PRECONCEITO
Era inicio
do século XX, o ano de 1903.
Ronaldo já
estava formado em Direito, e acabara de receber uma herança muito grande de seu
padrinho Adílio, que era solteiro e sem herdeiros. Com vinte e três anos,
Ronaldo estava muito rico e totalmente independente financeiramente de sua
família.
Há muito
tempo ele morava sozinho, em Vitral, capital da província, aonde viera para
cursar a faculdade. Apenas no período de festas de fim de ano que Ronaldo
visitava sua família, que residia no interior em Alegro.
Ele amava
seu pai, sua mãe e seu irmão Rogério, que era bem mais novo do que ele. Mas não
aceitava certas condutas deles. Seu pai, Julio, embora tratasse sua mãe com
carinho e atenção, sempre teve amante. Sua mãe, Celeste, muito religiosa e
caridosa, tratava mal seus criados e Roger era totalmente falso, enganava a
todos com seu jeito de reservado, mas era um verdadeiro devasso.
Mas haveria
uma grande festa em comemoração aos cinqüenta anos de vida de seu Julio e
Ronaldo estava se preparando para ir. Queria chegar dois dias antes para
descansar e rever os amigos. A viagem de trem era muito exaustiva, eram dez
horas de viagem, mas, mesmo assim, muito melhor do que de diligência.
Os
preparativos eram muitos. Dona Celeste queria a casa impecável. As pratas
lustradas, os lustres brilhando, os vidros bem limpos e os móveis e pisos bem
encerados. Eram três mulheres espalhadas pela casa para fazer a limpeza no
casarão.
Na cozinha
as coisas estavam mais devagar, uma auxiliar tinha cortado a mão e estava sem
poder trabalhar e tudo isso deixava Celeste muito preocupada, que, por sua vez, estava deixando sua
cozinheira, Maria, muito nervosa. Que enfim pediu a patroa:
-- Sozinha
eu não vou dá conta, preciso de uma ajudante. Donana está doente, se a senhora
deixar chamar a menina Leonor....
-- Faça como
quiser Maria, mas eu acho que essa tal Leonor
mais atrapalha que ajuda... Ela é tão fraquinha.
-- Mas é bem
mandada. Vou mandar o moleque ir lá a casa dela.
-- Que ela
venha hoje mesmo.
Leonor era neta de Ana (Donana) que a criara desde
que a mãe morreu. Elas eram muito pobres, mas Ana sempre quis que sua neta
estudasse e a matriculou nas aulas de Dona Clotilde que ensinava gratuitamente
em sua casa os mais pobres.
Leonor era
muito magra, e seus colegas a apelidaram
de magrela, o que a deixava muito triste. E para se sobressair aos colegas, ela
estudava muito e tinha as melhores notas da escola. Ela era inteligente e muito
esperta, porém muito fraca.
Nascera
muito raquítica, pois sua mãe passou fome em sua gravidez e morreu logo após a
menina nascer. Ela não sabia quem era seu pai, mas a avó com certeza sabia.
Pois sua avó sempre dizia que ela tinha estirpe.
O moleque
enviado por Celeste avisou Donana que a menina deveria ir logo para lá, era
urgente.
Assim que
Leonor chegou da escola Donana mandou a menina para o casarão, mas ela estava
com fome e pediu a avó:
-- Deixa-me
comer antes de ir, lá eles não dão comida nesta hora, só um pouco a noite antes
de sair.
-- Pega um
pedaço pequeno de pão e vai comendo no caminho.
Leonor saiu
sem pressa, ia olhando as casas, que a medida, que chegava mais perto da
praça eram maiores e mais bonitas e os
jardins bem cuidados e muito floridos.
Ela gostava
de flores e muitas vezes, ela parava em frente das casas para apreciar o
jardim. Mas logo era corrida, pois sempre achavam que ela queria roubar.
Quando
chegou ao casarão Maria logo deu muitas tarefas para ela fazer até a hora de
sair. Precisa terminar tudo para ganhar o prato de sopa no fim da tarde.
Leonor era
muito cuidadosa com tudo, e deixou a cozinha brilhando. Maria se admirou e a
premiou com um belo prato de sopa e um naco grande de pão. Recebeu seu parco
pagamento e deveria voltar no outro dia pela manhã, e isso significava que
perderia sua aula.
Ao chegar à
casa a sua avó queria saber do pagamento dela, e Leonor entregou a ela as
moedas que recebera. E sua avó exclamou:
-- Só isso!
Ao menos te deram comida?
-- Sim, um
prato de sopa e um pedaço de pão.
-- Amanhã
deves receber mais, vais trabalhar o dia todo, lembra disso.
-- Sim, vou
dormir estou cansada.
-- Vai minha
querida... Vai.
Leonor
lavou-se, trocou de roupa e deitou-se em sua cama estreita de colchão duro.
Acendeu uma vela e pegou o livro para ler um pouco, Mas logo adormeceu.
Já fazia
dias que Leonor não ia à escola por causa do serviço, Dona Clotilde foi
procurar Donana para saber da menina.
Era dia de
São José padroeiro da cidade e depois da missa teria uma quermesse, para
angariar fundos para construção de um orfanato. Celeste e seu marido eram os
patrocinadores da festa, e todos passariam o dia na festa da igreja.
Dona Celeste
deu folga para suas criadas, para irem à quermesse. Voltariam ao fim da tarde
para servir o jantar. Apenas Leonor ficou em casa, para esperar Ronaldo.
Estava um
dia agradável e Leonor sentou-se nos degraus da porta da cozinha para ler seu
livro. Estava tudo muito quieto, até os cães estavam deitados ali perto.
Ronaldo
chegou, entrou na casa pela porta da frente e não encontrou ninguém na sala,
espiou na biblioteca, no escritório de seu pai, passou pela sala de jantar e
foi à cozinha e não viu ninguém. A casa estava vazia. Abriu e porta da cozinha
que dava para o pátio e viu uma menina sentada e bem concentrada lendo um
livro.
Ele ficou
olhando para ela, admirando a cor de seu cabelo, que era de uma tonalidade
castanha avermelhado. Ele se aproximou dela e a chamou em voz baixa para não
assustá-la. Mas mesmo assim ela deu um pulo e virou-se rapidamente com os olhos
arregalados.
Ele ficou
pasmado com a beleza dela. Tinha um rosto angelical, feições delicadas e olhos
de um azul intenso. Boca pequena e lábios carnudos. E aquele cabelo ondulado adornando o rosto.
Ela era linda demais!
Ela
levantou-se e disse:
-- O senhor
deve ser o filho de Dona Celeste que está para chegar. Eu estava lhe esperando
Sr. Ronaldo. Devo lhe servir uma refeição. O senhor me dá licença.
Ela foi
ligeira para a cozinha. E ele a seguiu. Sentou-se a mesa e a ficou observando.
Ela logo alcançou seu prato servido com
fatias de carne e legumes. E ela
disse:
-- Vou
arrumar a mesa da sala de jantar para o senhor.
-- Não
precisa... Como é seu nome?
-- Leonor.
-- Nome
bonito. Assim com tu.
Ela
ruborizou e timidamente encostou-se na pia. E Ronaldo falou:
-- Eu vou
comer aqui mesmo, e senta comigo, não gosto de comer sozinho. Faz um prato para
ti também.
-- Não! Eu
só posso comer sopa antes de ir embora.
-- Como é?
Eu entendi certo? Não comes nada durante o dia?
Ele olhou
para ela esperando uma resposta e ela apenas sacudiu a cabeça confirmando.
Ronaldo ficou furioso. Isso era demais. E disse:
-- Te serve
de um prato como o meu e senta aqui comigo para comer, e isso é uma ordem.
Leonor
obedeceu. E ele começou a fazer perguntas a ela sobre sua vida. Ronaldo ficou
impressionado com a educação da menina. Ela devia ser filha de alguém muito
notável.
Maria chegou
e os encontrou. Cumprimentou o Sr. Ronaldo e ralhou com Leonor por seu
atrevimento de sentar e comer com o patrão. Mas Ronaldo defendeu a menina
dizendo que a tinha mandado comer.
Leonor saiu
para o pátio chorando. Foi bem para o fundo e encostou-se em uma árvore para
esconder-se. Estava envergonhada.
Mas Ronaldo
foi atrás dela e a encontrou, conversou com ela até que ela se acalmou e disse
que ele falaria com sua avó para ser seu tutor, ia cuidar da educação dela. E
queria descobrir quem era seu pai. Ele a levaria para casa. Ali ela não
trabalharia mais.
E assim fez.
Donana ficou nervosa, disse que precisavam daquele dinheiro e ela estava velha
e doente e não podia mais trabalhar. Ele disse:
-- A senhora
não se preocupe, eu cuidarei que não lhe falte nada. Mas sua neta está sendo
maltratada na casa de minha mãe e eu não admito tal coisa. Se a senhora me
permitir, depois do aniversário de meu pai, vou levar Leonor para uma escola
de moças e ela vai estudar e aprender a
se portar em sociedade. Ela é uma moça especial, a senhora sabe, não sabe?
-- Sim, eu
sei. Ela tem estirpe.
-- E a
senhora não vai me dizer de quem ela é filha?
-- Não
posso. Eu jurei a minha filha no seu leito de morte.
Leonor
escutava a conversa e estava muito assustada. Nem conhecia aquele homem e ela a
queria levar para longe de sua avó. E sua avó havia deixado. Ela não
entendia...
Ronaldo
entregou algum dinheiro a senhora e saiu. Depois que Ronaldo saiu Donana olhou
para neta e disse:
-- Minha
querida eu estou no fim. Não tenho mais forças e quando eu morrer o que será de
ti? Esse moço quer te ajudar. Ele é de uma família direita, vai cumprir o
prometido, eu acredito que tudo isso seja providencia divina.
-- E a
senhora não vai me dizer quem é meu pai? Eu preciso saber...
-- Um dia
saberás...
E Leonor
ficou quieta pensando em todos os acontecimentos.
Quando
Ronaldo chegou a casa de sua mãe, a confusão estava feita. Dona Celeste nem deu
boas vindas ao filho, foi logo brigando, dizendo que ele não tinha nada a ver
com as suas criadas, com o jeito que as coisas funcionavam.
Nisso chegou
Rogério e provocou mais a mãe, dizendo:
-- Essa
menina é muito bonita, eu já estava de olho nela, mas esse daqui chegou e foi
mais ligeiro do que eu. Logo ele vai “papar” a moça.
Ronaldo
ficou furioso e disse:
-- Tu és
depravado demais. Não reconhece uma boa ação.
Celeste
nesta altura estava aos prantos. Nunca imaginou seus filhos discutindo por
causa de uma empregadinha. Era o fim do mundo. Saiu e foi para o seu quarto.
Seu Julio do
escritório escutava tudo, mas nem se mexeu. Reconheceu que seus filhos tinham
bom gosto, a menina era de fato muito bonita.
Ronaldo foi
para o escritório conversar com o pai, e Rogério tomou o caminho da porta da
frente. Saiu de casa.
-- Olá, meu
pai. Como estás?
-- Bem, meu
filho. Bom te ver. Diz-me, o que vais fazer com a moça?
-- Pai, eu
conversei com ela e percebi que ela tem nobreza, em suas feições e no modo de
ser. Isso é inerente a ela. Então vou tomá-la como pupila e cuidar de sua
educação e tentar descobrir de quem ela é filha.
-- Mas ela
será uma bastarda.
-- Eu sei,
mas eu saberei que ela tem linhagem.
-- Estas te
apaixonando?
-- Não! Só
tentando fazer algo de bom.
-- Assim
espero, porque do contrário, encontrarás muito preconceito. E isso vai te
prejudicar...
-- Espero
que não. Mas agora já falei com a avó da menina e vou cumprir o prometido. Ao
menos fazer com que ela estude e tenha um futuro melhor.
-- Deus te
ajude.
A festa de
cinqüenta anos de Julio, reuniu a sociedade local. Muitas moças em idade de
casar foram apresentadas a Ronaldo, que educadamente conversou e dançou com
algumas delas. Mas nenhuma mexeu com ele. Em seu pensamento estava Leonor.
Antes de ir
embora Ronaldo teve uma discussão com sua mãe, que estava indignada com a
atitude dele em relação à Leonor, que era uma moça sem nome, sem família e sem
posição social. Ela por fim disse:
-- Se
continuares com essa história eu não te perdoarei jamais.
-- Esta bem,
minha mãe, a consciência é sua.
E depois
disso ele saiu. Foi até a casa de Donana para estabelecer a data em que
mandaria pegá-las. E Donana perguntou:
-- Eu vou
também?
-- Sim. Vou
colocá-la na Casa de Beneficência administrada pelas Irmãs Franciscanas. Um bom
lugar para a senhora, com médico para lhe assistir. Que ficará perto de Leonor.
-- Que Deus
o abençoe por sua caridade.
Ele
despediu-se e foi para a estação tomar o trem. Durante a viagem ele não
conseguiu pensar em outra coisa que não fosse Leonor. Chegou a fazer uma relação de coisas que a moça
iria precisar. Que seriam:
- roupas
--
acessórios: luvas, chapéus, sapatos, bolsas.
-- fazer sua
matricula no Colégio Sagrado Coração de Jesus, ficaria interna, podendo sair
aos domingos para visitar sua avó. E claro ele a visitaria uma vez por mês.
-- deveria
também aprender francês e inglês. Além de literatura e música, canto e piano. E
aulas de bordado também eram necessárias.
-- bons
livros para ela ler.
Sim isso a
deixaria em condições de freqüentar a sociedade. Ele a apresentaria, pois ela
era sua pupila.
Quando
Ronaldo chegou a Vilar logo foi providenciar todas as coisas, e enviou o casal, Joaquim e Idalina, que
trabalhavam para ele para irem buscá-las em Alegro.
Leonor ficou
muito feliz com os presentes que Ronaldo enviou para ela e sua avó. Elas agora
tinham roupas decentes para viajar. No outro dia tomariam o trem. Ela estava
ansiosa com tudo, nunca tinha saído de Alegro e viajar de trem era seu sonho.
Tinha muito que agradecer a esse homem maravilhoso.
Ronaldo
também estava irrequieto e foi esperá-las na estação. Quando ele a viu com
aquele vestido azul que ele tinha escolhido pensando na cor de seus olhos,
ficou maravilhado com o que viu. Ela estava linda e muito elegante, ela tinha
porte de rainha.
primeiro
deixaram Donana na Casa de Beneficência, que ficava muito próxima da escola. Ela
foi muito bem acolhida pelas irmãs, que a conduziu ao quarto em que ela
moraria.
Era uma peça
bem arejada e ensolarada, era bem mobiliado e oferecia conforto. Uma cama boa,
mesa de cabeceira, armário, uma cômoda, duas poltronas, um lavatório e uma mesa
redonda com duas cadeiras.
Leonor
quando viu tudo isso ficou com os olhos cheios d’água. Esse era um luxo que sua
avó merecia. Olhou para Ronaldo e sorriu
agradecida.
Depois
Ronaldo a levou para o colégio, onde ela ficaria interna. Ela teria aulas no
turno da manhã e tarde. Seu quarto também era bem confortável, e ela teria
privacidade. Eram poucas as moças que ficavam em quarto individual, pois era
muito caro. A maioria ficava em quarto triplo.
Leonor
adorou! Não se conteve e deu um abraço de agradecimento em Ronaldo. Logo ele
saiu prometendo vir visitá-la no próximo domingo. No outro dia enviou para ela
os livros e as roupas que havia comprado. Também Donana recebeu roupas e
acessórios.
Ronaldo voltou
a sua rotina de trabalho. Tinha aberto em sociedade com um colega um escritório
de advocacia. Alberto e ele se tornaram bons amigos durante a faculdade e
decidiram trabalhar juntos.
Alberto
estava noivo de Margarida, uma moça bem nascida, simpática, mas que não tinha
beleza, apenas muito dinheiro. E Ronaldo às vezes pensava que seu amigo estava
atraído pela fortuna.
Conforme
combinara no domingo, após a missa, Ronaldo foi pegar Leonor para ir almoçar
com ele em sua casa. Havia convidado o doutor Almir, que era seu amigo e seu médico. Ele queria que Almir fizesse
uma avaliação do estado geral dela.
Ronaldo
morava em um sobrado rodeado por um jardim bem cuidado. Ele gostava de flores e
algumas manhãs por semana, ele se dedicava ao cultivo delas.
Leonor quando
viu o jardim, falou:
-- Que
jardim lindo! Bem florido! Eu gosto muito de flores..
-- Verdade?
Eu também, e costumo dar atenção as flores sempre que posso. Claro que tem o
jardineiro, mas as flores são minhas...
-- Parabéns!
O senhor faz um bom trabalho.
Ronaldo não
pode deixar de dar um sorriso aberto, quase uma gargalhada que a deixou
encabulada. Ele a tomou pela mão e a levou para dentro da casa. E Leonor também
fez observações sobre a beleza do interior da casa. Ela era muito observadora,
e tinha bom gosto, pensou Ronaldo.
O almoço
transcorreu sereno, com uma conversa tranqüila entre eles. E Ronaldo pode
perceber que ela sabia portar-se a mesa. Ficou intrigado, será que ela já tinha
aprendido na escola em tão poucos dias?
Depois do
almoço passaram para a sala para tomarem o café, e ela os serviu com elegância.
O que intrigou mais ainda a Ronaldo. Ele teria que perguntar a ela...
Então
Ronaldo disse a Leonor:
-- O Almir é
médico e eu pedi a esse meu bom amigo que fizesse uma avaliação de tua saúde.
-- Mas eu
tenho boa saúde, nunca fico doente...
-- Sim, mas
tu és muito magra e fraca, ele precisa avaliar tua estrutura óssea. Pode ser
agora?
-- Sim.
Então
Ronaldo levantou-se e conduziu Leonor
para o seu escritório e Almir o seguiu. E a deixou com o médico, saiu e fechou
a porta. Foi para sala de estar,
ascendeu um cigarro e ficou a andar pela sala.
Depois de um
tempo o eles retornaram e Almir disse que ela precisava de uma boa alimentação
para ganhar peso, seus pulmões estavam bem. Mas a estrutura dela era pequena.
Ronaldo
ficou mais descansado com o que seu amigo falou. Almir pediu licença e se
retirou. Ronaldo olhou o relógio e já estava na hora de levá-la de volta a
escola. Mas antes foi buscar um presente
que tinha comprado para ela. Ela agradeceu e abriu, era uma caixa grande cheia
de doces e bombons. Ela sorriu e agradeceu.
Quando
eles retornavam ele perguntou a ela onde
ela havia aprendido as boas maneiras a mesa. E ela disse:
-- Minha avó
sempre me ensinou, ela trabalhou em casa de rico, e dona Clotilde também, e ela
até me deu um livro sobre Etiqueta, e eu aprendi.
--
Interessante...
Antes de
Ronaldo despedir-se dela, ela pediu que ela lhe escrevesse todas as semanas,
pois queria saber de seu progresso. Ele viria vê-la apenas uma vez por mês. Ela
anuiu, mas ficou triste, disse a ele que sentira saudades dele.
Como ele
havia pedido, Leonor escrevia semanalmente para ele, contando sobre suas aulas
e seu progresso, e finalizava sempre dizendo que se sentia muito só.
Passados uns
dias, Ronaldo recebeu em seu escritório um comunicado da Casa de
Beneficência, informando que D. Ana
havia falecido durante o sono. Uma morte tranqüila, uma vez que ela não
apresentava doença alguma.
Ronaldo saiu
e foi tomar toda as providencias necessárias para o sepultamento da senhora, e
só depois, iria até a escola buscar
Leonor. Quando chegou a Casa de Beneficência pediu para doar todas as roupas de
Donana, e só guardaria para sua neta algo mais pessoal. Mas a enfermeira lhe
entregou uma pequena caixa, dizendo que aquilo foi a única coisa que encontrou
no quarto dela. Ronaldo agradeceu e pegou a caixa e levou para sua casa. Iria
almoçar primeiro.
Leonor não
se conformava com a morte da avó. Ela estava sozinha no mundo. E Ronaldo
emocionado com a sensibilidade da moça, a abraçou e consolou dizendo:
-- Tu tens a
mim. Nunca vou te deixar só.
Apenas
Ronaldo e Almir estavam junto de Leonor no velório da avó.
Dois dias
depois Ronaldo resolveu abrir a caixa de Donana. Ali continha um livro de
orações, um terço, um crucifixo, e a certidão de nascimento de Leonor e bem no
fundo um envelope escrito: ABRIR SÓ APÓS
A MINHA MORTE.
Então como
advogado, Ronaldo achou que poderia abrir aquele envelope que não estava
endereçado a ninguém. Começou a ler a carta e ficou espantado com o seu
conteúdo. Depois de lida ele a guardou novamente na caixa junto com os outros
objetos.
Pegou uma
folha de papel e um lápis e fez algumas anotações. Saiu e foi visitar seu tio
Jorge, irmão de seu pai. Ele sempre foi muito ligado ao tio, desde pequeno, e
Jorge e Augusta, o consideravam como filho, pois só tinham duas filhas.
Cumprimentou
o tio e foi logo perguntando:
-- Tio, o
senhor conheceu o Barão de Basset?
-- Sim,
éramos bem amigos, embora ele fosse mais velho do que eu.
-- Me fale
dele...
-- O que
queres saber? E por quê?
-- Nada,
apenas me fale.
-- Bem ele
era um homem muito rico, casou com uma prima, muito bonita, mas também muito
fria e arrogante. Ele não tinha um casamento feliz, e ela estéril e não
tiveram filhos ... Mas ele era uma boa pessoa, gostava de conversar, de
contar piadas, era muito alegre, um bom companheiro.
-- E para
quem ficou a fortuna dele?
-- Bem, ele
teve um amor em sua vida, e ele sabia que a moça estava grávida quando foi
enxotada por sua esposa. E ele deixou em testamento, que a metade de tudo que
ele possuía seria desse filho ou filha se um dia aparecesse. E eu sou o tutor
designado e administro os bens.
-- Hum... E
como identificar essa pessoa como herdeiro ou herdeira?
-- Essa
pessoa deve ter uma foto autografada por ele, e com a data da saída da moça da
casa dele. Esta anotada no testamento.
-- E essa
moça trabalhava para ele?
-- A mãe
dela era governanta da família, inclusive a moça estudou, a Ana queria uma vida
melhor para a filha, que era muito bonita, e que segundo informações, também
era filha de gente de renome. Tinha um cabelo maravilhoso, num tom
avermelhado... O barão se apaixonou pela moça e tomou para amante. Ana não
gostava daquela situação, sabia que era errada e se a patroa as descobrisse
estariam arruinadas, não encontrariam mais trabalho.
-- Obrigado
tio. Voltaremos a conversar sobre isso. Que ir almoçar domingo lá em casa?
-- Vou sim,
obrigado. Ando me sentindo muito só depois que Augusta foi visitar sua irmã. As
filhas e netos pouco vejo, elas tem seus compromissos.
-- Está. Vou
esperá-lo. Até mais.
Ronaldo foi
para casa, precisava encontrar a tal fotografia que ele não tinha visto na
caixa. Chegou e foi direto para seu escritório. Abriu a caixa, tirou tudo que
havia dentro e não encontrou a foto, então procurou por fundo falso, mas também
não achou.
Ele não
conformou, pegou novamente a caixa e começou a passar o dedo por tudo, até que
viu que no forro da tampa tinha uma saliência. Com cuidado cortou o tecido e
encontrou a foto. Virou para ver o verso e ali estava a assinatura do barão com
a data de 14 de abril de 1888.
Ronaldo
mandou avisar Leonor que iria pegá-la cedo, pois a levaria a missa e depois
para almoçar em sua casa.
Leonor se
arrumou, e colocou um vestido verde bem escuro, que era o mais sóbrio que tinha
para vestir, porque estava guardando luto. Embora ela estivesse ansiosa para
ver Ronaldo, ela não deveria mostrar alegria, pois o luto não permitia.
Mas ela
estava graciosa mesmo assim. E Ronaldo viu que ela tinha um brilho no olhar,
apesar das feições estarem séria. E ele
não deixou de fazer um elogio:
-- Estás
muito bem, não mais tão magra. Estás muito bonita.
-- Sim eu já
engordei um pouco. Até tive que arrumar algumas roupas.
-- Não
precisa fazer isso. Essa semana vou te levar a modista para escolher roupas
novas e arrumar as que precisam alargar.
-- Obrigada,
é muita gentileza sua.
-- Vamos...
Depois da
missa eles chegaram a casa dele e Leonor preferiu ficar no jardim apreciando as
flores, estava uma manhã ensolarada, e eles sentaram em um banco do jardim. Ali
permaneceram até o tio Jorge chegar.
Ronaldo foi
ao encontro do tio e alegre lhe disse>
-- Venha
quero lhe apresentar a Leonor.
--
Senhorita! Encantado.
-- Senhor...
Vamos
entrar... No sol está quente...
Sentaram a
sala e Ronaldo serviu uma bebida ao tio. Sentou
de frente para o tio e Leonor estava em uma poltrona entre eles. E
enquanto conversavam Ronaldo reparou que o tio não parava de olhar para ela.
Durante o
almoço o tio Jorge elogiou a cor do cabelo de Leonor e observou que ele havia
conhecido uma moça com o cabelo muito parecido com o dela. E perguntou:
-- Como se
chamava tua mãe?
-- Letícia.
Mas eu não a conheci, ela morreu quando eu nasci.
-- Hum...
Letícia! Resmungou o tio.
Depois do
almoço Ronaldo pediu que Leonor fosse para biblioteca, escolhesse um livro pra
ler, pois os homens precisavam conversar no escritório.
Ronaldo
fechou a porta, virou para o tio que o mirava atônito.
-- Onde a
encontraste?
--
Causalidade...
Ronaldo
abriu a caixa e mostrou para o tio o seu conteúdo.
-- Ela é
muito parecida nas feições, com a irmã barão. Mas o cabelo é como de sua mãe.
-- E agora
que faremos...
-- Primeiro
me conte como a conheceste...
E Ronaldo
relatou para o tio tudo o que se passou desde o aniversário de seu pai. Jorge
escutou tudo com atenção e por fim afirmou:
-- Tu estás
apaixonado por ela, meu rapaz.
-- Talvez...
Ela tomou conta de meus pensamentos, mas ainda é muito jovem...
Jorge disse
ao sobrinho que daria encaminhamento ao reconhecimento dela como filha do
barão, pois a prova era verdadeira. E ficaria de tutor dela até ela completar
dezoito anos. Mas que era bom não falar nada ainda para ela.
O tempo
passou e Ronaldo estava cada vez mais enamorado dela, não falava nada para ela,
mas com certeza demonstrava em seu olhar. Ela em suas cartas dava indicio de
que também o amava.
Ela tinha se
tornado uma moça muito bonita, atraente e culta. A Madre superiora tinha tecido
muitos elogios a ela, em todos os sentidos. Era sem duvida a melhor aluna da
escola. Apenas sempre muito solitária.
Era domingo
e ela a levou a passear no parque, fariam um pic-nic. Estava um dia muito
agradável e Leonor estava deslumbrante em seu vestido verde mar, enfeitado com
rendinhas brancas. Ronaldo estava muito orgulhoso de ser seu acompanhante.
Sentaram em
um banco a sombra frondosa de uma árvore e ficaram conversando, e de repente
Leonor diz:
-- Logo
terminarei os meus estudos, e terei que deixar a escola. Onde irei morar?
-- Estou
pensando nisso. Eu gostaria muito que tu fosses morar em minha casa, mas isso daria
margem a falatórios. O que não convém, pois precisas preservar a tua honra.
-- Ora, eu nem tenho família.
-- Mas
terás. Não gostarias de casar um dia?
--
Certamente... Mas... Com quem?
-- Comigo.
Leonor
arregalou os olhos e sorriu para ele, de uma maneira que o deixou sem fôlego. E
disse:
-- Com o
senhor? Eu quero.
-- Leonor eu
gosto muito de ti, e quero muito te fazer feliz, eu quero casar contigo. Mas tu
não és obrigada a isso. Para ser feliz no casamento deves querer bem o teu
marido... Deves ter amor...
-- Eu tenho.
A minha felicidade é estar com o senhor, até fiz uma poesia sobre a dor em meu
coração solitário.
-- Gostaria
de ler... Mas tu deves conhecer outros rapazes para poder escolher aquele que
mais te agrada.
-- O senhor
me agrada.
-- Não me
chame mais de senhor.
-- Tu és o
meu escolhido. Tenho-te amor desde o dia que me defendeste em casa de tua mãe.
-- Mas eu
peço que pense sobre isso. Eu quero organizar uma festa para te apresentar a
sociedade. Tu és linda, terás muitos pretendentes.
-- Tu não me
queres...
-- Eu
te quero muito... Mas preciso te dar a
chance de escolher. Vou falar com tio Jorge para ires morar em sua casa quando
saíres da escola, é mais conveniente para ti. Tia Augusta vai gostar muito de
ti.
Ronaldo
estava louco por ela e precisou de muito controle para não pega-la em seus
braços e a beijar com paixão.
Ele a levou
de volta a escola e prometeu ao despedir-se que voltaria no próximo domingo.
Procurou
seus tios e falou de seus planos a eles. Tia Augusta foi logo dizendo:
-- Será uma
alegria ter uma jovem aqui em casa. Mas acho que deves pensar em fazer uma
festa de noivado, e não de apresentação a sociedade.
-- Por quê?
-- Se tu a
amas deves protegê-la dessa sociedade
preconceituosa.
-- Concordo.
– disse Jorge.
-- Mas não seria querer impor o meu amor a ela?
-- Meu
querido, - disse tia Augusta- ela já disse que te ama. Tu não acreditas no amor
que ela diz nutrir por ti?
Ronaldo não
respondeu, ficou pensando, e depois de algum tempo disse:
-- Eu
acredito. Vamos fazer a festa de noivado. No próximo domingo decido com ela.
-- Traga ela
para almoçar conosco. Quero conhecê-la. - falou tia Augusta.
A semana
passou rapidamente e Leonor se arrumou com cuidado, queria muito agradar
Ronaldo. Escolheu o vestido azul claro que ele gostava, prendeu o cabelo com
uma fita da cor do vestido e abriu um sorriso lindo quando ele chegou. E Leonor
foi logo dizendo:
-- Eu
pensei, e sei o que não quero...
-- O que não
queres?
-- Conhecer
outros rapazes.
-- Está bem.
Queres uma festa de noivado?
-- De
noivado? Só se for contigo.
-- Eu te amo
minha pequena, vamos anunciar nosso noivado.
Ela pulou em
seu pescoço, sem se importar que estivessem em lugar publico e baixinho falou:
-- Obrigada.
Eu te amo muito...
E ela a
tomou pela mão e foram alegres para casa do tio.
Os dois
chegaram irradiando felicidade, Augusta os abraçou com alegria e tio Jorge
olhava com ternura para o jovem casal. Almoçaram e após enquanto os homens
conversaram Augusta levou Leonor para conhecer o seu futuro quarto, que era bem
mobiliado e amplo. Na semana seguinte ela viria morar ali, até o seu casamento.
Escolheram o
dia do aniversário de dezoito anos para fazer a festa, que seria na casa de
Jorge e Augusta. Resolveram fazer uma festa mais restrita apenas para a família
e amigos mais próximos.
Augusta foi
com Leonor escolher um vestido para ela. Escolheu um modelo em musselina e na
cor branca e bordado no corpete com pequenos ramos de flores nas tonalidades
rosa e azul claro. O modelo era cintura alta e dessa forma alongando sua
silueta.
Leonor
estava linda e seus olhos brilhavam de tanta felicidade. Ronaldo estava feliz e
apresentava a noiva com muito orgulho.
Embora sua
família tenha se recusado a vir e aceitar a moça como noiva dele, Ronaldo
estava alegre e tranqüilo e festa transcorria naturalmente. Estava rodeado de
pessoas de bem, pessoas amigas.
Leonor foi
muito assediada por todos, e cada um queria um minuto de sua atenção e ela
soube atender a cada pessoa com fineza e com graciosidade. Ela sabia portar-se
em sociedade.
Muitos procuraram
conversar com Jorge para saber mais acerca dela. E Jorge dizia a todos que ela
era a filha reconhecida do barão Basset. Alguns ficaram boquiabertos...
Na semana
seguinte a festa, a crônica social do jornal
A NOTICIA , se referiu a ela como a bela herdeira do barão, que apesar
de ser linda e educada, não deixava de ser uma bastarda. E que a sociedade não
estava acostumada a conviver com esse tipo de pessoa.
Ronaldo
quando leu o jornal ficou furioso. Ele era um advogado bem conceituado, seu
escritório atendia as melhores famílias e ele sempre foi benquisto na sociedade.
Ele estava
no escritório e saiu, andou um pouco e foi para a casa de seu tio. Seu o levou
direto para o escritório, precisavam conversar. E sem rodeio perguntou ao
sobrinho:
-- E agora?
-- Tio esse
mundo é cruel, mas não vou abrir mão da felicidade, vou casar com ela, sim!
-- És
corajoso. Mas precisas saber que teu escritório sofrerá boicote...
-- Eu sei,
mas com o tempo tudo deve ser esquecido. Não pretendo freqüentar mais a sociedade,
me satisfaço com um pequeno grupo de amigos, senão isso, ela me basta.
-- Muito
bem. Eu te apoio. Vamos em frente.
-- Só espero
que ela não fique sabendo dessa noticia.
-- Ela já
sabe. E ela ficou muito preocupada contigo, a represália a tua pessoa. Ela é forte, não se abala facilmente, e
acrescentou, não vou precisar deles para ser feliz. Ronaldo é tudo para mim.
-- Eu sei
que ela é muito forte, e ela já sofreu muito nesta vida por preconceito.
-- E essa
gente é mesma que se diz cristã.
-- Vou encaminhar
a licença de casamento e vamos casar o mais breve possível.
-- Faz isso.
O casamento
foi marcado para dali a vinte dias. Tia Augusta saiu às lojas para comprar e
mandar fazer as peças para o enxoval de Leonor. Muita coisa teria que
encomendar.
Ronaldo quis
fazer um casamento simples, na parte da manhã e após um almoço apenas para os
padrinhos. Os noivos sairiam em lua de mel naquela noite, tomariam um navio e
fariam um cruzeiro. Ficariam fora dois meses.
Ela estava
encantadora quando entrou na igreja pelo braço de tio Jorge. Ela sorria e seus
olhos brilhavam de tanta felicidade. Ronaldo ficou deslumbrado com sua
formosura.
Embora eles
não tivessem muitos convidados, a igreja estava repleta de curiosos, que se
encantaram com a beleza da jovem, da felicidade que irradia do casal de noivos.
No outro dia
os comentários foram muitos e todos tecendo elogios graça da noiva e a felicidade do jovem casal que até na
crônica social foi citado.
Ronaldo
estava a cada minuto mais apaixonado por sua esposa, que, se revelou muito
carinhosa e ardente. Sua noite núpcias
tinha sido maravilhosa, pois ela
se mostrou uma aprendiz notável. E as
noites foram de troca de beijos e
caricias e para atingir o clímax do ato de amor.
Quando o
casal retornou, todos repararam na mudança que houve em Leonor, não só física,
pois ela havia desabrochado e se tornara uma mulher muito sensual. Mas também
no jeito de ser. Agora estava mais segura de si, e agia com desenvoltura.
Ronaldo
disse ao tio:
-- Estou
feliz, ela me faz muito bem. E tem se revelado uma mulher consciente de sua
posição na sociedade e não vai se submeter aos caprichos de meia dúzia de
hipócritas.
-- Sim dá
para notar que essa viagem fez muito bem a ela. Fico satisfeito.
Ronaldo
estava preparado para uma queda na clientela de seu escritório, e quando
retornou a rotina pediu a seu amigo e sócio que o atualizasse dos fatos e
noticias.
Alberto
contou que alguns clientes tinham conversado com ele sobre a “bastarda”, mas
que ninguém tinha deixado de optar por seus serviços. E foi bem sincero,
inclusive contando que Margarida, sua esposa, queria que ele deixasse a
sociedade, mas que ele havia sido firme em valorizar a amizade que existia
entre os dois. Ronaldo agradeceu a lealdade.
Os dias
passavam e Leonor tinha organizado uma rotina de vida. As manhãs ela ficava em
sua sala de estar, na sua secretária escrevendo poesias. A tarde saia para uma
caminhada, sempre acompanhada de sua criada. A noite o casal se encontrava e jantavam e
conversavam, liam ou escutavam musica. Aos sábados iam ao teatro. No domingo
sempre tinham convidados para o almoço.
Eles iam
mudar para a antiga casa do barão, que era maior, mais confortável e melhor
situada. Leonor estava redecorando, modernizando cozinha e banheiro e,
sobretudo a ala dos empregados. Queria que todos tivessem conforto.
A casa ficou
linda e o jardim era imenso, com vários canteiros de flores que ela e Ronaldo
gostavam de cultivar.
A
curiosidade sobre Leonor e Ronaldo era grande. Eles haviam se retirado da
sociedade, viviam bem e demonstravam riqueza e felicidade. Agora todos os
convidavam para as festas. Mas Leonor educadamente recusava todos os convites.
Ela resolveu
publicar suas poesias e Ronaldo a incentivava. Escolheu um pseudônimo de Isis.
Seu primeiro livro foi um sucesso.
Rogério veio
passar temporada em Vilar e hospedou-se na casa de seu irmão. Nem Ronaldo e
tampouco Leonor estavam satisfeitos com a intromissão do rapaz na intimidade de
seu lar.
Leonor tinha
se tornado uma mulher muito bonita, elegante e polida. E Rogério visivelmente
apreciava a beleza de sua cunhada de maneira tal que a deixava constrangida,
sobretudo na frente do marido.
Os olhares
de Rogério para Leonor eram lascivos, e seu comportamento a cada dia mais
ousado, que deixava os empregados alarmados.
Leonor
queixou-se ao marido, que não deu muita importância, alegando que ele não
passava de uma criança grande. E que logo ele iria embora, e eles voltariam à
rotina de suas vidas.
Mas o fato,
era Ronaldo passava menos em casa, à noite após o jantar sempre tinha um
compromisso, e deixava Leonor na companhia do irmão.
E surgiram
falatórios de que o casal não estava mais tão apaixonado. Que ele tinha uma
amante, uma jovem viúva, a qual visitava todas as noites, enquanto sua esposa
ficava com seu jovem e atraente irmão. Leonor estava entristecida e se confinou
em seu quarto.
O tempo
correu e a situação continuava a mesma, e o casal a cada dia mais distante um
do outro. Leonor cheia de dúvidas em relação a fidelidade do marido, pois fazia
muito tempo que ele não a procurava mais para fazer amor e nem para
simplesmente vê-la.
E Leonor
adoeceu. Uma grande tristeza se abateu sobre ela. Ainda escrevia suas poesias
que agora versavam sobre a infelicidade no amor. Mais um livro publicado com
sucesso.
Tia Augusta
foi visitá-la e ficou assustada com seu aspecto. Saiu e foi ao escritório de
Ronaldo e o censurou pela falta de zelo para com sua esposa. E muito indignada
Augusta perguntou:
-- Ronaldo
me diga, onde está aquele amor que nutrias por ela?
-- Mas eu a
amo...
-- Quando a
viste pela ultima vez?
Ele abaixou
a cabeça e não respondeu.
-- Com
sinceridade me responda, é verdade que tens uma amante?
-- Não, eu
tenho parado pouco em casa, sim. Mas nunca trai minha esposa.
-- Então por
que estas afastado dela?
-- Porque
ela prefere meu irmão...
-- O quê?
-- Sim, ele
a olha de tal maneira que eu não suporto... Inclusive ele me disse que ela o
provoca...
-- Mas ela
nem sai mais do quarto, ela está doente, fraca e triste. Queres ficar viúvo?
-- Não!
-- Então
manda teu irmão embora, ele só está perturbando a vida de vocês. Não entendo porque
ainda não tomastes uma atitude?
-- Ela é tão
linda, e todos os homens a olham com cobiça.
-- Mas ela é
tua mulher. Se não tomares providência, irá perdê-la.
Tia Augusta
foi embora e Ronaldo ficou pensando em
como livrar-se do irmão, que não queria mais ficar em Alegro, e não tinha como
se sustentar, pois brigara com seu pai.
Resolveu
alugar um quarto em uma pensão para ele, o qual pagaria para o irmão com a
condição de ele estudar e trabalhar meio turno no escritório. Se não quisesse
teria que voltar para Alegro. Rogério não gostou da idéia, protestou, mas por
fim teve que aceitar.
No dia que
Rogério deixou sua casa, Ronaldo saiu mais cedo do escritório, passou na
florista e na joalheria e foi para casa. Teria que reconquistar a confiança de
sua esposa.
Ela bateu a
porta de seu quarto e entrou e viu Leonor sentada em uma poltrona com um roupão
azul, cabelos soltos e os olhar mais triste que ele já havia visto. Doeu em seu
coração.
Ele sentou-se
diante dela e falou:
-- Essas
flores são para ti minha querida.
-- Obrigada.
– Ela pegou o ramalhete, olhou e colocou em cima da mesa, cruzou os dedos no
colo e ficou de cabeça baixa.
-- Olhe para
mim... Sei que errei, peço perdão. Não devia ter deixado que a presença de
Rogério interferisse em nossa vida. Mas
agora ele já foi. Vamos retomar...
Leonor
apenas olhou para ele. Ela estava machucada demais... Não dava para
simplesmente retomar a vida. Não!
Ronaldo
levantou-se e ficou a andar pelo quarto. Ele não sabia como remediar a
situação. Ele era um idiota. Mas resolveu insistir.
-- Meu amor,
vamos viajar...
-- Para quê?
Só vai mudar a paisagem.
-- Eu te
trouxe isso...
Leonor pegou
a caixa e abriu, era um lindo anel de esmeralda.
-- Obrigada!
Mas isso não vai resolver nossos problemas, isso o dinheiro paga, algumas
coisas não tem preço.
Ronaldo
sentou novamente e baixou a cabeça e chorou. Mas Leonor não se comoveu. Ela a
abandonara em sua própria casa, por seis longos meses, nem a procurava como
mulher. E os boatos chegaram aos ouvidos dela. Ele tinha uma amante, uma jovem
viúva. Mas ela não iria perguntar a ele sobre isso. Seria se rebaixar demais.
Ela estava sofrendo uma dor imensa, mas tinha dignidade. Então ela disse:
-- Por
favor, estou com dor de cabeça, deixe-se só.
--Ele saiu... E ela deixou seu pranto rolar.
Ronaldo foi
para a biblioteca, precisa pensar e rever alguns pontos. Serviu-se de uma
bebida e sentou-se na poltrona. Fechou os olhos e foi rememorando alguns fatos.
Lembrou-se
que logo que o irmão chegou ele
referiu-se e ela como uma mulher bonita
e apetitosa. Depois insinuou que ela tinha o provocado, inclusive, lembrando a
ele que tinha casado com uma empregadinha, e por isso não podia esperar outro
comportamento dela. Ronaldo naquele dia havia saído de casa muito aborrecido,
porque o irmão tinha menosprezado sua mulher, e ele não fora capaz de
defendê-la, mostrando que também tinha preconceito. E Rogério também havia dito
que ela tinha pedido que ele a beijasse, porque o achava muito bonito e
atraente.
Ele estava
ferido, se tudo isso fosse verdade, não tinha mais conserto o seu casamento.
Mas como saber? Será que seu irmão era
tão cretino a ponto de arquitetar situações constrangedoras?
E Ronaldo
passou a noite toda ali... Estava chocado com os acontecimentos. Mas precisava
tomar uma atitude... Mas qual?
Na realidade
ele se omitira, deixara seu irmão permanecer tempo demais em sua casa. E ele
fez um grande estrago em seu casamento. Ronaldo reconhecia sua culpa. Não sabia
por que agira dessa forma, parecia que tinha sido hipnotizado, que estava sob
comando de outra pessoa, e simplesmente, não agiu como um marido que ama e
protege sua esposa e seu lar.
Mas o que
Ronaldo não sabia era que Leonor estava mais machucada por saber que seu marido
a estava traindo. Isso doía demais em seu coração, e ela não seria capaz de
perdoá-lo.
Depois de
muito pensar resolveu conversar com Leonor. Deveria ser uma conversa aberta e
franca. Precisavam expor seus sentimentos com sinceridade.
Ele procurou
a governanta e pediu que arrumasse o desjejum para os dois na sala intima do
casal.
Ronaldo foi
tomar um banho, trocar de roupa para se apresentar a esposa de modo apreciável,
pois seu aspecto estava lastimável. Embora ele tivesse bem vestido seu rosto
apresentava marcas de uma noite sem dormir, com os olhos fundos.
Leonor
atendeu ao pedido do marido, vestiu-se com simplicidade, prendeu seus cabelos
num coque na nuca, e ela também estava abatida, com aspecto doentio.
Ronaldo
quando a viu percebeu que ela também não havia pregado o olho. Ele aproximou-se
dela, deu um beijo de bom dia em sua testa e sentou-se a mesa. Eles quase não
tocaram na comida. Mas comeram em silêncio.
Após tomarem
o café, Ronaldo disse a Leonor que eles precisavam conversar para resolver de
uma vez por todas aquela situação que estava se tornando insustentável.
Então ele
começou a falar sobre tudo o que ele havia refletido, abriu seu coração diante
dela, com sinceridade e humildade. Ela o escutou, concordou com alguns fatos, e
defendeu-se dizendo que jamais havia se insinuado para Rogério, que inclusive
um dia ele a pegara a força e a beijara, e que Genoveva, a governanta tinha
visto a petulância dele. Ronaldo comentou:
-- Eu acredito
em ti. Não preciso confirmar com Genoveva. E tu acreditas em mim?
-- Ainda não
me falastes tudo...
-- O que
faltou?
-- Faltou
falares sobre o teu procedimento, sobre a tua fuga de casa. Para onde ias
quando não vinhas dormir em casa?
-- Passei
muitas noites no escritório.
-- Todas?
-- Sim...
Aonde mais eu iria?
-- Não sei
alguma viúva...
-- Não é
possível que tu acreditasses nesse falatório... Eu realmente tenho uma cliente
que enviuvou recentemente, e eu estive duas vezes em sua casa para tratar de
assuntos profissionais. Ela estava ainda muito abatida e me pediu para ir até a
sua casa. Apenas isso.
-- E
então...
-- Então, o
quê? Não sei aonde queres chegar...
-- Não houve
nem um flerte entre vocês?
-- Não! A
coitada estava arrasada com a morte do marido.
Leonor olhou
para ele e suspirou aliviada. Ele se aproximou dela e tomou suas mãos e disse:
-- Eu te
amo, jamais procuraria outra mulher. Eu
quero e eu necessito é de ti. Somente tu me atrais e tu me fazes vibrar. Eu sei
que te magoei profundamente em permitir que meu irmão ficasse hospedado aqui,
sei que não agi de maneira correta, mas trair... Nunca... Jamais.
Leonor
começou a chorar, e ele a abraçou e a beijou. Mas ela ainda não estava pronta.
A ferida era profunda, ele entendia que precisa dar um tempo para poder retomar
a sua intimidade. Mas não desistiria, iria conquistá-la outra vez.
Tia Augusta permanecia
preocupada com Leonor, que continuava abatida. Mesmo depois da conversa aberta
que tivera com Ronaldo. Por isso ia quase todos os dias até sua casa para
vê-la. E numa dessas visitas Augusta olhou para Leonor e disse:
-- Tu sabes
que eu te quero como uma filha. Já vivi muito, sou casada há muitos anos, e não
é bom o casal ficar em crise constante. Vocês já conversaram, Ronaldo
desculpou-se por sua omissão, e te falou a verdade sobre a tal viúva. Eu sei
que ele falou a verdade porque eu mesma havia perguntado a ele, e eu o conheço
muito bem, ele não costuma mentir. Ele é honesto e te ama muito. Queres jogar
tudo fora?
-- Não! Só
que...
-- Nada de
só que... Deixa de ser tão detalhista. Seja uma esposa alegre e gentil,
carinhosa e sensual. Isso agrada ao marido, e o conserva perto de ti. É isso
que queremos. Vocês se amam estão perdendo tempo, a vida passa muito
ligeira...Não deixes o orgulho falar mais alto, vai luta...Vocês se amam.
Aceita, minha querida, os meus conselhos. Agora depois que eu sair, toma um
banho, te perfumas, veste uma roupa bonita e o espera com um sorriso. Manda
fazer para o jantar algo que ele goste, enfim, agrade a teu marido. Eu vou indo
tens muito que fazer.
E tia
Augusta levantou-se deu um beijo em sua face e foi embora. Saiu aliviada, disse
a ela o que ela precisava saber. Leonor era inteligente e esperta, iria seguir
o seu conselho.
Leonor
resolveu acatar a sugestão de tia Augusta. Chamou Genoveva e disse que
arrumasse a mesa para eles na sala de jantar, que a enfeitasse com flores e
fizesse uma boa comida. Ela queria que Luiza lhe preparasse um banho. E saiu
para escolher um vestido.
Genoveva
saiu batendo palmas, graças ao bom Deus sua patroa estava dando sinais de que
estava melhor. Preparou tudo com Leonor pedira.
Era hora de
Ronaldo chegar e para sua surpresa Leonor o estava esperando no jardim. Estava
um fim de tarde quente e ela estava linda.
Ele a
abraçou e a beijou sem se importar que alguém pudesse vê-los. Entraram de mãos
dadas e foram para a sala de estar tomar um aperitivo, enquanto esperavam o
jantar. Foi uma noite sublime, que terminou com eles se amando com antes, se
envolvendo em caricias.
Estava
próximo ao Natal e Ronaldo propôs que eles fossem viajar, ela concordou, mas
queria ir para um lugar sossegado. Escolheram ir para a Europa.
Ronaldo
estava feliz, estavam voltando a ser como eram antes. A viagem fez muito bem. Quando voltaram
estavam outra vez apaixonados um pelo outro.
Leonor
passou mal, assustou a Genoveva que mandou chamar Rodolfo em seu escritório.
Doutor Almir foi quem a examinou, disse
que não era nada, Leonor apenas estava grávida.
Ronaldo
correu para Leonor, abraçou e ambos choraram de tanta felicidade...
Maria
Ronety Canibal
Julho de 2017
IMAGEM VIA INTERNET
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