de vida bem complicada. Ela precisou morar com a tia, e não foi nada fácil. E agora ela está tentando reencontrar o pai.

-- Mas não precisava ter terminado o namoro. Isso que eu acho estranho. Me desculpe, vou te dizer o que penso. Ela não te ama. Se te amasse não abriria mão do amor por causa de um pai, que ela nem sabe se ainda vive. – Falou Cristina.

-- Eu sei, mãe. Eu até já fiz essa mesma reflexão. Mas ela tem as suas razões, não vivi o que ela viveu, por isso não a culpo. Eu me conformei, ainda que, eu a ame demais. Está sendo difícil para mim, muito difícil. Encerramos o assunto. Não se fala mais sobre a Valeria.

-- Está bem. Não vou mais falar. – Confirmou Cristina pesarosa pelo filho.

Giovani se entregou ao trabalho. Elaborou o projeto, que tinha em mente. O apresentou aos pais, que logo aceitaram a proposta do filho, e imediatamente, concordaram em investir na pousada. O fim de ano estava se aproximando, e era uma boa época para o turismo na região.

O tempo passava rapidamente.

Faltavam poucos dias para o Natal. 

A pousada estava reestruturada, alguns detalhes nos quartos para deixar mais acolhedor e confortável.  No setor de internet a mudança foi mais significativa.  O site tinha ficado muito bom, e as reservas para o verão estavam bombando.

Embora o projeto de Giovani se mostrasse eficaz, Cristina, não percebia a alegria no filho. Ele continuava sofrendo por amor.

 

Era uma segunda feira, cedo da manhã, quando um homem se apresentou procurando trabalho. Ele era muito humilde no modo de falar e vestir, e tinha um olhar sofrido.

-- Eu preciso trabalhar. Estou sem documentos, eu os perdi. Não tenho como provar quem eu sou. Faço qualquer serviço. Trabalho pela a cama e a comida.

-- O que sabe fazer? – Perguntou Catulino Dambróz.

-- Sou padeiro de profissão, mas pego qualquer trabalho. – Falou o homem.

-- Vou confiar no senhor, eu não sei nem o seu nome, e vou lhe pagar um salário e vou lhe empregar como padeiro, fará pão e bolos para a nossa hospedaria.

-- Obrigado, senhor! Sou muito grato. Me chamo Jorge Luís Silva Alves.

-- Terás um quartinho para dormir. Fica ali nos fundos, atrás de garagem.

-- Deus lhe pague. – Falou o homem com lágrimas nos olhos. – O senhor não vai se arrepender.

 

Valéria sentia muita falta de Giovani, aquela separação provou que ela não conseguia viver longe dele. Ela deu-se conta de que o amava, e precisava ir até ele. Pretendia fazer uma surpresa no Natal.

Foi conversar com o gerente do mercado, para pedir uma folga no Natal, mas o que arrumou foi uma demissão. Agora estava mais uma vez sozinha, sem trabalho e com o dinheiro escasso.

Sem saber como agir, Valéria foi até a igreja. Talvez na casa de Deus, diante de Jesus ela conseguisse tomar a decisão certa. Ela encontrou a porta lateral da igreja aberta. Entrou, e ajoelhou-se para orar. Terminou a sua oração e permaneceu quieta tentando escutar o seu coração.

Depois de um tempo ela saiu decidida.

Naquela mesma tarde ela tomou todas as providências, conversou com o seu senhorio e combinou a entrega do apartamento que morava. Arrumou as suas coisas, que continuavam sendo poucas, e foi para a rodoviária. Comprou a sua passagem.

Ao entrar no ônibus, ela pensou: está será a maior aventura de minha vida. Ela pouco dormiu durante o percurso. Eram muitas horas de viagem, o dia amanhecia quando ela viu o pórtico da cidade. Suspirou aliviada, estavam chegando! Olhou a paisagens e amou aqueles campos ondulados.

Valéria caminhou devagar pela rua, conforme a indicação que recebeu de uma mulher. A cidade era pequena, mas bem cuidada, e estava toda enfeitada para o Natal.

Ela gostou da cidadezinha.

A Pousada Dambróz tinha um pinheiro na frente, bem no meio do jardim, e ainda  estava com as luzes acesas. O dia já estava claro, no entanto, os habitantes da casa deviam estar dormindo.

Valéria sentou-se no banco que havia no jardim. Ainda não sabia o que ia dizer para o Giovani. Ficou apavorada ao pensar que ele não a quisesse mais. Talvez, até já tivesse uma outra namorada.

Se isso acontecesse, seria uma tragédia em sua vida; pois além de perder o amor de sua vida, ela não tinha para onde voltar! E o que seria dela, com poucos recursos num lugar estranho?

Em sua história de vida, Deus já a tinha enviado um anjo, na pessoa da irmã Adele. Outro milagre não aconteceria... Uma lágrima brotou em seus olhos, mas Valéria não se deixou dominar pelo desespero. Respirou fundo, levantou-se e tocou a campainha.

A porta se abriu, e uma mulher lhe sorriu ao dizer:

-- Bom dia! Seja bem-vinda a nossa pousada. Tem reserva?

-- Bom dia! Não, eu não tenho reserva. Na verdade, eu estou procurando pelo Giovani. Ele está? – Falou Valéria sentindo seu coração em disparada e as pernas bambas.

-- Ah! O Giovani não está. Ele saiu bem cedo. Foi  num encontro de agentes de turismo em Três Passos.  -- Explicou a mulher, a olhando com interesse.

-- Bah! -- Valéria ficou decepcionada. Não sabia o que fazer. – E ele demora?

-- Ele volta hoje, acho que na parte da tarde. – Respondeu a senhora olhando para a valise que Valéria carregava. – Estás chegando de viagem. Aceitas tomar um café comigo? Depois vemos o que fazer.

-- Obrigada. Eu não sei se devo...

-- Eu sou a Cristina, a mãe do Giovani. E tu quem és?

-- A Valéria.

-- És amiga do meu filho. Ele já me falou sobre ti. Venha vamos tomar o café juntas. – Falou Cristina conduzindo a moça para a sala do café.

Valéria observou que o lugar era muito acolhedor. Bem limpo e arrumado. Ela gostou muito ambiente. Também simpatizou com a dona Cristina.

A mesa estava arrumada com uma variedade de pães e bolos; frutas e cereais; queijos e salames; além de geleias e mel. O cheiro a fez lembrar a sua infância, pois em sua casa sempre havia o odor adocicado dos bolos que sua mãe fazia. Ao sentir o cheiro de pão fresquinho, o estomago de Valeria roncou. Envergonhada, ela olhou para Cristina e sorriu.

Depois da refeição, Cristina disponibilizou um quarto para a moça, que parecia abatida.

-- Muito obrigada. A senhora é muito gentil. – Agradeceu a moça sorrindo, e louca de vontade de se atirar na cama e dormir um pouco.

-- Imagina, tu és amiga do meu filho. Ele ficaria desapontado comigo, se eu agisse de outra forma. E dá para perceber que estás cansada. Descanse um pouco. Quando o Giovani chegar, eu te aviso. – Disse Cristina, a deixando sozinha.

Valéria tomou um banho rápido de deitou-se na cama. Dormiu, e acordou assustada com a batida na porta. Credo! Não sabia aonde estava... Ela demorou a se situar. Olhou o relógio, eram 10h30. Vestiu-se apressada e abriu a porta.

-- Desculpe. Eu dormi profundamente e tive dificuldade em acordar. O Giovani já chegou...

-- Não, ele ligou. Eu disse que tu estavas aqui. E ele pediu para que o esperasse. Ele retorna no fim da tarde. Portanto, se queres passear pela nossa pequenina cidade, me acompanhe. – Falou Cristina entusiasmada. Ela amava a sua cidade, e sempre que podia, mostrava os pontos altos de Tenente Portela.

Enquanto caminhavam pela rua, dona Cristina ia falando com entusiasmo. Então Valéria soube que a cidade tem um forte comercio local, que os campos produzem: soja, trigo, milho e fumo; leite, suinocultura, avicultura e psicultura, além do ramo madeireiro e moveleiro, e do turismo na região. Que são cerca de 14 mil habitantes, sendo que quase 9 mil vivem na cidade.

Na praça ela admirou o Monumento do Índio. Todo feito de sucata de metal e com 5 metros de altura.  O monumento presta uma homenagem aos primeiros habitantes do lugar: os Kaigang e Guaranis. A força desse povo está evidente na robustez da estrutura, que foi feita pelo artista Paulo de Siqueira, em 1985. E que por lei municipal, a estátua foi declarada Patrimônio Histórico e Cultural do Município, em tributo ao primeiro cacique Kaigang, da Terra Indígena Guarita.

Cristina também falou sobre o Parque do Turvo que ficava em Derrubadas, município vizinho. E do Salto do Yucumã, no rio Uruguai, que ali forma uma grande queda d’água longitudinal sendo a maior do mundo em agua doce, com 1.700 metros de cumprimento. Esse é um turismo regional, e a nossa cidade está bem estruturada para receber os turistas. Aqui nós temos uma bacia hidrográfica que nos dá muitas possibilidades. Acrescentou Cristina.

Valéria prestava atenção em tudo que a sua companheira falava, e contagiada pelo entusiasmo de Cristina, ela estava encantada pela pequena cidade, que enfeitada com guirlandas, anjinhos, arvores e luzes, dava a tudo um clima de magia.

Naquele passeio pela cidade, Cristina falou sobre a sua cidade, explicou algumas coisas a moça, mas também fez perguntas. Uma forma de conhecer a jovem, um pouquinho mais.

Cristina gostou de Valéria. Estava torcendo para que o seu filho a aceitasse novamente, porque era óbvio que a moça veio para reatar o namoro. E se tomou esta atitude, era porque gostava do Giovani.

Depois do almoço, Valéria se ofereceu para ajudar a na montagem da árvore de Natal. Era um pinheiro natural enorme. Embora estivesse se espinhando ao colocar os enfeites, ela estava feliz. Ela amava o Natal, e fazia muitos anos que ela não vivia essa emoção.

Giovani entrou na sala e ficou admirado ao ver Valeria em cima da escada ajeitando as correntes de festão vermelho em volta da árvore. Ela falseou o pé e ele correu para ampará-la.

-- Oi... Eu não te vi chegar – Falou Valéria descendo da escada. – Estou ajudando um pouco a tua mãe, que foi tão gentil...

-- Oi... – Respondeu ele a olhando com intensidade. – Eu recém cheguei.

-- O que achas da árvore? Está bem? Ainda falta o presépio.

-- Sim, está muito bonita. Olha de longe e veja com os teus próprios olhos. O presépio é sempre a mãe que arruma.

-- Bah...foi tão bom. Eu me lembrei do meu tempo de criança, quando eu, a mãe e o pai enfeitávamos a árvore de Natal juntos. Era tão divertido...

-- Vamos tomar um sorvete? – Convidou Giovani, com a intenção de conversar a sós. Sabia que se ficasse ali, a sua mãe ficaria tentando escutar a conversa.

-- Só me deixa juntar essas caixas. E podemos ir.

-- Eu te ajudo...

Ao passar pela portaria da pousada, Giovani avisou ao pai que estavam saindo. Estava nublado e bastante quente. Eles caminharam alguns passos e chegaram à sorveteria. Escolheram os sabores e sentaram em uma mesa junto a parede.

Enquanto saboreavam o gelado, a conversa foi sobre a cidade, sobre o passeio que ela fizera com Cristina. Giovani a escutou, sorria do jeito dela falar, e a olhava muito.

-- O que aconteceu para vires até aqui? – Indagou ele com seriedade. – Achou o teu pai?

-- Não, e nem sei se vou voltar a vê-lo. Não obtive nenhuma resposta. Percebi que tu tinhas razão, não é fácil, e as informações podem até serem falsas.

-- Então? – Insistiu ele.

-- Eu senti a tua falta. A minha vida ficou vazia, perdeu a alegria. Eu precisava vir te ver. Então, pedi uma folga para vir passar o Natal contigo, e acabei despedida. Entreguei o apartamento, juntei minhas coisas e vim para cá. Espero conseguir um trabalho por aqui. Eu gostei da tua cidade...

-- Voltastes à estaca zero. – Falou ele com sentimento de vitória.

-- É. E outra irmã Adele, não vai passar pela minha vida para me dar abrigo. Sei que eu fui grosseira contigo. Sei que fiz tudo errado, não agi conforme o meu coração. E depois me arrependi.

-- E o que tu queres que eu faça? – Ele sabia que estava a maltratando, mas ele também tinha sido maltratado.

-- Eu não sei... Vim por impulso. E confesso que quando aqui cheguei, fiquei com muito medo de ter agido precipitadamente. Talvez, tu nem me queiras mais, e até já tenhas outra namorada. – Valéria o olhava com o coração aflito. Suas mãos tremiam, e ela estava a ponto de chorar. Ela sabia que ele era um cara legal... Deveria ter outras moças o querendo.

-- Eu não tenho outra namorada, mas também não sei se quero voltar contigo. Tu me deste um fora, do nada, sem motivo. Simples assim, um fora bem dado! E agora me pedes para voltar?  Não sei, eu preciso pensar. – Ele foi sincero, disse o que realmente sentia. Seu coração ainda estava machucado.

-- E o eu faço? – Com os olhos lacrimejando, ela não conseguia esconder a decepção. Em sua imaginação, Giovani a receberia de braços abertos.

-- Falta pouco para o Natal. Eu te consigo um lugar para trabalhar temporariamente. É como atendente de loja de brinquedos. Vamos até lá, eu vou te apresentar para o seu Dino.

-- Eu não tenho como pagar a pousada. Paguei a multa do cancelamento do aluguel e a passagem para cá, e não sobrou quase nada.

-- Ficas hospedada na pousada por minha conta.  Serás a minha convidada. – Disse ele levantando-se. – Vamos.

Os dias passaram rapidamente. Valéria trabalhava com horário estendido, claro que receberia mais, e por esta razão ela não se queixava. Ela saia cedo e voltava tarde e cansada, e quase não via ninguém na pousada. Valéria só tomava o café matinal na pousada. Seu Dino fornecia um almoço e um lanche no fim da tarde. Assim quando chegava do trabalho, ia direto para o seu quarto, e não precisava mais sair. Ela estava evitando encontrar-se com o Giovani.

Giovani procedia como se Valéria não estivesse ali. Cristina não se intrometeu no acerto deles. Não perguntou nada ao filho, mas era evidente que não tinham se acertado. O aborrecimento dele demonstrava que Giovani continuava infeliz.

 

Catulino estava satisfeito com o trabalho do novo padeiro. A variedade de pães, biscoitos e bolos, que ele apresentava todas as manhãs no café, agradava aos hospedes e a sua pousada estava tornando-se famosa pelo café da manhã que apresentava.

Decidido a ajudar o seu novo empregado e regularizar a sua situação, Catulino procurou o seu amigo Bruno Nunes, que era advogado, para providenciar a documentação de Jorge Luís. E assim contratar legalmente o padeiro.

 

O povo de Tenente Portela era bastante festeiro. Em seu calendário anual havia várias festas e bailes programados. Inclusive as festas de fim de ano.

A representação do Presépio Vivo na praça central estava marcada para o dia 23 as 21h. Como era uma apresentação beneficente, e os lugares eram limitados, Giovani logo comprou os ingressos.

No domingo, Valéria trabalharia até as 13h. Estava um sol escaldante, e Giovani resolveu ir buscá-la de carro. Estacionou o carro, entrou na loja como cliente. Queria um brinquedo para a sua sobrinha, Camila que tinha apenas 3 anos. Foi a Valéria que o atendeu. Ela mostrou as opções que tinham para a idade da menina. E aconselhou que ele levasse uma boneca de pano, que além de ser leve, tinha o tamanho apropriado e era muito bonitinha.

-- Já está na tua hora. Vou te esperar e voltamos juntos para casa – Disse ele.

-- Não precisa... – Respondeu ela, sentindo-se revigorada.

-- Tu não fazes ideia do calor que está na rua. Eu não me animei a vir a pé. Vou levar um papo com o seu Dino.

-- Está bem.

Valéria ficou nervosa com a presença dele na loja. Fazia dias que eles não se viam. Seu coração estava saltando pela boca. Suspirou, devolveu as prateleiras os brinquedos que havia mostrado, e foi pegar a sua bolsa. Seu Dino já havia sinalizado que estavam fechando.

Giovani abriu a porta do carro para ela, esperou que ela sentasse e a fechou, deu a volta no veículo e sentou-se a direção, colocou o cinto, a olhou e perguntou:

-- Tenho uma proposta. Passamos em casa, almoçamos, vestimos uma bermuda e vamos a Derrubadas. Quero te mostrar o rio Uruguai. Vais amar. – Ele estava animado com o passeio. – É bem pertinho daqui.

-- Sim, vamos passear – Respondeu Valéria sentindo-se feliz. Talvez esse fosse um recomeço para eles... Não podia negar a si mesma, essa oportunidade.

Foi um passeio maravilhoso. Eles conversaram e divertiram-se como antes, mas Giovani não a tocou e tão pouco falou qualquer coisa que se relacionasse ao namoro. Haviam voltado aos tempos de amizade, só amizade.

Já estavam chegando de volta a pousada, quando Giovani falou:

-- Vai ter a apresentação do Presépio Vivo, eu já comprei os ingressos. Gostaria que fosses comigo. Sei que gostas dessas coisas. E como nossos dias são cheios, pouco nos vemos... já quero deixar combinado.

-- Sim. Eu gosto muito. É a noite?

-- Sim. Na quarta-feira. Eu te pego na saída do trabalho.

-- Está bem. Obrigada!

-- Não tens o que agradecer. Eu também gosto e não quero ir sozinho. Então estamos combinados.

 

Na quarta-feira, Valéria arrumou-se melhor e foi trabalhar. Ela estava tão ansiosa, que o dia se tornou muito longo. Ao enxergar Giovani parado na frente da loja, ela sorriu e acenou. Despediu-se do seu patrão e foi ao encontro de seu amigo.

-- Oi. – Disse ela com um imenso sorriso que iluminava o seu semblante.

-- Oi – Respondeu Giovani também sorrindo e a olhando com intensidade. – Vamos a pé. E pertinho.

-- Vamos...

Caminhando lado a lado, Giovani olhou para ela, seus olhares se encontraram, e ele a pegou pela mão, entrelaçou os dedos e caminharam em silencio, como namorados. Valéria não iria perguntar, mas aquele gesto significava muito. Eles estavam reatando o namoro.

A representação do Presépio Vivo foi sensacional, além do teatro, teve também a apresentação de corais cantando músicas natalinas.

No entanto, o melhor de tudo, foi que eles permaneceram de mãos dadas o tempo inteiro. Foi uma noite cheia de emoções. Valéria não cabia em si de tanta felicidade.

 

Cristina logo percebeu a mudança de status entre o Giovani e a Valéria. Na intimidade do seu quarto, ela disse ao marido:

-- Notaste o novo brilho no olhar do teu filho? Tenho certeza de que eles voltaram. Valéria também está iluminada.

-- É... acho que sim. O Giovani me pareceu menos tenso. Então é isso. Eu ando preocupado com a situação do nosso padeiro. Ele é um bom funcionário. Acho que devíamos convidá-lo para a nossa ceia de Natal.

-- Sim. Vamos chamá-lo. Não tem cabimento deixar o homem sozinho enquanto comemoramos a vinda do Menino Jesus. Não seria cristão.

-- Eu falo com ele. Agora vamos dormir. Estou cansado. O dia hoje não foi fácil. – Disse o Catulino beijando a esposa na face.

 

Era véspera de Natal.

Na pousada já estava tudo planejado. Iriam a missa da vigília, fariam a ceia e depois seria a troca de presentes.

Valéria sabia da programação da família Dambróz, mas ficou retida no trabalho. Um movimento de última hora não permitiu que seu Dino fechasse a loja no horário previsto.

Ela saiu da loja apressada, queria tomar um bom banho, e se arrumar para a ceia de Natal. Com o dinheiro que recebeu, ela comprou alguns presentes. Soube que o padeiro tinha sido convidado a participar com a família, ela não o conhecia, mas o incluiu na lista de presentes. Na verdade, não eram presentes, eram apenas lembrancinhas. Antes de ir para o seu quarto, Valéria colocou os seus presentes embaixo de árvore de Natal.

Ela tomou um banho, e enrolada na toalha, ela secou os cabelos, e depois deitou-se um pouco para descansar. Dormiu. Acordou com uma batida na porta. Era Giovani a chamando. Numa rapidez absurda Valéria vestiu-se. Desceu sorrindo.

Mais um Natal a comemorar. Ela amava esta data.

Entrou na sala e cumprimentou a todos e viu o padeiro sentado humildemente no canto. Ela olhou para o homem e seu coração disparou. Ela um dia iria morre do coração!... Eram tantas emoções em sua vida!

-- Pai? – Disse ela timidamente, aproximando-se do homem. Giovani ficou atento. Será que ela havia encontrado o pai?

-- Valéria? És tu minha filha? – Disse o homem olhando para a moça a sua frente – Céus! Tu estás igual a tua mãe... A minha saudosa Albertina. A tua tia Lilian não te tratou bem?

-- Eu também tenho saudades da mamãe. Eu te encontrei meu pai...  – Falou Valeria chorando. --Isso é um milagre de Natal.

Pai e filha se abraçaram.

A emoção contaminou a todos. A ceia de Natal foi cheia de alegria, e histórias de vida relatadas. Após a troca de presentes, Giovani se aproximou do seu Jorge sorrindo e o abraçou.

-- O senhor me concede a mão de sua maravilhosa filha?

O homem ficou sem saber o que responder. Olhou para a filha, como que pedindo socorro, e ela sorrindo sinalizou um sim movendo a cabeça.

Então cheio de orgulho, Jorge respondeu a moço:

-- É com imensa satisfação que eu lhe concedo a mão de minha filha. Que alegria!  Eu pensei que nunca teria oportunidade de dizer estas palavras. – Disse Jorge com os olhos marejados.

Giovani abraçou o seu futuro sogro com lágrimas nos olhos. Ele tirou do bolso um par de alianças. Pegou a mão de sua amada e colocou o anel no dedo anelar direito e a seguir Valéria fez o mesmo. O casal de noivos sorriu e logo foram abraçados por seus familiares.

Na manhã do dia de Natal, todos foram a missa, na matriz Nossa Senhora Aparecida, pois era preciso agradecer a Deus por todas as graças que receberam. O resgate do amor que unia Valeria e Giovani; e pai e filha que se reencontraram na noite de Natal.

Isso era a Magia do Natal, como dizia Valéria, que não cabia em si de tanta felicidade.

                                           Maria Ronety Canibal

                                                 Dezembro 2022.


IMAGEM VIA INTERNET

 

 

terça-feira, 15 de novembro de 2022

NADA É PARA SEMPRE


 

                        NADA É PARA SEMPRE

 

Núria estava feliz!

Sua vida tinha ganhado um significado, agora ela tinha uma razão para viver. Fernando, o seu grande amor, era o motivo de sua felicidade. Ela gostava de lembrar, o modo avesso, de como eles se conheceram.

Desde que a sua família foi mal de negócios, ela precisou buscar o seu próprio sustento. Ela nunca se sentiu bem-vinda naquela casa. Seu pai, depois da morte de sua mãe, casou-se novamente, e Rute, a sua madrasta, não a suportava.  A falência do pai, foi a oportunidade que Núria teve, para pular fora. E decididamente arrumou as suas poucas coisas e tomou o seu rumo.

Aos 18 anos, ela saiu de casa e mudou-se para uma pequena cidade turística. Alugou um quarto, em uma pensão barata e iniciou o seu próprio negócio. Um trabalho simples, mas seguro.

Com as economias que tinha guardado ela comprou uma carrocinha de pipoca usada, pintou de cor de rosa enfeitada com branco, e Núria, sempre usando um avental impecável, passou a andar pela pequena cidade, oferecendo o seu produto.

Ela ficou surpreendida com o dinheiro que juntou no fim do mês. Sorriu ao pensar que ser pipoqueira era um negócio rentável.

Assim, o tempo passava e a vida dela prosperava.

Dona Laura, a dona de pensão onde morava, era uma boa mulher. Conhecendo a história de Núria, se propôs ajudá-la. Além de costurar os aventais, ela também os lavava e passava, diariamente.

Naquele dia Núria tinha saído muito cedo de casa. Uma neblina deixara a visibilidade baixa, e de repente ela foi abalroada por uma camionete enorme. O carrinho de pipoca virou e ela caiu no asfalto.

Fernando parou o veículo, desceu rapidamente e muito assustado, lhe perguntou:

-- Moça, como estás? Eu não te vi... Está com alguma dor... Deixe-me ajudá-la a levantar. – Enquanto falava ele a pegou e a colocou em pé. Olhou-a de cima a baixo e comentou. – Não vejo nenhum sinal de sangue. Mas vou levá-la ao hospital.

-- Não, obrigada. Preciso desvirar o meu carrinho... – Disse ela, gemendo ao mover o braço, e com dificuldade de firmar o pé no chão. – É o meu instrumento de trabalho.

-- Está bem. Vamos erguer o carrinho. Mas, também vou levá-la ao médico.

Fernando olhou em volta, e viu que algumas pessoas estavam ali assistindo.  Ele notou que aquelas pessoas conheciam a moça. Um homem e um rapazote rapidamente ergueram o carrinho, e viram que estava quebrado.

-- Olha, não tem condições de uso. E agora? – Disse o homem.

Mais pessoas se juntaram ao grupo que olhava para Núria, que muito desolada falou:

-- Como vou fazer? Eu tiro o meu sustento vendendo pipoca...

-- Vamos dar um jeito. Primeiro precisamos ir ver se estás machucada. – Afirmou ele. – O senhor mora aqui?

-- Sim. – Disse o homem – Posso ficar com o carrinho, enquanto a moça consulta o médico.

-- Obrigado! – Disse Fernando abrindo a porta da camionete para que ela entrasse, e a ajudando a acomodar-se.

Já estavam a caminho do hospital quando ele se deu conta que não sabia o nome dela:

-- Eu sou Fernando Ruiz, e qual é o teu nome?

-- Núria Marques.

-- Não te preocupes com nada. Agora vamos ao hospital, depois vamos fazer o B.O. e logo vamos ver onde posso comprar um carrinho novo para ti.

-- É preciso mandar fazer.  – Observou ela sentindo-se desanimada. – E depende da boa vontade do carpinteiro. Se ele tem outra encomenda, vai demorar...

-- Não te preocupas, vou dar um jeito. Eu prometo.

Ao entrar no hospital todos abriram passagem para Fernando, que parecia ser o dono de tudo. Núria achou a atitude dele muito autoritária, ditando ordens. E ela não gostou do jeito dele.

Os ferimentos dela não eram graves, mas necessitavam de cuidados e Núria precisou ficar em repouso por um longo período. E sem poder trabalhar ela estava muito preocupada com a sua situação financeira.

Fernando ia seguidamente visitá-la. E dava-lhe notícias da carrocinha que tinha mandado fazer. Ele, também, já havia comprado todas as medicações que ela precisava tomar, e sem querer constranger a moça, ele havia acertado com a dona Laura, todas as despesas do mês.

Dona Laura estava muito admirada com a atenção especial que Fernando dispensava a Núria. Um dia ela perguntou a moça?

-- Tu sabes quem é esse rapaz?

-- Não sei nada sobre o Fernando. A senhora o conhece?

-- Não! Mas sei que a família dele é dona de quase toda a cidade. Gente muito rica e importante.

-- Hum. Então é por isso que no hospital todos são “sim senhor” para ele, o achei autoritário.

-- Sim, o hospital é da família deles, inclusive leva o nome do padroeiro do lugar de onde vieram. Hospital Santiago. Eles construíram o prédio e contrataram os médicos, e é uma referência em alguns tipos de tratamento.

-- Eu não fazia idéia de que ele fosse tão importante, e no entanto, ele tem sido muito atencioso comigo.

-- Sim, e ele parece ser um bom rapaz. Eles são quatro irmãos, esse deve ser o mais moço.

-- Além do hospital o que mais eles têm aqui na cidade?

-- Ora, quase tudo. Escola, hotéis, restaurantes, lojas, prédios... A cidade está se tornando turística graças ao trabalho do pai dele, o dr. Felipe Ruiz que foi prefeito. Hoje é o filho mais velho que administra a cidade, o dr. Tiago Garcia Ruiz.

-- Uma família de alto padrão!

-- Sim. Cuidado! Não vai te apaixonar, pois o Fernando é um rapaz simpático, educado e bonito. Sei que ele é cativante, mas não é para ti.

-- Eu sei. Não se preocupe. Sei que sou um nada perto dele. Mas concordo que ele é muito lindo, aqueles olhos verdes são magníficos...

 

Fernando era um homem jovem, de 28 anos, e recentemente tinha ficado noivo de Ariele Montes, por influência de sua família.

Ariele era filha de José Montes, um vinicultor de renome. Sua vinícola tinha fama internacional, e por isso,  trazia muitos turistas para a região.

Fernando nutria um sentimento de amizade por Ariele, se conheciam desde crianças, e foi natural eles assumirem uma relação, que renderia muitos lucros a ambas as famílias.

O casal formava um lindo par, pois a Ariele era muito culta, elegante, e era dona de uma beleza incomum. Formada em Administração ela trabalhava com pai. Era filha única e muito mimada, e vivia com se fosse uma princesa. Suas vontades eram uma ordem!

E Fernando, o mais novo dos irmãos, cresceu sem regalias. Desde cedo, ele descobriu que deveria correr atrás das coisas que desejava. Atualmente, trabalhava com o pai, na construtora e era responsável pela área de Marketing. E isso o obrigava a viajar seguidamente.

Com a data do casamento marcada, Fernando andava tenso e muito contrariado. Estava ciente de que Ariele não era o que queria para si mesmo, ela não era a esposa almejada. E estava arrependido de ter se deixado levar por seus familiares.

Naquela manhã ele tinha saído de casa preocupado, pois estava descobrindo que Ariele não era a flor que aparentava ser. Ela era muito mais espinhosa.

Um tanto distraído com seus pensamentos e com uma densa neblina que dificultava a visibilidade, ele acabou atropelando a pobre pipoqueira. Sentia-se culpado. A moça precisava trabalhar e ele havia destruído o seu meio de trabalho. Por isso ele a visitava regularmente.

 A moça ainda não estava restabelecida, e, portanto, não podia retomar o seu trabalho.

Núria era uma jovem de 20 anos, madura para sua idade, e muito bonita, ao contrário de Ariele, ela tinha uma beleza angelical. Seus traços eram delicados, sua pele suave e muito clara, contrastava com os olhos e cabelos escuros. Era educada, tranquila e cativante.

E Fernando estava muito atraído por ela. Agora ia quase todos os dias vê-la. Não conseguia mais ficar sem aquele sorriso encantador, sem escutar aquela voz melodiosa, enfim não conseguia mais ficar longe dela. Um novo sentimento surgiu no coração de Fernando. Era um bem-querer, algo forte e inédito para ele.

Consciente de que Núria era o oposto de Ariele, de que ela era muito jovem, e de que precisava ainda estudar; e sobretudo de que ela não estava à altura de sua família, ele a queria em sua vida, não se importava com esses detalhes, ele precisava dela e com urgência.

Ele tinha uma urgência, parecia que o seu tempo era breve. E por isso, Fernando não queria desperdiçar nenhum segundo de felicidade. Ele admitiu, para si mesmo, que a amava apaixonadamente. Isso sem nunca ter tocado nela. Era um amor puro, algo inexplicável.

Por isso, Fernando tratou de desfazer o seu compromisso com Ariele. Era evidente que ela também estava arrependida... pois, as brigas entre eles, tinham se tornado intensas e constantes.

As famílias quando souberam que Ariele e Fernando haviam desfeito o noivado ficaram alarmadas. Ariele aproveitou a ocasião e foi viajar. A Australia era o seu destino.

Fernando permaneceu na cidade, agora livre para conquistar o amor da sua pipoqueira.

                                                 ---

Enfim Núria estava liberada para poder trabalhar.

-- Minha amiga, eu tomei a liberdade de fazer algumas alterações no teu negócio. Tudo para melhorar. A papelada está toda pronta, tu só precisas assinar. Mas antes, quero te mostrar como será. Combinado?

Ele a levou até o “O Mundo Infantil”, um parque de diversão com um grande fluxo de pessoas. Bem no centro, onde havia a praça de alimentação, e lá estava a carrocinha de pipoca, toda cor de rosa, com o nome pintado em branco. “Pipocas DA MOÇA BONITA”.

-- Um lugar esplendido para os negócios, eu reconheço, no entanto, eu não tenho como pagar pelo espaço. – Observou ela com tristeza. – Aqui eu venderia bem mais.

-- Sim, e por um preço melhor. Não precisas pagar por nada. Eu criei a tua marca de pipocas, mais adiante poderás até ter uma franquia. Eu te prejudiquei muito, sem intenção, é claro. E essa é a forma que eu achei de te ressarcir do teu prejuízo. Está tudo pago e no teu nome. É só assinar os contratos.

-- Não! Tu já pagaste mais até do que o necessário. Sei que pagou as minhas despesas do mês, minha medicação, e aqui está a carrocinha nova.

-- Assina esses papeis e aceita está oportunidade que está a tua frente. Eu fui culpado, vinha distraído e não te vi. Me ajuda a acalmar a minha consciência. Por favor!

Núria olhou em volta. Trabalhar ali seria muito bom, não precisaria mais empurrar a carrocinha e andar por toda a cidade... Seria muito mais confortável, além de estar protegida das intempéries. Decidiu aceitar.

-- Está bem vou aceitar. – Disse ela sorrindo.

-- Vamos até o meu escritório. – Respondeu Fernando a tomando pela mão. – Venha, é aqui em frente.

O prédio em que ele trabalhava era moderno, bonito e do último andar se avistava os limites da cidade. Núria apreciou a vista. Depois que ela assinou todos os documentos, Fernando lhe fez um convite.

-- Para comemorar eu vou te levar para almoçar na Galeteria do Abuelo. Sabes o que significa abuelo?

-- Sei, é uma palavra espanhola que significa avô ou vovô.

-- Exatamente. Foi do meu avô, até ele morrer. Hoje a minha família administra, e é um lugar muito bom.

-- Eu sei, mas nunca fui.

-- Aceitas?

-- Sim. Vamos estou faminta.

Aquele almoço selou a amizade entre eles.

A partir daquele momento eles passaram a se ver quase todos os dias.

A relação tinha se tornado sólida, aliás, era muito mais do que amizade, era amor que eles sentiam um pelo o outro. Um amor ainda contido.

 Núria estava prosperando, pois, a pipoca DA MOÇA BONITA, tinha conquistado um lugar de destaque e com o seu sabor especial, que agradou, especialmente as crianças.

Fernando mirava no futuro, e a pedido dele ela se preparou para prestar vestibular para a faculdade de Nutrição, que o seu ramo.

O tempo passava, e depois de ingressar no curso de Nutrição, Núria precisou contratar uma senhora para ficar na parte da manhã, enquanto estudava.

Tudo fluía em sua vida.

A paixão era grande, e Núria aceitou a proposta de Fernando, e mudou-se para o apartamento dele, assumindo assim publicamente um relacionamento sério.

Fernando, que estava exultante de felicidade, levou a sua amada para conhecer a sua família. Aos sábados, todos os filhos e netos se reuniam na casa de Felipe e Anete Ruiz, para o almoço semanal.

E naquele dia Fernando, sem avisar a família, apareceu com a namorada a tiracolo. Ele queria fazer uma surpresa. E fez! Todos olharam a pobre Núria de alto abaixo, e a cumprimentaram com educação e frieza.

Ela manteve a cabeça erguida, não iria se deixar abater pela situação. Nenhuma das pessoas ali presente, conversou com ela e tão pouco a dona Anete se esforçou para inclui-la no assunto. Ao contrário, mantiveram distância, e a deixaram sozinha na sala.

Fernando estava reunido com o pai e os irmãos na outra sala, conversando sobre negócios. E quando se livrou da reunião, ele a viu sozinha e isolada, Fernado a pegou pela mão e saiu furioso da casa dos pais. Sua família iria pagar caro por essa atitude.

O namoro continuava firme, apesar de estar enfrentado algumas dificuldades por causa da família dele, especialmente a mãe dele, dona Anete. Mas Fernando não ligava e justificava, dizendo:

-- Minha mãe é muito boa, porém autoritária, eu a amo, afinal é minha mãe. No entanto, não vou permitir que interferira na minha vida amorosa. Eu quase fiz a besteira de me casar com a Ariele, a moça escolhida pela família. Tive a sorte de prever o futuro turbulento que me esperava. Saltei fora na mesma hora. A Ariele também ficou feliz. Nós estávamos noivos só para satisfazer a vaidade de nossas famílias. E agora reagem negativamente a tua presença. Eles nem te conhecem... O que mais me entristece, é que tu ficaste magoada com as atitudes arrogantes de dona Anete.

-- Ninguém merece ser rejeitada gratuitamente... Eu não vou me abater. Não vou dar esse gosto a elas, jamais! Eu tenho a ti, e é só o que importa. Nem minha família e tão pouco a tua. Apenas nós dois. Pertencemos um ao outro. Temos o nosso mundo próprio.

-- Tens razão meu amor. Eu preciso manter as relações comerciais, mas as relações familiares morreram. Eles não me respeitam. Deviam ao menos, em consideração a mim, ter te tratado com atenção. Vamos viver o nosso amor, vamos ser felizes... e aproveitar o tempo que temos.

-- Sim vamos ser felizes para sempre.

O tempo passava, e Fernando nunca mais pisou na casa dos pais. Ele vivia exclusivamente para a sua amada. Eles passeavam, curtiam a vida, eram felizes.

Núria tinha terminado o seu curso de Nutrição. Logo conseguiu trabalho numa clínica de repouso para idosos. O lugar onde ela trabalhava era lindo. Um casarão em meio um jardim magnifico, cercado por um bosque natural. E muito perto do local onde morava.

A rotina do casal seguia perfeita.

Naquela tarde após deixar a clínica de repouso, Núria passou no mercado e comprou alguns itens específicos. Queria fazer daquela noite, uma noite inesquecível, por isso fez um jantar especial.

Quando Fernando entrou em casa, ela o surpreendeu com a mesa posta com elegância e com velas acesas. Núria havia comprado um presente para ele, que daria na hora da sobremesa.

-- Isso é inspiração, meu amor? – Perguntou Fernando a abraçando.

-- Sim. Eu penso que essa noite ficará em nossa memória, porque será única. – Respondeu Núria sorrindo.

-- Vou tomar uma chuveirada. Prepara as bebidas. – Disse ele se dirigindo ao quarto.

O jantar foi agradável, Núria cozinhava muito bem. Depois de saborearem a sobremesa, ela alcançou para Fernando um pequeno pacote.

-- O que é isso? – Disse ele sacudindo a pequena caixa, que não emitia barulho.

-- Abra, e saberás porque está noite será inesquecível...

Fernando abriu o pacote e se deparou com um par de meia infantil. Ele a olhou e se emocionou.

-- Tu estás gravida, minha querida... Um filho a caminho... Ah... eu te amo, te amo tanto... – Disse ele a abraçando e a beijando.

Naquela noite eles se amaram com paixão e emoção. Depois de fazerem amor, ele a manteve junto dele e sussurrou:

-- Vamos nos casar. Essa criança terá uma família de verdade, o amor será visível para ela, porque nós nos amamos sinceramente.

-- Sim, e o nosso amor será para sempre assim, sincero e profundo.

-- Amanhã vamos ao médico. Quero que sejas muito bem cuidada.

-- Gravidez não é doença... Eu já estive na minha ginecologista. Dra. Marina Couto.

-- Eu a conheço, é muito boa. Mas eu quero te acompanhar, quero conversar com ela... – Afirmou Fernando.

-- Está bem vou marcar um horário.

-- Amanhã! – Insistiu ele. – Agora vamos dormir.

 

Nos dias que se seguiram, Fernando procurou o seu amigo Mateus, que era advogado. Pediu ao amigo que formulasse um testamento, onde Núria era a única beneficiaria de todos os seus bens, se algo lhe acontecesse antes da celebração do casamento.

-- Meu amigo, estás doente? Fazer um testamento é coisa de velho. – Disse Mateus zombando.

-- Eu sei, mas conheço minha família... Núria não tem ninguém, e se algo me acontecer eu quero pelo menos deixá-la com segurança financeira, e estamos grávidos.

-- Desculpe. Não devia ter brincado com algo tão sério. Sei que a tua mãe não aceitou a tua futura esposa na família. A fofoca se espalhou pela cidade e muitas pessoas ficaram indignadas com a atitude dos teus familiares, até porque, os teus irmãos e cunhadas, poderiam ter dado alguma abertura a moça.

-- Dona Anete dita as ordens. Tu bem sabes...

-- E como sei! Também não passei no teste de aprovação. Minha família não tinha muitas posses.

-- Exatamente.

Fernando querendo compensar a sua amada, pela forma deplorável que tinha sido tratada por sua família, planejou uma viagem.

Ele a levou para conhecer Paris, mais um sonho que ela iria realizar. Era o seu presente de casamento. A viagem foi alegre e divertida. Núria se apaixonou pela cidade... Antes de voltar eles atiraram um cadeado com os seus nomes gravados, no rio Sena, já que na ponte não era mais permitido colocar.

Voltaram animados. Dentro de um mês estariam definitivamente ligados pelos laços da lei. A gravidez seguia dentro da normalidade e estava entrando para o quinto mês.

O casamento seria no próximo sábado.

Precisamente naquela semana Fernando precisava viajar, e na segunda feira bem cedo ele pegou a estrada, para retornar na sexta feira, o mais tardar.

Mas antes ele foi até a casa dos pais para informar sobre o casamento, e foi muito breve ao dar a notícia.

-- Passei para dizer que serei pai, e no próximo sábado, as 11h estarei no cartório, diante do juiz de paz celebrando o meu casamento com a mulher da minha vida. Depois estaremos diante do padre, e Núria, enfim será a minha esposa. Com licença preciso pegar a estrada.

Ele saiu apressado. Não queria conversar, mas precisava anunciar o seu casamento. Ele guardava uma profunda mágoa de sua família, principalmente da mãe, que nunca fez um gesto de arrependimento e de conciliação.

Enquanto ele dirigia pensava nas vezes que foi discriminado por seus irmãos. Hoje ele entendia a razão. Seus irmãos eram soberbos, não se interessavam pelos mais desvalidos, inclusive, retiravam da cidade, as pessoas mais humildes, que chegavam em busca de trabalho, e de melhores oportunidades. Queriam que a cidade tivesse um alto padrão, coisa que ele não concordava. Sempre pensou que todas as pessoas tinham os mesmos direitos, as mesmas oportunidades. Cansou de discutir, principalmente com o Pedro, o irmão número dois.

                                                ---

“Depois de tempestade vem a bonança.”

É o que diz o ditado popular.

Após uma tormenta assustadora, o sábado tinha amanhecido com calmaria, o sol brilhava iluminando o dia. Era o dia do seu casamento... Era para ser um dia de felicidade.

Mas a felicidade tinha sido arrancada de sua vida, e a tristeza e o desespero imperavam. Núria chorava copiosamente!

O seu amor não estava mais ao seu lado. Fernando tinha partido para sempre.

Ela recordava a última vez que fizeram amor. Eles haviam se entregado com paixão e emoção, como se fosse a derradeira vez, como se não houvesse amanhã. Núria pressentia que Fernando vivia a sua vida intensamente, como se fosse sempre a última vez... E foi!

Núria tentava recordar o dia anterior, precisava lembrar de todos os detalhes, pois cada detalhe seria guardado em seu coração.

Ela acordara com o telefonema de Fernando, como ele fazia sempre que estava viajando. Falaram e riram cheios de felicidade. Núria levantou-se, tomou banho e se vestiu para ir para o trabalho. Tomou o seu suco e comeu frutas e sucrilhos. Saiu apressada, porque como sempre estava atrasa. Andava pela rua e sorria, quem a visse a acharia louca. Mas ela estava louca de tanta alegria.

Seu dia no trabalho foi normal, sem nenhum incidente. No início da tarde o tempo mudou, uma forte tormenta se aproximou, o céu escureceu, ventos fortes derrubaram árvores e postes. Faltou luz, e então uma chuva pesada desabou.

Sem poder ir para casa, ela permaneceu na clínica, assim como os seus colegas, até a noite. Por fim, uma van levou os funcionários em casa.

Núria esperava que Fernando já estivesse em casa.

Ela entrou sorrindo, morrendo de saudades, só queria se aconchegar no seu abraço. O apartamento estava silencioso. Uma angustia tomou conta de seu coração. Fernando tinha o hábito de avisar quando ia se atrasar.

Núria pegou o telefone e ligou, mas a ligação não se completava, informava que o aparelho estava fora de área. Alguma coisa tinha acontecido.

Se encheu de coragem e ligou para o prefeito, o irmão mais velho de Fernando, mas este também não atendeu. Nervosa ela andava pelo apartamento sem saber o que fazer. Era madrugada, e sentindo-se cansada e com dores no ventre, Núria deitou-se e acabou dormindo.

Era muito cedo quando a campainha tocou com insistência. Núria levantou-se e caminhou até o interfone. Sentia-se tonta e sem saber qual era o dia da semana. Sua mente não conseguia entrar na realidade.

Laura chegou à porta do apartamento e viu que estava apenas encostada. Entrou e caminhou cautelosamente até o quarto, e ali encontrou a sua querida menina completamente desnorteada.

-- Minha querida, como estás? Vim-te dar apoio, nestas horas não se tem palavras consoladoras. – Disse Laura a abraçando carinhosamente.

-- Não sei do que estas falando. Acordei meia zonza, mas agora já estou bem. Fernando já devia ter chegado... Ontem me senti indisposta, com dores na barriga. Estou com medo... – Disse Núria chorando.

-- Então ainda não sabes! Ninguém te avisou? – Falou dona Laura com indignação. – Coube a mim essa penosa missão.

-- O que aconteceu? – Indagou ela com impaciência.

-- O Fernando sofreu um acidente, um grave acidente. Seu carro foi atingido por um ônibus desgovernado, na hora do temporal. O  carro dele rolou morro abaixo e ainda não o encontraram. Não se sabe se está vivo...

-- Não!!! – Gritou Núria e perdendo os sentidos.

Laura imediatamente ligou para a emergência pedindo uma ambulância. Núria foi levada para o hospital, onde ficou internada, sua gravidez estava em risco.

Núria chorava continuamente, um choro manso, mas as lágrimas escorriam e ensopavam o travesseio. O médico tentava mantê-la calma, no entanto estava difícil.

Naquela tarde o corpo do Fernando foi encontrado sem vida. As cerimonias fúnebres aconteceram e foi uma grande comoção na cidade, e Núria não esteve presente.

Uma semana depois, Núria deixou o hospital e foi para o apartamento, e Laura a acompanhou. Decida a não pedir favor para família Ruiz, ela estava separando as suas coisas para deixar o apartamento. Voltaria a morar na pensão e mais tarde alugaria um apartamento para si.

Núria ainda estava de repouso e, portanto, não tinha retomado o trabalho. E dona Laura tinha ido até a pensão para ver como as coisas estavam. Desde aquele sábado fatídico, ela permanecia ao lado de Núria, deixando a pensão a cargo de sua cozinheira, a dona Zulmira.

Passados uns dias, e uma quarta-feira de manhã dona Anete acompanhada de sua nora Paola, chegou ao apartamento do filho, com prepotência e frieza, e ordenou:

-- Esse apartamento era do meu filho, quero que saias imediatamente daqui.

Muito pálida e abatida, Núria mal conseguia ficar em pé. Mas respondeu com veemência:

-- Não quero nada de sua família. Já estou com tudo empacotado, ainda não deixei esse lugar porque devo fazer repouso, o médico ainda não me liberou. – Explicou ela segurando a barriga que já aparecia. -- Não se preocupe, logo sairei. O único membro da família que era uma pessoa de valor, Deus pegou para si. Não quero proximidade com nenhum de vocês.

Anete inspecionou o apartamento e foi embora com a mesma arrogância que chegou. Núria suspirou e fechou a porta. Deitou-se no sofá e chorou.

No dia seguinte, Mateus ligou marcando um horário. Eles precisavam conversar. Ela lembrava-se dele. Fernando gostava muito desse seu amigo de infância. Mateus era um rapaz simpático, que também, não era bem aceito pela família Ruiz.

Sentindo-se melhor, Núria pediu que dona Laura estivesse ao seu lado. Não tinha ideia do assunto que Mateus teria com ela. Mas estava com receio. O que mais de ruim poderia vir?

Na hora combinada Mateus tocou o interfone. Laura atendeu e o recebeu.

-- Boa tarde! Sente-se, a Núria já vem.

-- Como ela está? Não tem sido fácil, imagino.

-- Não! Ela esteve hospitalizada, quase perdeu o bebê. Ainda está sob cuidados médicos.

-- Pelo menos, venho trazer boas notícias. Mas não sei quais serão as consequências.

-- Mais problemas... – Disse Laura.

Núria estava entrando na sala.  Apesar de estar sentindo-se bem, ainda tinha a aparência frágil. Magra, pálida e triste.

Mateus a olhou e logo percebeu o quanto ela tinha mudado. Aquela moça bonita e jovial, não estava mais ali. Embora ainda tivesse um rosto perfeito, os olhos tinham perdido o brilho.

-- Meus sentimentos! Estou aqui para cumprir a última vontade do meu querido amigo. Preciso fazer a leitura do testamento que ele deixou. Terá que ser na presença dos pais e irmãos do Fernando, e claro, da tua também. Acho que devemos fazer essa leitura o mais breve possível. O local será no meu escritório. Quando terás alta do médico?

-- Eu me sinto melhor. Ainda não voltei a trabalhar, mas creio que ir até o teu escritório não será nenhum transtorno.

-- Podemos marcar para a próxima segunda-feira as 10h.

-- Sim. Será perfeito.

-- Obrigado pela atenção. – Disse Mateus levantando-se -- Quero que saibas que o Fernando era como um irmão para mim, e o que precisares estou a tua disposição, não só eu, mas também minha esposa, a Mirtes.

Núria o acompanhou até porta e agradeceu dizendo:

-- Obrigada. Eu sei que vocês eram bons amigos, que se queriam como irmãos. E sei, que também, estás com o coração ferido.

Na hora marcada Núria chegou ao escritório do Mateus, e a família Ruiz já estava reunida na sala onde seria feita a leitura do documento.

-- Bom dia! – Disse ao entrar na sala.

Um murmúrio foi a resposta que escutou. Sentou na cadeira indicada e aguardou. Mateus sentou na cabeceira da mesa, abriu o lacre do envelope e iniciou a leitura.

À medida que a vontade de Fernando ia sendo proclamada, a indignação se mostrava nas feições da família Ruiz. Anete a olhava para Nuria com aversão.

-- Não pode! Meu irmão não estava em sua sanidade! -- Falou Tiago, interrompendo a leitura. – Não aceito. Uma fortuna nas mãos dessa pipoqueira! Vou à justiça.

-- Por favor deixe-me terminar. – Falou Mateus. -- Mas quero adiantar que o documento tem valor e foi assinado por quatro testemunhas.

O documento declarava Núria como a sua única herdeira, e receberia todo o seu patrimônio: imóveis, joias, ações e dinheiro no banco. E que o filho que ela carregava no ventre, receberia as ações das empresas Ruiz, que somavam 15% de todos os empreendimentos, que seriam tuteladas por Mateus.

A família, furiosa e indignada, levantou e saiu sem se despedir. Mas antes todos a olharam com ódio. Núria enfrentou o olhar, mesmo sentindo o desprezo por eles, ela jamais baixaria os olhos diante deles.

Mateus combinou os procedimentos que teriam que ser feitos para passar tudo para o nome dela, com exceção das ações. Ao fim da conversa, ele a levou em casa.

                                                   ---

A vida de Núria mudou, com o filho nos braços, ela tinha tranquilidade financeira. Não precisava nem trabalhar e as suas pipocas continuavam a vender bem.

No entanto, permanecia um vazio em sua vida, uma tristeza imensa em seu coração, que nem a alegria de ser mãe superou. O menino a fazia lembrar constantemente do amor perdido, pois era parecidíssimo com o pai.

Para padrinho do filho, ela convidou o Mateus e Mirtes, que tinham se tornado seus amigos. Na pia batismal, o menino recebeu o nome do pai: Fernando Garcia Ruiz Filho.

Definitivamente, dona Laura mudou-se para o apartamento de Núria, que ainda andava muito triste a abatida. Mesmo atendendo o filho com carinho e atenção, demonstrando um imenso amor pela criança, Núria não conseguia deixar de pensar em seu eterno amado.

Os dias passavam, e aos poucos a vida ia entrando na rotina. Mesmo com o coração sangrando, ela seguia em frente, e ao contrário do que todos diziam: “Com o tempo a dor ameniza...” a sua dor não amenizava.

Fernando completara 4 anos, e Núria voltou a trabalhar. Com o filho na escolinha ela optou por meio expediente.  Um dia ao chegar à escolinha para pegar o filho, ela viu que dona Anete estava muito perto do Fernando. Assustada ela correu em direção ao filho, e o pegou pela mão.

-- Tudo bem meu amor? – Perguntou ela a criança.

-- Mãe ela disse que é minha avó. Eu tenho avó?

-- Sim, ela é a mãe do teu pai. Tu não tens avó pelo meu lado. Minha morreu quando eu era muito pequena. Mal lembro dela. – Respondeu Núria ao filho encarando a sogra.

-- Ele me faz lembrar o Fernado nesta idade. É a cópia fiel do pai. – Falou Anete em tom conciliatório. – Eu também sinto falta dele, e essa criança é um pedaço do meu filho. Quero paz, estou muito arrependida dos meus atos. Precisamos conversar. Aqui não é lugar. Tu aceitas as minhas desculpas?

-- Eu aceito conversar. Amanhã pela na cafeteria. As 9h.

-- Obrigada. Até amanhã. – Disse Anete despedindo-se do neto com um beijo na face.

Depois que a sogra se afastou ela perguntou ao filho:

-- Desde quando ela conversa contigo?

-- Não é sempre que ela vem. – Disse o pequeno Fernando. – Eu gosto da minha avó.

-- Eu sei que gostas. Por que não me contastes? Foi ela que pediu segredo?

-- Não, ela não pediu nada. Não contei porque eu esqueci.

-- Está bem vamos para casa. Mas uma coisa tu precisas aprender: Não se fala com estranhos! Já pensou que ela poderia ter te levado para longe de mim.

-- Eu não quero ficar longe de ti, mãe. Não falo mais com estranhos, eu te prometo.

-- Está prometido! E nem aceita nada de pessoas desconhecidas. Não foi isso que o teu padrinho te explicou?

-- Sim, o padrinho me disse que é perigoso.

-- Então estamos combinados.

Naquela noite, quando o Fernando já estava dormindo, Núria contou a Laura sobre o encontro que tivera com Anete.

-- Eu acho que agistes bem. Não deves semear a desavença no coração do teu filho. Um dia ele vai conhecer os fatos e então poderá julgar as tuas ações. E elas serão de paz.

-- É, tens razão. Amanhã vamos nos encontrar para conversar. Posso permitir que eles tenham relação com o neto, mas eu não quero saber dessa gente.

-- Filha, deixe o tempo correr, nesta vida nada é para sempre. As pessoas mudam... Pensa que Fernando iria ficar feliz se houvesse harmonia. Faça isso pela memória dele.

-- Tens razão e o meu filho seria mais feliz. – Disse Núria pensativa.

Na manhã seguinte, seguindo o conselho de Laura, ela foi para o encontro com sogra completamente inerme. Deixou para trás todas as magoas e apostava em uma nova relação familiar para o seu filho.

Quando ela chegou à cafeteria, dona Anete já a esperava. Com um sorriso amplo e um abraço, elas se cumprimentaram. Sentaram e conversaram sobre muitas coisas, foi uma conversa dolorida, mas necessária.

-- Eu quero apresentar o Fernandinho para a família. Todos já o viram de longe, no entanto, é preciso cultivar uma relação de proximidade. Sem o pai, esse menino, precisa de exemplo masculino. Os tios estão ansiosos para tê-lo por perto.

-- Ele tem um padrinho que o ama muito. E o ensina a ser uma pessoa de bem. Fernandinho tem em sua volta pessoas que o amam verdadeiramente.

-- Que bom! Neste sábado, como é tradição, estaremos reunidos em minha casa. Posso esperar por vocês?

-- Sim, estou disposta a proporcionar para o meu filho uma vida harmoniosa. Nós estaremos lá... – Núria tinha vontade de completar a frase com “apesar de tudo que fizeram a mim”. Mas calou-se pelo bem do futuro do filho. Engoliu em seco e levantou-se para ir embora.

As duas despediram-se com um beijo.

Sorriu ao sair da cafeteria e conjeturou...

A paz estava selada... Seria duradoura?

No fundo do coração, Núria sonhara com isso. Sempre soube que Fernando havia se distanciado de seus familiares por causa dela. E isso a incomodava. Ela tinha esperança que depois do casamento e do nascimento do filho, as coisas se ajeitassem. Mas o casamento não aconteceu e Fernando não estava mais entre eles. Agora, por seu filho, iria deixar o seu orgulho de lado e fazer o possível para que ele crescesse em meio a paz e a alegria.

A família Ruiz se esmerou para receber com carinho e atenção o novo membro. E Fernandinho era o retrato vivo do pai, deixando seu avô emocionado. Seu Felipe não conseguiu esconder as lágrimas que derramou ao abraçar o neto.

Daquele dia em diante, a convivência familiar foi se intensificando, a ponto de passarem as férias de inverno juntos. Felipe e Anete convidaram mãe e filho para um passeio a Disney. Claro que Fernandinho adorou.

Mas foi no Natal daquele ano que a relação se solidificou. Todos demonstraram a Núria, respeito e amizade. E ela sentiu-se muito grata, porque a pior data para passar sozinha com o filho era o Natal.

Naquele ano, a festa de Natal dos Ruiz foi restrita a família. Dona Laura foi convidada, já que para a Núria ela era como uma mãe. Pois, foi a velha senhora que ficou ao lado de Núria no pior momento de sua vida. E Anete reconheceu que o valor das pessoas está no seu modo de ser e agir, e não pela roupa que usa.

Foi uma festa divertida e barulhenta, e as crianças adoraram a presença do Papai Noel que chegou ao jardim de trenó.

Fernandinho estava feliz! E isso bastava para a Núria.

O tempo passava, a vida fluía, contudo a dor em seu coração não passava. Todos os dias, ela lembrava com saudades, o tempo que tiveram juntos, um tempo breve, mas intenso.

Fernando a amou de verdade, foi um amor sincero e profundo, que ela continuava sentindo por ele.

Jamais voltaria a amar da forma que amava o seu Fernando. Mesmo não tendo feito os votos diante do padre, ela permanecia fiel.

Quem sabe no futuro outro homem pudesse atrair a sua atenção...

Talvez, só talvez...

                                                      Maria Ronety Canibal

                                                           Novembro 2022

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