AMIGOS...
A festa de casamento estava
muito animada. Tamires e Daniel tinham dançado a valsa nupcial, abrindo assim o
baile, quando Mauricio aproximou-se de Camila, e a convidou para dançar.
Camila estranhou, pois ele
tinha um caso mal resolvido com uma amiga dela, a Leila. Mas aceitou, afinal
estavam numa festa de casamento. Ele era um cara legal, mas vivia em apuros, pois
tinha um problema muito grave, não conseguia ser fiel às suas namoradas.
Camila divertia-se com as histórias
relatadas por Leila, que muito apaixonada, não conseguia se afastar de Mauricio,
passava se queixando, não tinha determinação e humilhava-se todos os dias.
-- Mauricio, a Leila está me
olhando atravessada... Vocês brigaram outra vez? – Perguntou Camila, deixando
enlaçar por ele.
-- Estamos brigados faz
tempo! Eu não aguento mais, ela passa me infernizando, já implorei para ela me
deixar... E ela nem é da nossa turma, que é eclética, cada um com a sua
profissão, mas temos em comum a nossa paixão por cavalos.
-- Verdade. A Leila adora
cães. Já nem sei mais quantos ela tem.
-- Não quero te mentir, mas
já são 32 na casa da mãe dela. E no sitio em que dela são uns 18. Portanto somam
50.
-- Bah... é muita coisa... Me
explica a razão da briga de hoje?
-- Ela fica implicando. Disse
que eu estava olhando para uma mulher. Não sei o que ela pensa... Para onde vou
olhar, senão para uma mulher? Eu estou certo?
-- Perfeitamente. – Afirmou
Camila rindo. – Eu acho que bebi demais. Eu estou dançando nas nuvens...
-- Isso é o efeito da minha
companhia.
-- Acho que é efeito do
álcool, para ser bem sincera.
-- Hoje eu não estou bebendo.
Te levo para casa...
-- Vou aceitar essa oferta.
A dança foi interrompida para
mais um brinde aos noivos.
Camila era madrinha da
Tamires, e uniu-se ao grupo com direito a discurso.
Mauricio encostou-se numa
coluna e ficou atento a Camila, que entre muitas risadas, discursou fazendo uma
bonita homenagem aos noivos, e sobretudo, ela estava divertindo-se. Eles se
conheciam há tanto tempo, e no entanto, ele nunca tinha reparado como ela era
bonita e divertida. Lembrava-se da primeira vez que a viu, ela era ainda muito
jovem, era Médica Veterinária, já com doutorado. Ela recém tinha chegado do
EUA, onde tinha trabalhado em um Haras de PSI.
-- Agora o teu novo caso é
com a Camila! – Disse Leila colocando-se ao lado de Mauricio.
-- Me deixa, parece sarna...
– Respondeu ele saindo de perto dela. Ele foi sentar na mesa com Vicente e
Renata.
-- A Leila está bem
transtornada hoje. O que aprontaste? – Perguntou Renata rindo.
-- Por que eu sempre sou o
culpado? A Leila vai me enlouquecer. Não sei mais o que fazer. Já implorei para
ela ir embora. Ela se instalou na minha vida sem o meu consentimento. Eu fui
inconsequente, eu sei, mas foi ela quem se deitou na minha cama, e eu sou
homem... Nunca imaginei que uma noitada fosse se transformar em pesadelo... Vou
ter que mudar de vida, cidade, trabalho, para me livrar dela.
-- É uma ideia. Tira um tempo
na fazenda. Lá eu garanto que ela não vai querer ficar. – Aconselhou Vicente.
-- Talvez eu faça isso. Ou
busque outra alternativa.
A festa seguiu bem animada. Francine e Juliano juntaram-se a eles e a
conversa rolou. As observações sobre a fofoca do momento, era o cerne do
assunto.
Mauricio notou os olhares de
Pedro para Camila. Isso o incomodou. Os demais também tinham percebido a
sensualidade dela, em especial nesta noite. O vestido turquesa realçava os seus
cabelos cor de mel, o brilho do olhar e o sorriso fácil, a deixavam sedutora.
Pedro aproximou-se dela e os
dois conversaram por muito tempo.
Leila bebeu demais, e chorava
sozinha num canto. Mauricio nem se abalou. Pensou em sair antes que ela armasse
algum escândalo. Convidou Camila para ir com ele. Ela estava engraçada, pois
ria de tudo, mas aceitou ir embora com ele. No carro ela pegou no sono. Quando
chegou, Mauricio a acordou e levou até a
porta do apartamento. Ela estava muito atraente, mas ele se segurou, afinal, a
sua amiga estava embriagada.
-- Precisas que eu te ajude?
Ou consegues ir para cama sozinha? – Perguntou Mauricio debochando dela.
-- Obrigada pela carona.
Estou um pouco “alta”, mas está tudo sob controle.
-- Tem certeza?
-- Sim. Amanhã nos falamos...
temos um projeto de viagem... lembra?
-- Amanhã à tarde
conversamos. Te ligo. – Despediu-se ela a beijando no rosto, como um bom amigo.
Conforme o combinado,
Mauricio ligou para Camila, no domingo à tarde:
-- Oi, como está a ressaca?
-- Estou bem. Acabei de falar com a Raquel... Depois que
saímos, a festa esquentou. A Leila deu um show...
-- O que ela aprontou dessa
vez?
-- Dançou escandalosamente...
-- Não me surpreendo. Estava
bêbada e nesta situação ela tem tendencia de se despir... Foi o que aconteceu?
-- A intenção era essa, mas a
Renata a impediu.
-- Aceitas jantar comigo?
-- Aceito. Que horas vens me
buscar?
-- Ao anoitecer. Te ligo
antes de sair.
-- Ok. Tchau
Camila e Mauricio tinham em
comum o gosto por trilhas e estavam planejando sair no feriadão que teria no próximo
mês. Durante o jantar eles acertaram o itinerário e reservaram até a
hospedagem.
Eles já tinham participados
juntos de Passeios de Bicicletas, várias vezes. E foi numa dessas oportunidades
que Mauricio começou a perceber a tenacidade de Camila, algo que ele apreciava
nas mulheres. Comparar Camila com a Leila, era até um desproposito, já que
Camila ganhava longe em todos os quesitos.
Leila tinha se tornado uma
mulher chata, pegajosa, insuportável. Queixava-se o dia inteiro, do trabalho,
da família, dos amigos... Nada servia para ela. E Mauricio não a aturava mais.
Francine e o marido Juliano,
tinham uma fazenda muito próxima da capital, era o lugar onde residiam e
trabalhavam. Eles criavam cavalos Árabes, e tinham pistas para treinamento de salto
com barreiras, trilhas para cavalgadas, assim como hospedagem cavalar. Localizado
na beira do lago Guaíba, era um lugar muito aprazível.
Para aquele dias eles tinham
convidado os amigos para um churrasco de boas-vindas ao casal que retornava de
lua de mel. Tamires era muito querida de todos, pois a sua história de vida e
superação era surpreendente. O grupo era grande e quando conseguiam juntar
todos era divertimento na certa.
-- Vamos juntos amanhã? –
Propôs Mauricio ao telefonar para Camila.
-- Sim... Ando cansada de
dirigir. Essa semana não parei. Andei muitos quilômetros para atender os meus
“clientes”. – Disse ela rindo referindo-se aos cavalos que atendia.
-- Lá pelas 8h estou chegando
ai, para te pegar. Beijos. – Disse desligando o telefone.
Camila desligou pensando que
Mauricio era um bom amigo. Era o único que se importava, de fato, com ela. Com
a família residindo no interior, ela morava sozinha desde que viera para fazer
o Mestrado, seguindo no Doutorado. Depois começou a trabalhar e se estabeleceu
na capital. Tamires era uma boa amiga, mas agora casada, não seria mais
companhia de todas as horas. Ainda mais que morariam em Santa Cruz, cidade
natal de Daniel.
Camila também mudaria de
vida. Seu aluguel iria aumentar consideravelmente, e sua vontade era sair de
Porto Alegre. Queria viver em numa terra onde poderia ter seus animais de
estimação e um lugar para se estabelecer com uma Clínica de Reprodução Equina.
Ela sabia que seria um
investimento de alto custo, mas como tinha um dinheiro que ganhara do avô, ela
estava procurando um lugar adequado. Já tinha visitado alguns locais, porém
nenhum agradou.
Mauricio chegou no horário
combinado, ele estava feliz naquela manhã:
-- Bom dia, minha querida.
Passou bem?
-- Ué, que bicho te mordeu?
Por que essa felicidade a essa hora da manhã? – Quis saber Camila.
-- Tomei uma decisão e vou
mudar a minha vida completamente. – Disse ele. – Enfim o inventário do meu pai
foi resolvido. E eu vou ficar com a fazenda da Barra. E vou iniciar a minha tão
sonhada criação de Cavalos Crioulos. Conto contigo para me ajudar...
-- Te ajudo sim. E a Leila,
vai também?
-- Nem me fala. Já avisei
para ela sair do apartamento. Coloquei para alugar e um conhecido meu já se
interessou. Em um mês o apartamento tem que estar à disposição. Aluguei
mobiliado.
-- Que bom! E qual foi a
reação dela?
-- Esbravejou... Chorou...
Gritou... E eu sai de casa. Estou no apartamento do Cristiano por uns dias.
Essa semana vou para a fazenda, e já fico por lá.
-- Sinceramente, espero que
te livres dela. A Leila precisa de tratamento. Sei que ela é adotada, e por
isso tem problemas de rejeição, mas infernizar a vida de todo mundo... é loucura.
Que vá se tratar! Não tenho paciência.
-- Concordo.
-- Eu também estou saindo de
Porto Alegre. Ainda não sei para onde vou. Quero um lugar só meu, onde eu possa
trabalhar e viver com tranquilidade.
-- Pra que lado estás
querendo. O irmão do meu cunhado está querendo vender o sitio que ele tem em
Mariana, muito próximo a BR.
-- Essa semana vou visitar um
em Sertão. As fotografias são lindas. Estou bem entusiasmada. Embora eu ache um
pouco distante. Eu queria mais próximo de Porto Alegre.
-- Se queres te acompanho.
-- Seria ótimo. – Comentou
Camila, pensando que precisava decidir com urgência a sua mudança.
-- Pensei que seriamos os
primeiros a chegar... – Falou Mauricio
-- A Flávia e o André devem
ter vindo ontem, assim como a Veridiana e o Murilo.
O dia estava quente e a
piscina foi a diversão escolhida. Camila tinha levado biquini, e sem demora
trocou-se e caiu na água. De onde estava Mauricio a observava disfarçadamente.
-- Vamos cair na piscina
também... – Disse André.
-- Não vou ficar por aqui.
Vou ajudar o Juliano com o assado. Vá aproveite que a piscina está repleta de
“gatas”.
-- E que “gatas”! – Comentou
André afastando-se dele.
Mauricio não sabia o que
estava acontecendo com ele. Já tinha ficado com um número infinito de mulheres,
e nenhuma mexeu com ele, como Camila fazia. Nem mesmo a Leila, que era muito
bonita tinha o atraído dessa forma. Com a Leila tudo foi empurrado pelas
circunstâncias. Hoje arrependia-se de não ter sido firme em seu propósito.
A diferença de Camila em
relação as outras era o respeito. Ela brincava, mas se dava o respeito. Ele que
era um conquistador, e tinha na mão a mulher que desejasse, nunca tinha
encostado um dedo em Camila. E isso o provocava ainda mais.
Sem conseguir desviar os
olhos de Camila, ele permaneceu encostado na árvore, quando escutou Vicente
dizer:
-- Cara! Estás dando
bandeira. O que te aconteceu?
-- Como assim, estou dando
bandeira? – Perguntou Mauricio dissimulado.
-- Tu não tiras os olhos de
cima da Camila.
-- Nada!
-- Camila é uma mulher extraordinária.
Não vai te meter com ela...
-- Nem que eu quisesse. Ela
mesma me disse que não quer saber de homens, pois sofreu muito por causa de um
cafajeste, assim como eu sou.
-- Não brinca, ela te disse
isso? – Falou Vicente gargalhando. – Ela é incrível. Não esconde seu ponto de
vista, nunca. Uma sinceridade que as vezes dói.
-- Verdade. E ela me falou
isto, por causa do meu comportamento em relação a Leila. Descobri que ela é uma
mulher fascinante! Mas não é para mim.
-- É, tem muitas outras
mulheres para ti. Não admitiremos que magoe a nossa veterinária. – Disse
Vicente sério. – Vamos dar um mergulho na piscina.
-- Vou ficar por aqui.
Estavam todos almoçando, a
turma toda descontraída, muita conversa, risos, quando despontou um carro na
porteira.
-- Era só o que me faltava...
– Disse Mauricio levantando-se – Aquele carro é da Raquel e deve estar com a
Leila. Estou indo embora.
-- Fica... – Disse Francine.
– Te damos guarida.
-- Obrigado. Mas estou saturado,
tanto que não posso nem escutar a voz daquela criatura.
-- Vou contigo. – Disse
Camila. – Viemos juntos...
-- Fica. Nós te damos carona.
– Falou Renata.
-- Obrigada. Vou embora,
também.
-- Então leva uma bandeja de
doces. Vou pegar – Levantou-se Francine indo buscar os doces para os amigos.
-- Tchau... Até a próxima...
– Disse Mauricio indo para o carro.
Camila pegou o pote com os
docinhos, abanou para os amigos e entrou no carro de Mauricio, que saiu
apressadamente pelo acesso de serviço da fazenda. Evitando cruzar com o carro
em que estava a Leila.
Um constrangimento tomou
conta de todos. Raquel não fazia parte da turma, era uma penetra que usava o
parentesco com Juliano, para participar das divertidas reuniões deles. E para
piorar ela ainda estava com a Leila a reboque.
-- Oi – Disse Raquel – Eu
avistei fumaça e percebi que o churrasco era aqui.
-- Oi... sentam, vou servir a carne para vocês... –
Falou Juliano tentando amenizar a situação. Ele observou a Leila e viu que ela
estava furiosa. Não tinha noção do que poderia acontecer. E pensou que Mauricio
e Camila foram perspicazes ao evitar o encontro.
Leila não tinha cumprimentado
ninguém. Sentou quieta, não aceitou o pedaço de carne que lhe foi oferecido.
Ela bufava! Os amigos sentiram que a situação estava tensa, e que Mauricio
ainda teria maus momentos pelo caminho. Então de repente ela falou:
-- Todos vocês, sem exceção
estão a favor do cretino do Mauricio. Ele me usou e agora está me descartando
como se eu fosse um chinelo velho. Mas eu não vou deixar barato. Hoje ele fugiu
de mim. É um covarde! E a Camila está se prestando a fazer o jogo sujo para o
meu lado. Vocês todos são uns imbecis!!! – Gritou ela, completamente
descontrolada.
Daniel que era médico, logo agiu,
dando a ela um copo com água. Mandou que tomasse devagar, gole por gole. Ele
sempre carregava no carro a sua maleta, e ali tinha alguns medicamentes. Foi
até o carro e trouxe um leve calmante. Fez com que ela tomasse e sinalizou para
os amigos que ficassem quietos, sobretudo calados.
Francine buscou a sobremesa.
Eles comeram os docinhos pensativos. Aos poucos todos foram embora. O que era
para ter sido um dia inteiro de alegria tornou-se uma tarde sombria.
Mauricio dirigiu calado.
Camila não se atrevia a puxar assunto, pois sabia o quanto o seu amigo estava
chateado. Ele sentia-se perseguido... Estavam quase chegando quando ele rompeu
o silencio.
-- Me desculpe. Eu estraguei
o teu domingo.
-- Não te preocupas comigo.
Tu é que tens que buscar o rompimento total e definitivo com a Leila. Ela não
tem limites, e acabou com o humor de todo mundo. Todos vieram embora, segundo a
Tamires, que acabou de me informar. Ninguém mais suporta essa criatura.
-- Eu não entendo a posição
da Raquel. Elas nem são super amigas...
-- A Raquel gosta de ver o
circo pegar fogo. Se diverte com a desgraça alheia. Elas não são da turma, não
são afinadas com as nossas ideias. São intrometidas...
-- Tens razão. Pronto
chegamos. – Disse ele. – Terça feira te pego para irmos ver a propriedade do
Matias. Depois te mostro a minha fazenda. Tu serás a única com livre acesso a
minha casa. Não confio em mais ninguém.
-- Acho que estás certo.
Deixa o tempo correr... Até terça. – Despediu-se ela com um beijo no rosto de
Mauricio.
Naquele fim de tarde, a
conversa rolou no grupo de amigos no Whatzapp. Francine tinha formado um novo
grupo, no qual a Raquel e Leila não participavam. Ali era um espaço só deles.
Todos mostravam-se
descontentes com a presença da Raquel e da Leila. Incomodados com intromissão
no grupo deles. Fazia muito tempo que eles se reuniam e tinham se tornado bons
amigos. E por causa daquelas duas, o grupo estava correndo o risco de se
desfazer.
Conforme eles tinham
combinado, naquela semana Mauricio acompanhou a sua boa amiga Camila na visita
de uma área de terra em Mariana. Na visitação, Camila percebeu que a casa e
instalações para empregados as cocheiras estavam de acordo com a sua
necessidade. Ali tinha tudo o que ela precisava para se estabelecer. O jardim
em volta da casa era bonito bem amplo, tinha um pomar bem cuidado, e uma vista
magnifica e não era distante da estrada principal.
Camila ficou empolgada e na
hora decidiu ficar com a propriedade. Depois de tudo acertado, quando eles já
estavam a caminho da fazenda de Mauricio, ele falou:
-- Acho que fizestes uma boa
escolha. É um lugar muito agradável.
-- Me apaixonei assim que eu
vi.... – Explicou ela.
-- Ah... se te apaixonasses
por mim... como eu seria feliz. – Disse
Mauricio olhando para ela.
-- Tu sabes que eu gosto de
ti... – Respondeu Camila sorrindo. -- Eu Vou precisar de pouco dinheiro para
deixar tudo organizado para o meu trabalho. As cocheiras são espaçosas e tem
aquelas peças contíguas, que darão perfeitamente para instalar um laboratório,
e escritório.
-- Sim. Eu sabia que tu ias
gostar do lugar. A propriedade tem a tua cara. – Falou Mauricio -- Estamos
chegando.
-- É aqui? Somos quase
vizinhos...
-- Eu te falei que era muito
perto.
Mauricio mostrou o campo da
fazenda para Camila, havia gado e algumas ovelhas; e só depois se dirigiram
para a sede. Ali havia um galpão, algumas cocheiras, alojamento para
funcionários e uma boa casa. Tudo precisava de reparo. Apenas um casal residia
ali e ambos cuidavam de tudo.
A casa principal estava limpa
e arrumada. Dona Olivia, logo foi para a cozinha e voltou trazendo um café
recém passado e biscoitos de nata.
-- É uma delícia... – Disse
Camila provando um biscoito. – É a senhora quem faz?
-- Sim, aqui tem leite à
vontade e eu aproveito nata.
-- Muito bom! – Disse
Mauricio. – Já vi que vou passar bem...
-- Sim senhor. Vou fazer só
coisas boas... – Comentou dona Olivia bem animada.
Mauricio deixou Camila
conversando com a cozinheira e saiu para acertar algumas coisas com seu Ivo.
Quando retornou uma nuvem escura e pesada se aproximava rapidamente.
-- Acho que o senhor e
doutora terão que esperar. Vai desabar o mundo. – Disse seu Ivo assustado com o
temporal que se aproximava. – Vou fechar tudo antes que desmorone o mundo... –
Disse correndo em direção ao alojamento.
Mauricio foi até a camionete
e a guardou no galpão. Fechou a porta, trancou e correu para dentro de casa.
Uma nuvem de poeira indicava que a ventania tinha chegado. Anoiteceu
repentinamente e o céu desabou. A chuva era pesada e intensa, relâmpagos
cortavam a escuridão e o vento assobiava, e a luz se apagou.
Dona Olivia foi buscar uma
vela. A conversa cessou, pois o vento estava cada vez mais forte. O estrago
seria grande, pensava seu Ivo. O temporal foi duradouro, e quando enfim passou,
deixou um rastro de destruição.
Mauricio e seu Ivo saíram
para ver como estavam as vacas leiteiras e as aves. Muitos galhos caídos, mas à
primeira vista, todo o resto estava bem. A estrada estava debaixo d’água. Era
impossível sair dali.
-- Eu estou enxergando
direito. A estrada está coberta pela água? Fica sempre assim? – Perguntou
Mauricio preocupado.
-- Não! Hoje a chuva foi
excepcional. Mas logo escoa, a drenagem é boa. Deve ter chovido mais de 100mlm.
-- Será? Temos Pluviômetro?
-- Sim. Vamos conferir. – Seu
Ivo caminhou até a cerca onde estava o marcador e constatou que não errara na
estimativa. Chovera 115 milímetros. Era muita chuva em pouco tempo.
Com um olhar ao redor, seu
Ivo constatou que o temporal não havia danificado as construções. Havia, sim,
muitos galhos de arvores caídos.
Eles tiveram que passar a
noite na fazenda. Camila era uma mulher absolutamente independente, e
administrava sua vida conforme a exigência do momento. Precavida ela carregava
em sua bolsa uma muda de roupa. Então antes do jantar ela tomou um banho e se
apresentou limpa e perfumada, o que perturbou Mauricio.
A conversa animada, fez com
que eles não percebessem a adiantado da hora. Quando Camila deitou-se não
pensou em nada, simplesmente dormiu.
Já Mauricio ficou pensando no
que sentia. Ele, pela primeira vez, estava vivendo um sentimento mais profundo.
Não era apenas atração sexual que experimentava por Camila, era algo mais e
isso o assustava.
Depois do episódio com a
Leila, ele não queria mais implicação, queria apenas as mulheres disponíveis,
que não envolvesse sentimentos e tão pouco compromisso. Mas, Camila não se
encaixava neste grupo. Ela era uma mulher trabalhadora, honesta e inteligente.
Era uma joia preciosa.
Os dias que se seguiram foram
de muitas atividades, tanto para Camila como para Mauricio, pois ambos estavam
vivendo o tempo de adaptação no novo local, aonde iriam morar e trabalhar. Era
imprescindível que tudo ficasse bem, sobretudo para o manejo dos animais.
Camila muito comunicativa
logo se inseriu na comunidade e fez novos amigos: sendo uma dedicada e
excelente profissional, logo conquistou
o seu espaço, e o seu trabalho aumentou consideravelmente. Diariamente ela
tinha a agenda completa.
Mauricio e Camila tiveram que
cancelar e adiar a trilha que pretendiam fazer. Dois fatores contribuíram para
a decisão: trabalho e previsão de muitas chuvas.
Envolvidos no trabalho, eles
pouco se viam, e tão pouco participavam das reuniões do grupo de amigos. Agora
morando mais distantes era compreensível a ausência deles.
Mas o fim do ano se
aproximava, e Camila aliviou a sua agenda de trabalho. Iria visitar os pais e
os irmãos que moravam em Dom Pedrito, onde comercializavam secos e molhados.
Fazia tempo que ela não visitava a sua cidade natal.
Mauricio iria passar as
festas de fim de ano na fazenda e sozinho.
Mandou instalar uma piscina, e aproveitaria o
verão sem sair de casa. Ele não tinha mais ânimo para as noitadas, para
conversas fúteis e mulheres fáceis. Tomava consciência de que estava ficando
velho... Entretanto, sabia que a razão de seu desânimo, tinha nome, e se
chamava Camila. Ele estava completamente apaixonado por ela, essa era a
verdade, que ele enfim, admitiu.
Prometeu a si mesmo que iria
mudar de vida. Não queria mais ser rotulado de cafajeste, sobretudo por Camila.
Ele mudaria o seu comportamento e esperava, que algum dia, ela notasse a
mudança, e percebesse que ele se tornara fiel a mulher amada. Então, nesse dia
ele revelaria o imenso amor que estava guardado em seu coração. E, que todo
esse sentimento era exclusivamente para ela. Ele a faria feliz... muito feliz!
Era fim de março quando eles
fizeram a trilha, já planejada anteriormente. Ali, Camila notou que o seu amigo
estava diferente, não falava mais de suas conquistas. E estava totalmente
focado na sua fazenda. Aliás, o assunto girava sobre animais, em especial a sua
criação de Crioulos. Camila tinha inseminado todas as éguas que Mauricio tinha
comprado.
Já estavam retornando, e
quando pararam num posto de combustível, e Camila assistiu duas mulheres se
jogarem sobre ele, mesma ela estando presente. Foi engraçado, e ao mesmo tempo
irritante a forma com aquelas duas se insinuavam, para ele. Mauricio, sem
jeito, olhou para Camila, a envolveu pela cintura e levou para a camionete. E
tratou de sair dali.
-- Desculpe... – Disse
Mauricio quando deu partida na camionete.
-- É sempre assim que elas
agem? Pensei que ia rolar um sexo a três. – Comentou Camila rindo.
-- Foi tão escandaloso assim?
-- Ainda bem que era só nós. Mas
a senhora que estava no caixa arregalou os olhos. São tuas conhecidas?
-- Sim... Dos velhos tempos.
-- Esse distanciamento tem
feito maravilhas em ti. – Afirmou Camila com naturalidade. – Não sei o que
aconteceu contigo.
-- Eu tenho um objetivo... e
para alcança-lo eu preciso ser outro homem.
-- Verdade! Estás apaixonado?
E desta vez é sério?
-- Sim...
-- Quem é ela? Eu conheço?
-- Ela é uma mulher
maravilhosa...É linda, cativante, divertida, companheira... Cheia de
qualidades...
-- E por que ela não está ao
teu lado?
-- Ela ainda não sabe. Estou
esperando o momento certo.
-- A gente faz o momento...
Não perde tempo...
Ele a olhou sorrindo.
-- De hoje não passa. – Disse
para si mesmo. Pensando em estender o dia com um jantar na casa dele. Ele tinha
desenvolvido seus dons culinários. E segundo dona Olivia, ele estava se saindo
muito bem. Ele estava planejando o que iria fazer, lembrando-se dos
ingredientes que tinha em casa. Então Camila, cortou seu pensamento ao
declarar:
-- Credo! Estou cansadíssima.
Só quero chegar em casa, tomar um banho e dormir. Acho que estou ficando
velha...
-- Dessa vez foi mais puxado.
Era muito íngreme... – Comentou ele decepcionado.
Mauricio a deixou em casa,
despediram-se, e ele tomou o caminho da fazenda. Também estava cansado. Talvez tenha
sido melhor, num outro dia o assunto poderia fluir de modo mais perfeito.
A semana foi cheia de
imprevistos, não só para Mauricio com também para Camila. Ela precisou ir para
Bagé, pois sua mãe tinha sofrido um acidente caseiro, estava internado no
hospital. Ela permaneceu com a mãe por uma semana. Depois que dona Lorena
estava bem, foi que ela retornou.
Os dias que se seguiram foram
de chuvas intensas, as estradas ficaram intransitáveis e os passos cheios, já
que os arroios e rios transbordaram. Camila estava preocupada com o seu
calendário, seu serviço estava atraso, e o tempo ruim atrapalhava.
Fazia dias que não falava com
Mauricio, ela já tinha ligado várias vezes e ele não dava retorno. Embora
estivesse preocupado com o amigo, ela estava impedida de ir até a fazenda dele,
pois um pontilhão de madeira, tinha ruido.
Enfim o tempo melhorou e o
sol voltou a brilhar. Máquinas trabalhavam para recuperar as estradas. E então
Mauricio apareceu de surpresa.
-- Meu amigo! – Saudou Camila, o abraçando com alegria. – Te
liguei inúmeras vezes...
-- Meu telefone foi levado
pela correnteza... – Disse ele rindo.
-- Não brinca! Perdestes tudo...
-- Sim. Vou ter que começar
de novo. Uma vantagem eu levo. Só vou dar meu novo número para os bons amigos.
Meu passado está morto e enterrado. Vida nova!
-- Realmente estás mudado...
Embora eu custe a acreditar, não posso negar que teu comportamento é outro.
Acho que posso te dar os parabéns.
-- Aceito com um abraço e um
beijo...
-- Oh... Já estás tendo uma
recaída. Tu falaste que tudo é por causa de uma mulher... E ela vale tudo isso?
-- Vale muito mais... Ela é
maravilhosa, uma pessoa incrível, que aos poucos foi tomando espaço no peito, e
conquistou inteiramente o meu amor...
O telefone de Camila soa, e
ela pede licença para atender, é um cliente. Uma urgência faz com que ela corra
para atender uma égua parindo. Mauricio a acompanha, mas sabe que terá outra
oportunidade para revela o seu amor.
Quando chegaram ao local onde
estava a égua, Mauricio avistou Tobias, e seu sangue ferveu. O tal cliente
novo, era o cafajeste do Tobias. Se ele tinha sido um canalha para com as
mulheres, esse era muito pior, pois falavam as más línguas, que ele era também
violento.
Antes de sair do carro, ele
pegou a mão de Camila e pediu:
-- Vou passar por teu
namorado. Não me contrarie. Depois te explico.
-- Sei que o Tobias é metido
a conquistador, mas comigo ele não tem vez.
-- Por favor. Sei o que estou
fazendo.
-- Certo. Vamos... Estamos demorando a sair do carro.
Os dois homens se
cumprimentaram como dois galos de rinha. Enquanto Camila orientava os
funcionários do haras, Mauricio e Tobias se mantinham calados, observando o
nascimento do potrinho. Depois de uma hora, recém-nascido já estava em pé ao
lado da mãe.
-- Pronto. Ele é sadio, a mãe
está bem. Qualquer coisa me avisa.
-- Muito obrigado doutora,
posso te chamar de Camila?
-- Como querias... –
Respondeu ela.
-- Podemos ir, amor? –
Perguntou Mauricio.
-- Sim. Por aqui missão
cumprida. Depois te mando a conta. – Disse Camila despedindo-se de Tobias. –
Até mais.
Já na camionete, enquanto
retornavam Mauricio falou:
-- Além de conquistador ele é
violento. Já foi processado por violência doméstica. Ele divorciou-se há pouco tempo.
Por isso te peço, não te envolvas com ele.
-- Nem que eu quisesse...
Agora já estou comprometida contigo... – Disse ela rindo. – Por que te importas
tanto comigo?
-- Porque eu te amo. Quero
cuidar de ti, estar sempre contigo...
Mauricio parou a camionete,
desligou o motor, se virou para ela e continuou falando:
-- Tu és a razão da minha
mudança de vida. Faz muito tempo que eu te quero, primeiro não tinha coragem
porque conhecia o teu pensamento sobre o meu comportamento. Então, mudei meus
hábitos. Não foi fácil, mas o amor que sinto por ti é maior que tudo... Eu te quero em minha vida para sempre. – Ele
suspirou – Pronto falei.
-- Mauricio... eu não sei o
que dizer.
-- Não diga nada. Apenas
deixe eu demonstrar o amor que sinto por ti. Me dá essa chance.
Ele acarinhou a face de
Camila e a beijou com ímpeto. Sorrindo sussurrou:
-- Eu quero te mostrar o
quanto te amo. Só quero uma oportunidade...
Camila o olhou e acenou
afirmativamente com o movimento de cabeça. Ele a beijou suavemente, e falou:
-- Obrigado. Não vais te
arrepender.
Depois, deu partida no veículo.
Ele a levou para a casa dela. Era ainda cedo da tarde, então ele a convidou
para jantar. Ele faria o jantar. Olivia e Ivo estavam de folga, seriam apenas
eles. Mauricio já estava imaginando a noite romântica que teriam.
Camila aceitou. Tomou um
banho e se arrumou. Se aquele homem a queria, ela seria uma mulher charmosa.
Escolheu vestir um vestido azul e uma jaqueta de couro cru. Prendeu o cabelo
num coque frouxo. Colocou os brincos pingentes dourados. Um batom rosa antigo
completava a maquiagem. Olhou-se no espelho e sorriu.
Quando ela viu assim
arrumada, ele logo a abraçou e falou:
-- Estás linda, minha
querida. – De mãos dadas eles foram em direção ao carro.
Mauricio mostrou-se um
namorado muito atencioso e carinhoso. Depois do degustarem um bom vinho, eles
saborearam o delicioso jantar. Camila
enxugou a louça e ambos deixaram a cozinha limpa e arrumada.
Sentaram de mãos dadas no
sofá e fizeram planos para o futuro.
A noite foi de entrega, amaram-se
com paixão.
O tempo passava e a relação
tornava-se mais sólida. Camila sentia que podia confiar em Mauricio; que
realmente ele a amava e a respeitava como mulher e como pessoa.
A turma estava dispersa, com
a mudança de Tamires para Santa Cruz do Sul, e de Camila e Mauricio para Barra
e Mariana, as distancias haviam aumentado, e as reuniões não eram mais tão
frequentes.
Mas Tamires estava planejando
o seu aniversário ao bom estilo da turma. Já havia inclusive, providenciado
pernoite para os amigos, numa pousada situada próxima a sua casa.
Tudo estava pronto, e desta
vez não haveria penetras...
Seria uma festa de arromba!
Tamires estava confiante,
pois sabia que Leila havia sido internada numa clínica psiquiátrica, depois de
um diagnostico apurado. Definitivamente,
ela não iria mais causar problemas para ninguém.
Mauricio e Camila chegaram
cedo, Tamires e Daniel os convidaram para o fim de semana. Era fim da manhã de
sábado, quando eles chegaram. Daniel gostava de cozinhar e os esperou com um
risoto de camarão.
-- Que saudades! – Saudou
Tamires alegremente a querida amiga. – Como é bom te rever. Venha vamos
entrar...
-- A tua casa é linda!
Adorei...
Mauricio e Daniel entraram na
sala. Tamires serviu um aperitivo enquanto Daniel servia uma bebida. A conversa
rolou alegremente. Até que num gesto automático, Mauricio pegou a mão de Camila
entre as suas.
-- Não é possível... – Falou
Tamires rindo. – Vocês estão juntos!
-- Estamos... – Respondeu
Mauricio. – Ela me aceitou... enfim... agora estávamos felizes.
-- Bem que o Vicente falou...
– Disse Daniel.
-- O que ele disse? – Quis
saber Tamires, virando-se para o marido.
-- Que o Mauricio estava
apaixonado pela Camila.
-- E tu nem me falastes... –
Reclamou Tamires.
-- Conversas de homens. –
Respondeu Daniel rindo.
No dia seguinte a novidade
foi bem aceita por todos os amigos. O casal era querido por todos.
A conversa rolou e foram
feitas as atualizações necessárias. Ao fim do dia o brinde foi para o anuncio
do anfitrião:
-- Hoje a minha querida está
duplamente feliz. Por ser o seu aniversário, e sobretudo, pela gravidez.
Estamos grávidos! – Anunciou ele.
Foi uma algazarra geral... A
turma voltou aos velhos tempos... A interação entre os amigos era natural e
espontânea. Havia uma relação de amizade sincera entre eles.
Camila e Mauricio retornaram
para casa mais comprometidos. O próximo passo seria colocar uma aliança, para
selar o amor que os unia.
Maria Ronety Canibal
Março
de 2022.
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