OBSTINADO
Laerte e Osmar eram muito amigos,
haviam se conhecido na faculdade. A família de Laerte morava no interior e por
isso aos domingos ele sempre era
convidado para o almoço.
Mas esse domingo era um dia especial.
Osmar estava comemorando vinte e um anos e sua família resolveu fazer um
churrasco comemorativo. Além da família, alguns amigos e amigas também fariam
parte do grupo, inclusive a os pais de Suzana.
Suzana e Olivia, que era irmã
de Osmar, eram muito amigas desde crianças. Cresceram juntas e hoje com
dezessete anos elas trocavam
confidências, mas não contavam todos os seus segredos.
A festa seria no jardim, havia
sido montado um gazebo enorme, com muitas mesas cobertas com toalhas azuis e
guardanapos brancos, que estavam
decoradas com pequenos vasos de violetas brancas.
Já havia um grande numero de
convidados quando Suzana chegou festa,
acompanhada de seus pais. Ela havia escolhido para a ocasião um vestido leve de
verão, na cor branca, usava acessórios
na cor verde esmeralda.
Laerte estava conversando com
alguns amigos e quando ele a viu chegar, parou de falar e seu olhar pousou nos
olhos de Suzana que também o olhava de um modo especial.
Suzana quando olhou para ele
sentiu seu coração disparar, parecia que ia saltar pela boca. E Suzana ficou
parada, como que presa ao chão. Foi sua mãe quem a puxou e a levou para sentar
a mesa.
Ela não o conhecia
pessoalmente, apenas de nome, pois Olivia sempre falava muito nele. Aquele era
o amigo de seu irmão que aos domingos
almoçava em sua casa. Devia ser ele.
Laerte se afastou do grupo e
ficou parado olhando para ela como se tivesse hipnotizado e com seu coração aos
pulos. Foi Oliva que o despertou.
-= Ei, o que houve contigo?
Estás com uma cara...
-- Nada. Estava distraído...
-- Hum... Distraído...
Estas olhando para Suzana como
se tivesse visto uma miragem, foi o que pensou Olivia.
-- Vem, estamos planejando
sentarmos todos juntos, estão juntando as mesas ali, vem...
E Laerte foi com Olivia para
junto da turma. E escolheu um lugar do qual poderia continuar a olhar para a
recém chegada, Suzana, era esse o nome
que Olivia dissera, quando ela chegou. Essa é a guria que Osmar tanto falava,
realmente ele tem razão, ela é linda de mais.
Então Osmar que era apaixonado
por Suzana foi convidá-la para sentar junto com o grupo, mas ela desculpou-se e
ficou junto dos pais. Ela tinha discutido com Olivia e ainda estava muito
zangada com a amiga.
Os pais de Suzana gostavam
muito de Osmar e faziam gosto no namoro deles. Mas ela via Osmar apenas como um
bom amigo, embora ele já tivesse falado em namoro mais de uma vez. Ele não se
convencia de que ela não era apaixonada por ele.
Durante a festa Suzana ficou
sentada quieta só observando e Laerte procedeu da mesma forma. Ele estava com
vontade de ir lá falar com ela, mas achou que não era uma boa idéia, pois ela
não saiu de perto dos pais.
Olivia havia comentado na mesa,
que ela e Suzana tinham brigado por causa de uma foto que Olivia tinha postado
no Face, que Suzana não gostava que postasse sobre sua pessoa. Que Suzana
estava ficando, a cada dia, mais chata, sempre cheia de não-me-toques.
Laerte resolveu ir embora, já
tinha feito a sua obrigação e ele tinha que estudar para as provas.
Suzana avisou para os pais que
ia embora, estava com dor de cabeça. Que eles não se preocupassem, ela iria a
pé, era perto. E ela iria sair à francesa, sem se despedir de ninguém. Deu um
beijo em sua mãe de foi embora.
Ela estava chegando ao portão
quando viu que Laerte se aproximava. Ele olhou para ela e disse:
-- Também indo embora?
-- Sim – foi o que ela
respondeu olhando para ele, que se adiantou e abriu o portão para ela. E já na
calçada ele falou:
-- Sou Laerte, prazer em te
conhecer.
-- Prazer, Suzana.
-- Para onde vais, posso te acompanhar?
-- Eu vou para casa, é perto.
Mas se vais para o mesmo lado, podemos ir juntos sim.
E Laerte a levou até sua casa.
Perguntou se poderia ligar para ela, Suzana concordou e deu o seu numero para
ele. Despediram-se e Suzana entrou e foi para seu quarto. Tirou o vestido e
deitou-se na cama, realmente estava com dor de cabeça. Quando seus pais
chegaram a encontraram dormindo.
Era inicio da noite quando
Laerte a chamou, e conversaram um bom tempo.
No outro dia, na aula, Olivia
estava contando para as outras colegas sobre a festa de aniversário de seu
irmão, e falou que Laerte tinha sentado junto com ela no almoço e que ele
estava muito interessado nela. Que ela estava feliz, enfim tinha conquistado o
coração dele.
Suzana estava sentada em sua
classe e escutou toda a conversa de Olivia, só que o que ela estava contando
não conferia com o que ela tinha assistido. Pois Laerte tinha passado o tempo
todo quieto e olhando para ela.
Depois de alguns dias, Suzana e
Laerte, que se falavam todos os dias, já eram bem amigos. E ele perguntou se
ela aceitava ir ao cinema com ela. Combinaram de se encontrar no shopping.
E Suzana foi só. Não contou
para ninguém que tinha um encontro marcado. Quando ela chegou, ele a estava
esperando já com as entradas na mão. Compraram pipoca e se acomodaram para ver
o filme, que era uma história triste.
Suzana se emocionou com o drama
mostrado no filme e chorou. Laerte que estava a observado secou as lágrimas no
rosto dela. Pegou sua mão, beijou e manteve a mão de Suzana entre as suas.
Quando o filme terminou ele a
convidou para irem para a praça de
alimentação, comer um sorvete. Ela aceitou e encontraram uma mesa, Laerte
buscou o sorvete e enquanto comiam ele a
olhava com intensidade. Por fim ele falou:
-- Naquele domingo quando te vi,
não consegui desgrudar os olhos de ti. Tu és tão bonita, tão suave, tão... Nem
consigo palavras para me expressar. Guria tu mexeste muito comigo.
-- Tu também mexeste comigo. –
falou Suzana olhando para ele.
Ele pegou em sua mão, beijou e
olhando para ela pediu:
-- Queres ser minha namorada?
-- Sim, eu quero.
Os dias passavam e Suzana e
Laerte estavam muito apaixonados. Os dois passavam a maior parte do tempo deles
juntos. Ela havia se afastado se seus amigos e ela de suas amigas. Os dois se
bastavam.
Os pais de Suzana eram
simpáticos com Laerte, mas na verdade, eles não queriam que aquele namoro
continuasse. Embora eles soubessem que Laerte era um bom rapaz, eles achavam
que ele não se enquadrava no circulo social de Suzana, que era uma moça rica,
bonita e educada e poderia encontrar um marido rico.
Os irmãos Osmar e Olivia
estavam indignados com o namoro entre Laerte e Suzana, e de todos os meios
procuravam criar intriga. Sabiam que Suzana era “pavio curto”, que logo
explodia e isso era o plano deles para separar os dois.
Enquanto Olivia enchia os
ouvidos de Suzana, Osmar fazia o mesmo com Laerte. E como era o esperado os
namorados brigaram.
Suzana deitada em sua cama
chorava, e nem sabia por que eles tinham brigado. Ela só se lembrava das
palavras de Laerte “eu te amo muito, e só te peço que acredites em mim”.
Laerte também estava abalado,
seu coração estava partido e não entendia a razão da briga. Suzana parecia
estar duvidando de tudo a respeito dele, que ele não gostava dela, só estava
com ela para subir na vida. Sim foi esta a expressão usada por ela.
Ele estava se sentindo magoado.
Sempre fora sincero, direto e Suzana não acreditava no que ele dizia. Ele
gostava muito dela, mas ela era teimosa, era mimada, era um gênio difícil.
Laerte estava deitado em sua
cama pensando em Suzana, ele a procuraria no outro dia para conversarem. Eles
não podiam deixar que uma intriga os separasse. Se amavam muito e com certeza superariam essa situação.
Mas o telefone tocou. Era o pai
de Laerte avisando que sua mãe tinha tido uma isquêmica e estava muito mal. Ele passou uma mensagem
para Suzana avisando que estaria fora uns dias. Arrumou sua valise e correu
para a rodoviária e embarcou no primeiro ônibus para sua terra Santa Bárbara do
Sul.
Durante a viagem Laerte ia
pensando em sua família, em sua gente. Eram pessoas simples e
trabalhadoras. Sua família tinha um
pedaço de terra e plantavam trigo. Moravam na pequena cidade e sua mãe e sua
irmã cuidavam do mercado da família. Seu irmão mais velho morava no campo e
cuidava da plantação. Ele era o mais novo dos irmãos, e teve o privilégio de
poder ir para a capital estudar e fazer faculdade, ele era o orgulho de todos.
Logo ele seria um Engenheiro Civil, e contribuiria para o progresso de sua
cidade. Pois assim que se formasse ele iria voltar para sua terra.
E Laerte se deu conta de como
sua família era diferente da família de Suzana, e como ela fora criada com luxo
e como ela era mimada e cheia de manias.
Embora ela fosse a dona de seu coração ele não podia deixar de enxergar a
realidade. Havia um abismo entre eles. Talvez essa briga fosse um alerta da
diferença que existia entre eles.
Depois de uma semana Laerte voltou
a Porto Alegre para prestar as provas na
faculdade. Era fim de semestre, ele conversou com os professores e conseguiu dispensa
por causa das faltas. Pois devia ajudar em casa. Com a doença, a mãe precisava
de cuidados, e sua irmã cuidaria dela, mas não tinha ninguém para ficar no
armazém. Então ele se ofereceu para ficar no mercado, enquanto as coisas não se
normalizassem.
Passou na casa de Suzana para
falar com ela, mas não conseguiu. A empregada disse que ela tinha ninguém em
casa. Então ele deixou as flores para serem entregues a ela, e foi embora.
Laerte já estava em viagem
quando recebeu telefonema de Suzana agradecendo pelas flores e pedindo para que
ele fosse a sua casa para conversarem. Então ele contou o que tinha acontecido
e que ele estava indo para Santa Barbara do Sul e não sabia quando retornaria a
Porto Alegre.
Suzana adoeceu, tinha uma
tristeza em seu peito que machucava muito, ela não tinha mais vontade de
estudar, de sair, de se arrumar, de
comer e não dormia só pensando em Laerte.
Os pais de Suzana, Luis e Vera,
ficaram assustados com a reação dela. Eles sempre pensaram que aquele namoro
era algo passageiro, inclusive quando eles brigaram acharam muito bom, mas agora estavam percebendo o
sofrimento da filha.
Dona Vera resolveu conversar
com ela, para saber um pouco mais sobre o namoro e a razão da briga. E se
surpreendeu com a armação que prepararam para os dois.
Então d. Vera disse que a
levaria até a cidade dele para os dois conversarem. Pois Suzana havia
acreditado em fofocas sem fundamento, e tudo isso por causa do seu jeito de
primeiro brigar, para depois ver os fatos e analisar a situação.
Seu Luis concordou com a idéia
de sua esposa, mas afirmou que não iria. Era melhor elas irem só. E no sábado
bem cedinho, elas saíram em direção a Santa Barbara do Sul.
Depois de quatro horas de
viagem elas avistaram a pequena cidade de Santa Barbara do Sul, que era bem
acolhedora. Pararam para pedir informações e logo acharam o local, e
estacionaram em frente ao Armazém.
Suzana entrou no mercado e logo
viu Laerte sentado em uma mesa, numa sala envidraçada, fazendo anotações. Ela foi em direção a
porta, mas parou. Achou melhor perguntar a moça do caixa se poderia falar com
Laerte.
Então conforme indicação da
jovem ela deu uma batidinha na porta e entrou, e parou diante da mesa, e
esperou. Ele não levantou a cabeça e disse:
-- Sim, qual o problema?
Mas ela não disse nada, apenas
colocou um sorriso nos lábios. Então ele levantou os olhos e a viu. Levantou-se
tão rápido que derrubou a cadeira. Levantou a cadeira e contornou a mesa para
chegar até ela, a abraçou e sussurrou ao seu ouvido:
-- Tu aqui? O que houve?
-- Não houve nada, vim te
ver... Precisamos conversar.
-- Sim, mas não aqui. Como
chegaste aqui?
-- Minha mãe me trouxe, ela
está no carro.
-- Me aguarda aqui, já volto.
Ela esperou e ele logo voltou
com uma sacola cheia coisas. Vamos lá pra casa.
A casa em que a família de
Laerte morava era grande, tinha um lindo gramado na frente com canteiros de
flores. Era bem próximo ao mercado. Ele entrou e foi gritando para sua irmã que
tinham visita para o almoço. E aparece uma jovem muito parecida com ele com os
olhos arregalados perguntando:
-- Quem?
E Laerte rindo dela diz:
-- Gente importante, vindos da
capital.
E ainda rindo apresentou Ana
Luiza sua irmã para D. Vera e Suzana, a qual ele colocou a mão por sobre os
ombros dela e ressaltou:
-- Suzana, minha namorada.
Ana Luiza muito simpática foi
logo acolhendo e abraçando as recém chegadas. E Laerte disse
-- Não sei o que fizestes para
o almoço, mas eu trouxe alguma coisa para complementar. Está aqui. – E entregou
a sacola a ela.
E Ana Luiza ofereceu um
cafezinho. Pediu que sentassem na sala que ela logo traria o café. Laerte indicou o banheiro para as recém
chegadas.
Tomaram o café, conversaram um
pouco sobre a viagem e outras banalidades. Então Laerte levantou-se e as
convidou para ir ao quarto ver sua mãe, que estava curiosa, pois tinha
percebido alteração na rotina da casa.
Depois do AVC d. Rosa tinha ficado com um lado todo
paralisado e sua fala era difícil. Mas entendeu o que o filho explicou e acenou
com a mão boa para que Suzana se aproximasse, e quando a jovem estava perto
dela ela fez um carinho em seu rosto, e uma lágrima escorreu de olhos de d.
Rosa. Suzana retribuiu o carinho com um beijo na mão de D. Rosa.
Quando voltaram para a sala a
mesa já estava arrumada, com uma toalha branca impecável, louça de porcelana
com pequenos ramos de trigo e Ana Luiza, ajudada por uma mulher trazia o
almoço.
Laerte convidou para que
sentassem a mesa, e Ana Luiza fez uma oração e começou a tagarelar sobre várias
coisas. Eles tiveram uma refeição agradável e farta e para sobremesa havia uma
torta que Laerte trouxera.
Depois do almoço Laerte pediu
licença e levou Suzana para sala, precisavam conversar, precisavam namorar.
Sentaram lado a lado no sofá.
Ele pegou a mão dela e disse:
-- Vamos recomeçar a partir de
hoje. Vamos deixar para trás esse nosso desentendimento que foi provocado por
fofocas. Mas, mais uma vez eu te peço. Acredita em mim. Eu não minto. Eu sou
uma pessoa simples, aberta que só quer te amar, e ter o teu amor. Me promete?
-- Sim. Tens razão. Precisamos
confiar um no outro. Eu te prometo, mas só não admito traição. Nunca!
-- Tens a minha palavra. Eu te
amo demais para procurar outra. Tu és a única.
Então se abraçaram e se beijaram e o olhar de Suzana brilhou outra
vez, e Laerte estava feliz. Nada e nem ninguém iria separá-los.
Eram quase quatro da tarde
quando d. Vera resolveu ir embora. Laerte queria que elas ficassem, tinha lugar
para elas dormirem, mas com a desculpa de que o marido estava só, elas foram
embora.
Foi tão rápida a visita delas.
Mas foi muito boa. Ele estava com muitas saudades de Suzana, e além do mais
eles puderam conversar e retomar o namoro.
D. Vera voltou para casa com
uma boa visão da família de Laerte. Comentou com o marido que eles moravam bem,
eram todos simpáticos e educados. Embora elas tivessem chegado de surpresa, o
almoço foi farto e variado. E além da torta que Laerte tinha trazido do
mercado, havia sobremesas de compota. A casa era grande, nova e bem mobiliada e
muito asseada.
Enquanto afastados Laerte pensava
muito em Suzana, lembrava os momentos de intimidade que tiveram, sobretudo da
primeira vez que transaram, que foi num
fim de semana que estiveram na praia. Ela era uma mulher fabulosa, quente e
sensivel e correspondia com audácia aos carinhos dele. Era deliciosa...
Os dias passavam e Laerte
estava feliz, ele iria retomar a
faculdade. As coisas tinham se ajeitado, sua mãe estava melhor dentro do
possível e Ana Luiza havia encontrado uma enfermeira para cuidar da mãe e sua
irmã estava retornando a administração do mercado.
Quando ele desceu do ônibus na
rodoviária de Porto Alegre, Suzana estava lá esperando por com um sorrido
lindo. E ela foi logo dizendo.
-- Estava morrendo se saudades
de ti.
-- Eu também, minha flor...
-- Bem, eu planejei algo para
nós...
-- Que bom, pra onde vais me
levar?
-- Ora para teu apartamento.
Espera até chegar lá.
-- Está bem.
E saíram abraçados, rindo,
estavam felizes.
Suzana estacionou o carro em
frente ao prédio e tirou umas sacolas do carro. Subiram, e enquanto ele tomava
um banho ela preparou um saboroso lanche para eles, comeram, conversaram e se
amaram. Ela passou a noite com ele, embora fosse em uma cama de solteiro.
Esse tempo em que Laerte e
Suzana tinham ficado distantes, serviu para ela aprender a valorizar a presença
dele. Agora ela o tratava diferente, sempre atenciosa, alegre e sem ser tão
manhosa. Ela realmente tinha crescido.
Tomara!
Houve entre ele e a família de
Suzana uma integração, que ajudou muito na relação dos jovens namorados.
Enquanto Laerte cursava a
faculdade de engenharia, Suzana cursava a faculdade de farmácia. Ambos andavam muito atarefados e viam-se
pouco durante a semana. E quando chegava sexta a noite eles estavam com
saudades um do outro.
Naquela tarde de sabado, os
namorados saíram para dar um passeio no
parque, estava um dia agradável de outono. De mãos dadas caminhavam devagar
apreciando a beleza das flores. Sentaram
em um banco a meia sombra e Laerte começou falar de seus planos para o futuro
deles.
“ Mais dois anos ele estaria
formado e eles casariam e iriam morar em
Santa Bárbara do Sul. Lá ele abriria uma empresa de engenharia e faria muitas
construções na cidade. E ela poderia ter uma farmácia. Seriam felizes e veriam
os filhos crescerem tranqüilos naquele lugar maravilhoso de morar. Um lugar
onde todos se conheciam, uma cidade pequena mas com muita vontade de
crescer....”
Suzana escutou tudo o que ele
falou sem interromper, deixou ele contar seu sonho. E ao final disse:
-- Mas esse não é o meu sonho!
-- Não? Qual é o teu sonho para
o nosso futuro, então?
-- Bem, eu sonho em me formar,
e ir trabalhar em um laboratório de cosméticos. Se for para sair daqui de Porto
Alegre, eu quero morar em uma cidade com praia e pode ser Floripa que é tão
charmosa. Não quero filhos. Tu sabes que eu gosto de festas e movimento, jamais
vou morar em uma cidade minúscula.
-- Mas tu nunca me falaste
sobre isso?
-- Agora estou falando.
-- Parece que não partilhamos
das mesmas idéias. Como não quer filhos? Eu quero ter filhos.
-- Dá muito trabalho e estraga
o corpo, não quero.
-- Então acho que devemos rever
algumas coisas, pois não poderemos seguir juntos se não dividimos do mesmo
futuro.
Laerte ficou sério e
preocupado. Aquilo não era brincadeira. Jamais ele imaginou que ela se oporia a
seus planos para o futuro. Mas ele voltaria para a sua cidade natal. Disso ele
não abriria mão e nem de sua profissão e tão pouco de sua descendência.
Laerte levantou e a convidou
para irem embora. Ele não falou nada no caminho de volta. Ela também estava
calada. Quando chegaram ao portão da casa dela, Laerte despediu-se dela e foi
embora.
Suzana ficou parada olhando ele
se afastar. Ela não esperava isso dele. Era um sábado, e nem eram cinco da tarde
e ele já tinha ido embora. Ela entrou e foi para seu quarto. Seus pais não
estavam, e ela estava sozinha em casa. Tinha planejado tanta coisa para essa
noite. Faria ele dormir com ela. Laerte era tão certinho, tão respeitador, que
ela tinha ânsias de mexer um pouco com ele. Queria provocá-lo para ele
possuí-la. Mas agora...
Laerte foi para seu
apartamento. Ele tinha ficado preocupado. Jamais imaginou tanta diferença de
pensamento. Embora ele a amasse demais, um futuro junto dela seria uma
amputação de parte de sua vida. Ele precisa pensar.
Mais tarde ele ligou para ela e
ela não atendeu. Passou uns quinze minutos e o interfone tocou. Ele atendeu e
era Suzana. Laerte abriu a porta do apartamento para esperá-la.
-- Oi, vim passar a noite
contigo.
-- Como assim? E teus pais? E a
Maria?
-- Eles foram para praia e
avisaram que vão ficar lá, porque o conserto da piscina não ficou pronto. Então
vim para cá para não ficar só. A Maria eu dispensei.
-- Bem então eu vou pra lá
contigo. Aqui não tem conforto para ti. Sabes que tudo aqui é muito simples.
Vamos, disse ele pegando as chaves e a jaqueta.
Voltaram no carro dela. Aliás,
ele não tinha carro.
Ao chegar a casa dela, entraram
e foram para a cozinha. Ela tinha comprado uns petiscos e um vinho para eles.
Sentados no sofá da sala estavam comendo, bebendo e conversando. Não falaram
mais sobre a desavença da tarde. Mais tarde transaram e Suzana achou que tinha
ficado tudo bem outra vez. Ela não conseguia perceber a diferença que havia
entre eles.
Mas agora Laerte estava em
estado de alerta. Ele precisava ficar mais atento as coisas que ela dizia,
fazia e pensava. Ele queria noivar, mas teria que esperar para ter certeza de
que estava com a mulher certa para ele.
Ele sabia que ela o amava de
verdade, mas muitas vezes só amor não basta, é preciso os dois olharem na mesma
direção, terem os mesmos objetivos, caminharem na mesma estrada. Pois se não é assim, o amor se desfaz, e o casamento se
acaba. E vida vira um inferno.
Já era de manhã quando Laerte saiu. Chegou em
seu apartamento e ligou a TV para se distrair. Ele estava sem sono. Fez um café
e ficou mais uma vez pensando na vida que queria para si. Não conseguia absorver a reação de Suzana,
ela continuava fútil.
Os dias passaram e Laerte
estava a cada dia mais decepcionado com Suzana, que não crescia, voltara a ser
a garota mimada, e agora havia renovado sua amizade com Olivia, que era uma má
influencia. Ele já tinha falado para ela sobre isso. Não ia dizer mais nada. Na
verdade ele estava ficando cansado das infantilidades de Suzana.
As férias chegaram e ele foi
para casa. Esse ano iria passar as festas de fim de ano com sua família, tinha
convidado Suzana para vir com ele, mas ela recusou, dizendo que não deixaria de
ir para a praia com sua família. Ela gostava de movimento, de badalação.
Na praia, e como as famílias
eram muito amigas, Osmar passava o tempo todo com Suzana, que se queixava de
Laerte. E Osmar aproveitava para consolá-la. A levava para jantar, dançar,
passear de lancha, não saia do lado dela. Fazia todas as vontades dela, sem se
importar com o custo, e como dizia: ele mostrava para ela o lado” bom da vida”.
Em meados de janeiro Laerte foi
a Porto Alegre para renovar seu aluguel do apartamento. E foi ver Suzana,
queria entregar o lindo presente que tinha comprado para ela. Ela não estava,
tinha saído com Osmar.
A família de Suzana, agora
morava em uma bela cobertura no bairro mais nobre da cidade.
Laerte ficou furioso! Lá estava
Suzana dando ouvidos outra vez para aquele aproveitador. Laerte sentou no hall
do edifício e esperou por ela. Ela
chegou dando risada das coisas que Osmar falava muito intimamente ao ouvido
dela.
Quando eles chegaram, levaram
um susto, ao verem que Laerte os observava. Laerte se levantou e muito sério
disse:
-- Oi, eu só vim te trazer isso
aqui, eu comprei para ti.
-- Obrigada. Quando chegastes?
-- Hoje cedo. E já estou
voltando. Vim te dizer que nós precisamos rever nosso compromisso. Vamos nos
dar um tempo, No fim das férias conversamos, pois do jeito que está não dá.
Precisamos pensar se é isso mesmo que queremos.
-- Mas...
-- É isso. Tchau...
E Laerte saiu furioso, não
aceitava esse comportamento dela, que longe dele se dava ao desfrute com outro
rapaz, amigo?Nem tanto. Por isso “deu um tempo” no namoro.
Suzana ficou atônita com as
palavras de Laerte e mais uma vez Osmar aproveitou para desfazer a imagem de
Laerte.
-- Ele é assim. Não serve para
ti, quando vais entender isso.
-- Mas eu o amo...
-- Vou te ajudar a superar tudo
isso. Vou cuidar de ti. Vem...
E Osmar a abraçou e a levou em
direção ao elevador. Quando Suzana entrou na sala se deparou com sua mãe que
queria saber o que tinha acontecido. Mas Suzana correu para o quarto.
Suzana abriu o presente que
Laerte havia dado para ela. E quando ela viu a linda corrente com um coração de
ouro com o nome deles gravado. E ela chorou muito, com uma dor no coração. Por
quê? Por que era tão difícil para eles? Amavam-se, mas não combinavam. E ela
não conseguia ser a pessoa que ele gostaria que ela fosse.
No outro dia Suzana ligou para
Laerte, agradecendo o presente, mas não conseguiram conversar e acabaram os
dois chorando ao telefone.
O tempo passou, e Laerte
retornou para seu último semestre na faculdade. Ele havia pensado muito, e
havia decidido o que queria para sua vida. E Suzana não se encaixava na vida
simples e familiar que ele sonhava, com filhos e netos para alegrar sua
velhice.
Mas iria tentar mais uma vez.
Daria essa chance ao amor que eles tinham.
Retomaram o namoro e tudo
estava fluindo bem, a esperanças nasceu no coração de Laerte, até que um dia no corredor da faculdade ele escutou Osmar
falando de Suzana, contando que eles tinham passado o verão juntos, e que além
de bonita ela era muito “caliente”.
Laerte foi até Osmar e deu um
soco nele, sem dizer uma palavra. Pegou suas coisas e foi embora. Foi procurar
Suzana e pedir satisfação dela, sobre o que o idiota do Osmar estava falando
dela. E ela não teve como negar, e apenas se defendeu:
-- Nós estávamos dando um
tempo... Então ele era o meu braço amigo, nos envolvemos e transamos.
-- Transamos! Simples assim...
Eu estou fora. Para mim não dá, não sei dividir minha mulher com outros. O que
tu falas não dá para acreditar, juras amor por mim e se deita com o primeiro
idiota que aparece. Chega. Não faço parte disso.
-- Mas... Nós estávamos dando
um tempo...
-- Dando um tempo para refletir
e não para sair dando por ai. Agora é definitivo. Não quero mais, por mais que
eu te ame, não quero, não me serve, não suporto.
-- Me deixa explicar...
-- O quê? Explicar o que não
tem explicação. E quem foi que falou que “não queria traição” ? Não foste tu? E
agora me aplica uma? Não! Chega!
E Laerte foi embora sem olhar
para trás. Ela não merecia confiança e sempre foi supérflua... Mais uma vez com
o coração aos pedaços Laerte se afastou dela.
Chegou em seu apartamento
chorou feito criança, tomou um porre quando as lembranças tomaram conta de seu
pensamento.
Aquele semestre foi o mais
difícil para Laerte. Dedicou-se aos estudos e começou a planejar a sua empresa
de construção.
Eram os primeiros dias de
agosto quando se realizou a formatura. E Suzana estava lá, era a madrinha de
Osmar. Ela estava linda, seu coração deu pulos quando ela a viu, e seus olhos
não se desviavam dela.
Ele tinha convidado para
madrinha, Aline, uma conterrânea que também estudava em Porto Alegre, e estava
terminando o curso de arquitetura e como ele,
planejava retornar para sua terra.
Era uma moça muito bonita,
alta, elegante, simpática, tinha os cabelos cor de mel, os olhos castanhos e um
sorriso encantador. Vinha de uma família bem conceituada e tivera uma educação
rígida e era discreta e sensata.
Eles haviam se encontrado por
acaso no shopping, e depois disso passaram a se encontrar mais seguido. Ainda
não havia compromisso entre eles, mas estavam a caminho disso.
Na semana seguinte a formatura,
Laerte estava empacotando seus pertences, quando recebeu a visita de Suzana.
Ela entrou e olhou para ele e o beijou, um beijo de desespero, como que
querendo deter o que não dava mais para reter. Laerte retribuiu o beijo e
depois a afastou.
Suzana chorava e Laerte a
abraçou, fez um carinho em sua face, secou as lágrimas dela e a beijou. Suzana
enroscou-se toda nele, o provocando deliberadamente. Mas Laerte tinha
princípios, não faria isso com ela, embora ele estivesse cheio de desejos.
Mas ela sussurrou ao ouvido
dele.
-- Eu quero, eu vim me
despedir. Sei que não tem volta, mas quero essa última lembrança nossa.
E Laerte cedeu, e se amaram com
loucura, uma, duas, três vezes até ficaram sem fôlego. Ficaram abraçados e ela
perguntou:
-- Quando vais?
-- Amanhã despacho as minhas
coisas, entrego o apartamento e vou.
-- Vamos nos ver de novo?
-- Não sei...
-- Eu sei que fiz tudo errado, mas
eu continuo te amando.
-- Eu também continuo te
amando, mas tem coisas que não dá para mudar...
-- Eu pisei na bola quando
transei com Osmar, eu sei...
-- Bem eu preciso terminar de
arrumar.
-- Eu vou embora. Só vim me
despedir, e eu queria uma despedida especial, e isso eu consegui. Vai ficar na
nossa lembrança para sempre.
Laerte foi para Santa Barbara
do Sul para começar uma vida nova queria deixar as lembranças de Suzana para
trás. Ainda era muito forte a presença dela em sua vida. Ainda dominava seus
pensamentos e machucava seu coração.
Suzana voltou a sua rotina e
agora estava namorando Osmar para alegria das famílias. Eles formavam um belo
par, era o que todos comentavam. Mas seu coração pertencia a Laerte.
O tempo passou e Aline estava
se formando. Laerte foi a Porto Alegre para acompanhá-la como seu par no baile.
Aline estava linda, ele era muito sensual e ele dançou com ela toda a noite.
E naquela noite eles selaram um
compromisso. Ele via nela sua futura
esposa. Sabia que não poderia amá-la, pois seu coração ainda estava aos
pedaços, mas poderia respeitá-la e se
deixar amar.
Aline estava apaixonada por
ele, que era um homem bonito, moreno alto com olhos azuis e com um corpo forte,
e dono de um abraço muito acolhedor. Ela gostava de estar com ele, que era
gentil e carinhoso e muito envolvente.
Ele a convidou para trabalhar
com ele na empresa de construção. Já tinha um projeto encaminhado e ela como
arquiteta contribuiria muito para a beleza dos prédios que iriam construir.
Passado um ano Aline e Laerte
casaram. Estavam felizes, sobretudo
Laerte que tinha uma esposa que gostava das mesmas coisas que ele, que tinha
vontade ser mãe e que queria trilhar o
caminho com ele. E aos poucos ele começou amar. Não mais aquele amor louco, mas um amor
tranqüilo que ocasionava paz.
Agora casado prestes a ser pai,
Laerte sabia que tinha tomada a decisão certa. Era essa a vida que queria para
si.
Maria Ronety Canibal
Setembro de 2017.
IMAGEM VIA INTERNET