Janela para o amor
1962
Depois de cuidar de sua avó até
o fim, Rose fechou a casa e tomou o primeiro ônibus para Porto Alegre. Ela
estava ansiosa, não conhecia a cidade, porém estava cheia de expectativas.
Ela não era mais tão jovem, sua juventude
tinha ficado para trás, enquanto cuidava de sua querida avó, que tinha uma
saúde frágil.
Seu avô tinha sido o farmacêutico de pequena
vila, em que moravam. Sua súbita morte deixou todos perplexos. Agora, que
estava sozinha no mundo, Rose sentia-se pronta para viver a sua vida.
A esperavam na rodoviária o sr. e sra.
Durant, antigos vizinhos de seus avós, eles iram hospedá-la. Rose aceitou a
oferta, com a condição de pagar pelo quarto que ocuparia, assim sentia-se mais
independente.
Ao avistar o imponente prédio, que ficava na
confluência de duas importantes avenidas do bairro, Rose ficou um tanto
temerosa, pois era um prédio de quinze andares. O mais alto do bairro.
Edifício Saturno estava escrito em letras
douradas, em cima da enorme porta de ferro fundido, que dava acesso ao hall do
prédio. Além de uma portaria, haviam dois elevadores.
Rose nunca tinha andado de elevador, e temia
fazer um fiasco...
O apartamento ficava no décimo segundo
andar, e da janela de seu quarto, se descortinava uma linda vista, que abrangia
parte da cidade, assim como a ponte, as ilhas e o maravilhoso rio.
Rose logo soube que ali nunca ficaria
entediada, pois a janela além de iluminar a peça, lhe proporcionava uma bela
visão.
O grande sonho de Rose era estudar francês.
Ela tinha uma sincera admiração pelo povo francês, sua história e sobretudo por
sua culinária. Ela gostava de fazer doces.
Aconselhada pelo sr. Durant, ela
matriculou-se na Aliança Francesa. Estava contente, pois imagina que seria um
meio de interagir com os franceses.
Dias depois, quando chegava ao prédio, Rose
conheceu duas jovens moradoras do prédio, as irmãs: Sandra e Silvia. Ambas eram
simpáticas e acolhedoras. Logo a convidaram para passear pelo bairro e conhecer
o variado comercio que ali existia.
Silvia, a mais velha, estava noiva, e sua
maior preocupação era aprontar o seu enxoval. Sandra tinha conhecido um rapaz recentemente,
no baile da Reitoria. Ela estava muito feliz e esperançosa de iniciar o namoro,
já que ele tinha telefonado duas vezes.
Rose tinha recursos, herdados de seus avós,
mas ela queria trabalhar, só não sabia o que fazer? Como gostava de fazer
bolos, pensou em aceitar encomendas, mas a cozinha não era sua, portanto estava
fora de questão.
A amizade entre Sandra e Rose crescia. As
duas gostavam de olhar as vitrines com as novidades, e sempre terminavam a
tarde na confeitaria Alemã.
Silvia, mais caseira e preocupada com os
seus bordados, não as acompanhava com frequência, no entanto, quando estavam
juntas elas se divertiam bastante, e havia sempre muito assunto e boas risadas.
Como sempre, Rose estava na janela naquele
início de tarde, quando viu um caminhão de mudanças estacionar diante do
prédio. Logo, pensou:
-- Bah, hoje o elevador vai ser um caos. Vou
me arrumar e descer de escada para não me atrasar para minha aula de francês.
Ao chegar no último degrau, Rose suspirou.
Ela já havia contado, e eram 256 degraus que ela havia
descido. Só esperava não precisar subi-los, ao retornar de sua aula.
O saguão estava cheio de caixas, e poucos móveis.
Ela viu um homem maduro, de estatura baixa e nada bonito, conversando com o seu
Jair, o porteiro. E deduziu que aquele não era o novo morador.
Passou, cumprimentou e saiu ligeiro em
direção ao ponto de ônibus. Ali encontrou dona Ana, a mãe de suas amigas, que
também estava indo para o centro.
-- Como está a senhora? – Falou Rose
sorridente.
--
Estou bem obrigada. Temos um novo vizinho. -- Comentou dona Ana. – Segundo
soube é um bancário, vai trabalhar na agencia do prédio. Parece que é solteiro
e será teu vizinho de porta.
-- É? ... Por isso que a mudança tem muitas
caixas e poucos móveis. – Disse Rose rindo. – O nosso ônibus.
A conversa cessou. O único
lugar sentado, Rose deixou para dona Ana.
Uma sequência de dias chuvosos, fez com
que Rose ficasse em casa. A ela aproveitou esses dias para exercitar o seu
vocabulário de francês com o sr. e sra. Durant. Eles eram descendentes de
franceses e costumavam conversar na língua mão de seus antepassados.
Depois dos elogios que recebeu do casal, ela
se convenceu que realmente estava com uma boa pronuncia. Ela estava lendo um
romance em francês, um Honoré de Balzac original, que ela pegou na biblioteca
de sua escola de idiomas. Sabia que estava evoluindo.
A primavera por fim, mostrou a sua
plenitude.
E Rose voltou a abrir a sua janela e nela
ficar para apreciar as tardes primaveris.
---
Etienne, depois de se instalar no
apartamento, começou a observar os seus vizinhos. Ele era um homem sossegado, e
de pouca conversa. Já tinha conhecido alguns vizinhos que também eram
funcionários do banco. Foi convidado
para jantar com a família do gerente, Alcides Ribeiro.
No horário combinado ele bateu à porta, do
apartamento 808. Trazia um ramo de flores para a esposa
do colega. Era o que a educação exigia. A dona Vânia, agradeceu com entusiasmo:
-- São flores lindas. Muito obrigada. É
muita gentileza... Cecilia coloca no vaso... – Pediu ela a filha.
-- Venha, sente-se... – Disse Alcides. – Essas
são as minhas filhas: Clarice, a mais velha. Carmem, Cecilia e a caçula Célia.
-- Prazer em conhecê-las. – Disse Etienne admirando
a família de seu colega. As filhas eram moças bonitas.
Ele pode perceber que a mais velha devia
estar com 20 anos e a mais jovem com 13
anos.
Só esperava que esse jantar não fosse uma espécie de armadilha...
Naquela noite ele retornou aliviado para o
seu apartamento. A filha mais velha de seu colega, já estava comprometida. Etienne
não tinha intenção de casar, não por agora. Com 35 anos
e uma vida boa, ele não queria mudar o que estava dando certo.
Ele gostava de cozinhar, e nos fins de
semanas apreciava fazer pratos especiais e beber um bom vinho. Ler um bom livro
no fim de noite... As mulheres? Elas o decepcionaram... Nunca mais se entregaria
ao amor... Não até estar seguro de que a moça merecia o seu afeto.
---
Os dias passavam, e ele estava muito
curioso em relação ao comportamento da moça, que morava no apartamento ao lado,
que todos os fins de tarde, ficava na janela olhando o horizonte, por um longo
tempo.
Vários pensamentos sombrios passaram em sua
mente.
Intrigado, com tal comportamento, ele
passou a manter a sua janela aberta, e permanecer por ali. Ele podia vê-la parcialmente.
Não era uma jovem adolescente, e sim uma moça madura. Parecia triste... Será
que havia brigado com o namorado, ou era apenas saudades dele?
Precisava descobrir.
Etienne abriu o vidro com cuidado, e
debruçou-se sobre o parapeito. Olhou para baixo e sentiu uma vertigem. Ele
realmente não gostava de alturas.
-- Olá! – Disse ele, tentando chamar a
atenção da moça. No entanto o barulho do tráfego era intenso, e abafou o som de
sua voz.
-- Oláaa! – Gritou Etienne, olhando para a
moça.
Ela assustada olhou em volta, e sorriu ao
deparar com ele.
-- Olá! – Respondeu ela gentilmente.
-- Eu sou o Etienne Arles... Como é o teu
nome?
-- O meu nome é Rose Braun. Prazer em
conhecê-lo. – Disse ela alegremente.
-- O prazer é meu... – Disse Etienne, analisando
suas feições, da moça, na fraca luz do anoitecer. Ela é simpática, pensou, e
bonitinha... – Por que estás sempre na janela? Saudades de alguém?
-- Sim e não. – Respondeu Rose prontamente.
– Deixe-me explicar. Eu alugo esse
quarto. Embora o casal seja muito simpático e atencioso, e eram amigos dos meus
avós, eu me sinto uma intrusa na vida deles. E ficar na janela é a forma de eu
me distrair. Claro que eu gosto de ler, mas o fim de tarde é a melhor hora de
apreciar essa visão maravilhosa da cidade, da ponte, do rio... Eu sou
apaixonada por essa vista. Se eu fosse artista, já teria retratado essa beleza
numa tela.
Ele olhou o horizonte e percebeu que a moça
tinha razão. As cores que o céu assumia ao entardecer eram dignas de um quadro.
-- Tu aprecias as artes? – Quis saber Etienne,
já que ele era um grande apreciador e conhecedor das artes. Aliás, era essa a
sua profissão. Era avaliador de joias e artes.
-- Sim, mesmo não entendendo do assunto, eu
gosto de ver uma tela bem pintada... As cores me chamam muito a atenção.
Imagina pintar esse pôr do sol, e reproduzir essa paleta de cores, é
sensacional. Não achas?
A conversa evolui e eles ficaram na janela
até tarde da noite. Ele nem tinha jantado e estava com muita fome. Depois de
despedir-se de Rose. Etienne foi para cozinha descobrir o que tinha na
geladeira para comer.
Fez uma omelete e enquanto comia pensava na
moça da janela. Rose! Ela o tinha surpreendido... Era uma moça inteligente e interessante,
e apaixonada pela língua francesa. A sua língua mãe.
Ela não acreditou quando lhe revelou que
era francês... Que realmente tinha nascido em Nantes, no vale do Loire, e que
sua mãe fugiu da guerra... E o Brasil havia sido o país escolhido, como sua
nova terra.
Rose, naquela noite, fechou a janela e
dançou pelo quarto cantarolando uma canção francesa. Ele era maravilhoso,
pensou... Estava ansiosa para contar para as suas amigas... Elas não iriam
acreditar.
Era antes da 9h e
Rose já tocava insistentemente a campainha do apartamento 1501. Dona
Ana abriu a porta assustada. E logo perguntou:
-- Rose! O que está acontecendo?
-- Bom dia! Desculpe-me... acho que exagerei.
– Disse Rose humildemente. – A Sandra
está?
-- Sim. Lá no quarto. A Silvia está
amolada...
-- Outra vez? Coitada! – Disse Rose tomando a
direção do quarto das amigas. – Gurias vocês não vão acreditar... Eu tenho uma
coisa para contar...
-- O que foi agora? – Perguntou Sandra
impaciente.
-- Eu conheci um cara maravilhoso, ontem de
noite...
-- Aonde fostes? – Quis saber a Silvia.
-- Não sai de casa. Eu o conheci através da
janela. Ele é meu vizinho.
As amigas riram...
-- Como através da janela? Explica... –
Disse a Silvia.
-- Vocês sabem que eu gosto de olhar pela
janela. Ontem não estava frio e eu abri o vidro e fiquei admirando a paisagem.
E de repente o Etienne me chamou para conversar... Gurias! Ele é francês...
Nasceu em Nantes, e veio fugido da guerra com a mãe dele. O pai já havia
morrido lutando. E mãe pegou todas as coisas de valor e fugiu para a Espanha e
de lá pegaram um barco e vieram para cá. Legal...
-- Rose, quantos anos tu tens? – Perguntou
Silvia.
-- Ora, tu sabes. Eu tenho 24
anos.
-- Então por que estas te comportando como
uma adolescente de 14 anos?
-- Ah... – Disse Rose dançando pelo quarto.
– Porque eu estou apaixonada!
--
Hum... De repente o amor! É isso? – Provocou a Sandra.
-- Exatamente. Foi assim que aconteceu...
Aquela voz aveludada me seduziu...
Até dona Ana que estava chegando à porta do
quarto, com uma xicara de chá, para a Silvia, riu.
-- Não riem... Quando vocês conhecerem o Etienne
vão me entender.
-- E quando vamos conhecê-lo? – Perguntou
dona Ana.
-- Bah... eu não sei.
-- No outro sábado eu vou fazer uma janta
especial. É o aniversário do Paulinho. Convide o Etienne, e nós poderemos observá-lo,
sem que ele perceba. Depois conversaremos. Combinado?
-- Combinado. – Disse Rose preocupada. – E
se vocês não gostarem dele?
-- Rose, não é questão de gostarmos. Tu é
que deves desenvolver esse sentimento. Só queremos ver se ele é uma pessoa
direita. O que ele faz?
-- É funcionário do banco, avaliador de
obras de arte e joias. Ele é um homem de 35 anos.
Não é uma criança.
-- Eu entendo. Mas mesmo assim o convide
para o aniversário do meu filhote.
-- Vou convidar. – Disse Rose
decepcionada. – Desculpe essa invasão. Eu preciso ir. Tchau...
Rose saiu pensativa. Todo o seu entusiasmo
havia murchado. Seria ele um homem aproveitador? Como se identifica um
cafajeste?
Como eles haviam combinado, naquele fim de
tarde mais uma vez, Rose e Etienne abriram suas janelas para poderem conversar.
Ele gentilmente ofereceu a ela uma rosa vermelha. Rose ficou sensibilizada,
nunca tinha ganhado um flor. Nunca!
Ah, esse homem era um cavalheiro, era
gentil, educado e no sábado ela mostraria a todos, o quanto ele era valoroso.
Os dias passavam e as conversas começaram a girar
para o âmbito mais pessoal. Etienne aceitou o convite, e no sábado os dois,
pela primeira vez iriam se ver sem estarem na janela.
Ela tinha receio de que ele fosse de
estatura muito baixa, e talvez ela fosse bem mais alta do que ele. Mas que
importância isso teria? Pensou ela com racionalidade. O que importava era o
modo como ele a tratava...
Ela escolheu vestir o seu vestido mais
novo. Era na cor verde esmeralda, e realçava seus cabelos escuros em contraste
com a sua tez clara.
Um toque a campainha fez com Rose corresse
para o hall. Acenou para o sr. e sra.
Durant. Ela abriu a porta, e diante dela estava um homem elegante. Sentiu-se
orgulhosa. O dois formavam um par na medida certa. Embora ele não fosse muito
alto, ele ficava a sua altura, com ela usando sapatos de salto. Perfeito!
Etienne a olhou de cima a baixo, e depois
fixou seu olhar em seu rosto, precisamente em seus olhos e comentou:
-- São âmbar... Eu estava curioso para
saber a cor dos teus olhos. E eles tem uma tonalidade especial. São perfeitos.
Tu estás linda!
-- Obrigada! – Disse Rose sentindo suas
bochechas quentes. – Vamos? São três lances de escada, ou preferes o elevador?
-- Como quiseres... – Disse ele a seguindo
em direção a escada.
Etienne foi aprovado por dona Ana, que segredou
ao ouvido de Rose:
-- Querida, ele é um homem gentil,
simpático, educado e culto. Olha como ele conversa com os homens. E vou te
dizer mais, ele está apaixonado por ti, pois está todo o tempo te olhando.
Aproveita!
Rose sorriu. Seu namorado... namorado? Ela
não sabia se eles eram namorados, ou bons vizinhos... Precisava descobrir, mas
como?
Naquela tarde de quinta-feira, um feriado,
Rose se arrumou e foi para a janela. Etienne já a esperava. Uma caixa de
bombons, foi o presente que ela recebeu. Mais tarde eles brindaram com vinho.
Assim os dias passavam, e todos os dias
eles conversavam, ou namoravam pela janela. Rose ainda não sabia o que era. Ele
era muito gentil e educado, mas nunca a convidava para sair.
Sandra estava desconfiada de que ele pudesse
ser casado... Pois pelo menos um fim de semana por mês, Etienne, viajava. Um mistério!
Decididas a descobrir mais sobre a vida de Etienne,
Sandra e Silvia convocaram os seus namorados a se aproximarem dele. Gilberto, o
noivo de Silvia não aceitou se envolver, mas Antônio, o namorado de Sandra, ficou
animado em ajudar.
Muito simpático e nada tímido, Antônio
passou a conversar seguidamente com Etienne. Até no apartamento dele esteve. E
ele descobriu que ele viajava seguidamente a Pelotas, onde visitava um casal de
idosos.
Etienne contou para o amigo, que devia muito
àquele casal. Explicou que ao chegar ao Brasil, sua mãe foi trabalhar como
governanta numa casa em Pelotas. O casal, que não tinha filhos, aceitou o garoto,
e o mimou como se fosse da família. Etienne tinha 13
anos,
e foi logo matriculado numa boa escola da cidade. O casal o ajudou até que ele completou
os seus estudos, no curso superior. Com o curso de História da Arte, ele
tornou-se um avaliador, não só de joias, como também de telas e objetos de
arte.
Com a morte de sua mãe, alguns anos
depois, o casal não permitiu que Etienne deixasse a casa sem estar formado. Ao
ingressar no banco e precisando trabalhar em outra cidade, foi a maneira de
deixar o casarão.
Mas a relação com os antigos patrões de
sua mãe, se manteve. Não só como retribuição a generosidade deles, sobretudo
porque os amava como se fossem seus avós.
Os sobrinhos e demais familiares, não
gostavam de Etienne e já tinham afirmado, que se “os velhos” o fizesse seu
herdeiro, eles iriam discutir na justiça. “Ora um estranho, o filho da emprega,
ser herdeiro daquela fortuna...”
-- Mas a verdade é que o único que os visita,
sou eu. Tenho muita vontade de levar a Rose para conhecê-los. Porém não posso sair
sozinho com ela. O que iriam falar... –
Disse Etienne.
-- Vamos combinar. Eu e a Sandra o acompanhamos.
Enquanto vocês os visitam, nós passeamos pela cidade. Vamos no meu carro. Acho
que dona Ana permite. Levamos o Paulinho junto. Que achas? – Disse Antônio
animado.
-- Seria muito bom. – Disse Etienne
sorrindo.
Mais tarde, naquele mesmo dia, os casais
saíram para ir ao cinema. O filme se desenrolava, mas Rose não estava prestando
atenção ao que se passava na tela.
Etienne havia pegado a sua mão, e a olhava como
se quisesse roubar um beijo. O coração de Rose estava disparado, e ele não
precisaria roubar, pois ela lhe daria um beijo de bom grado.
E o beijo aconteceu...
Eles deixaram o cinema de mãos dadas, Sandra
viu, mas nada disse. Apenas sorriu para a querida amiga.
A ida a Pelotas foi aprovada por dona Ana.
Paulinho andava eufórico, iria conhecer uma nova cidade. Ele gostava de
conhecer novos lugares. Dizia para sua mãe que iria ser aviador, só para estar
sempre viajando.
Era muito cedo, quando no domingo eles
pegaram a estrada em direção a região sul do estado. A paisagem era bonita, e
todos estavam animados.
Paulinho observava tudo, e fazia muitas
perguntas a Etienne, já que ele conhecia muito bem a estrada. Havia ainda um
trecho em obras, e ali tiveram que esperar, já que apenas meia pista estava
liberada ao trânsito. Mais para diante a estrada não estava asfaltada, e com o
tempo seco tinha muito pó. Mas tudo foi divertimento.
Os amigos de Etienne foram recebidos com
carinho e alegria pelo casal Heitor e Raquel Martin. Sandra e Rose ficaram impressionadas
com a beleza do casarão.
-- Os amigos do Etienne serão sempre muito
bem vindos a nossa casa. – Disse Raquel. – Ele é o filho que a vida nos deu...
Somos muito gratos a Etienne pelo carinho que ele tem por nós.
Etienne ficou encabulado com a declaração de
amor de Raquel. Mas ele retribui dizendo:
-- Eu que recebi o melhor presente, ter
vocês em minha vida. E para demonstrar o quanto isso é verdade, hoje eu trouxe
a minha namorada para conhecer a minha família brasileira. Meus queridos: essa
é a Rose.
--
Venha mais perto... – Disse Heitor rindo. – Preciso te falar um segredo... – E
ele cochichou ao ouvido de Rose, fazendo com ela ficasse com as faces
vermelhas.
-- Aqui está a Sandra, Antônio e o Paulinho.
– Disse Etienne completando as apresentações.
O dia transcorreu em clima de alegria. Dona
Raquel havia mandado preparar um saboroso almoço. Depois do almoço os jovens
saíram para dar uma volta pela cidade, permanecendo com os velhos apenas Rose e
Etienne.
A conversa foi agradável, e Rose ficou
sabendo um pouco mais sobre a personalidade de seu namorado. O que ela pode
concluir é que Etienne era o melhor homem que poderia ter aparecido em sua vida.
Eles deixaram o casarão com a promessa de
voltarem preparados para passar um fim de semana inteiro com Heitor e Raquel,
que acenavam enquanto o carro se afastava.
Etienne saiu levando a valiosa coleção de
selos de Heitor, que havia lhe dado de presente, e Rose com algumas fotos
antigas de Etienne, assim como da mãe dele.
Sandra queria saber qual o segredo que seu
Heitor havia cochichado com ela, mas Rose respondeu:
-- Se é segredo não posso revelar...
-- Nem a mim? – Perguntou Etienne, agora
muito curioso.
-- Um dia, talvez, eu conte. – Disse Rose
rindo.
Cansado Paulinho dormiu na viagem de volta.
Eles chegaram a Porto Alegre, quando já tinha anoitecido.. Dona Ana, que os
esperava ansiosa e preocupada. Mas os abraçou com alegria e serviu o jantar.
Ela queria saber todos os detalhes do passeio.
O tempo passava e o namoro prosperava. A
pedido de Raquel, quando Etienne ia a Pelotas sempre levava Rose. As duas
mulheres haviam se entendido e uma sincera amizade as unia.
O verão foi um tempo especial. Etienne, no
seu período de férias, passava os dias passeando com a namorada. Andaram por
toda a Porto Alegre, foram a praia de Tramandaí e também a Gramado. Esses
passeios mais longos eram na companhia de Antônio e Sandra, e claro o Paulinho.
A rotina do trabalho fez com que os
namorados voltassem a conversar pela janela. Etienne estava inconformado. Ele a
queria ao seu lado... e para sempre.
A pediu em casamento.
E Rose aceitou.
-- Mas vocês não têm nem tempo de namoro e
já querem casar? – Indagava dona Ana. – Veja a Silvia só de noivado são dois
anos. Eles recém marcaram a data para setembro. Ainda vão esperar mais cinco
meses. Acho que vocês estão muito apressados.
-- Nós não somos mais crianças. Sabemos o
que queremos. E nos gostamos e nos entendemos perfeitamente. —Explicou Rose.
-- Mãe, ela já aceitou o pedido dele. – Disse
Sandra a sua mãe. – O que tu achas
Silvia?
-- Eu acho que se eles têm condições de
casar, que se casem e sejam felizes. Eu e o Gilberto estamos nesse ritmo,
porque precisamos, não temos dinheiro. É aos poucos que estamos comprando os
nossos moveis. Se pudéssemos já estaríamos casados. Se há amor, por que
esperar?
-- Viu, a Silvia pensa como eu. – Falou
Rose com um sorriso de felicidade. – No sábado vamos a Pelotas, contar a
novidade para os velhos.
-- Bem, se estás seguras... – Disse dona
Ana. – Desejo que sejam muito felizes. Eu gosto muito de ti, Rose, é como se
fosse uma filha, e claro também gosto do Etienne, é um bom rapaz. Quero que
sejas feliz.
-- Obrigada, dona Ana. Vocês são a minha
família. – Afirmou Rose abraçando dona Ana.
-- Bah, agora vai virar choradeira. – Disse
Sandra emocionada.
---
-- Que belo anuncio. – Falou Heitor
levantando-se e abraçando Etienne e Rose. – Vamos fazer uma bela festa, não é
Raquel.
-- Sim, vamos. O nosso menino merece, e a
Rose também. Foi aqui, nesta cidade, que o Etienne cresceu e estudou, fez bons
amigos. – Disse Raquel. – E já estou pensando em hospedar os teus amigos de
Porto Alegre. Temos espaço suficiente neste casarão. Vou mandar arejar os
quartos...
-- Obrigado!
– Falou Etienne – Mas será um estorvo para vocês, tudo isso.
-- De modo algum. Estamos velhos, mas
ainda temos condições de organizar uma festa. Fiz muitas aqui nestes jardins.
Deve te lembrar. —Disse Raquel com energia.
-- Nós ficaremos muito gratos. – Interveio
Rose.
Etienne olhou para a sua noiva
surpreendido, porém nada disse. Apenas afirmou com um movimento de cabeça.
-- E o vestido de noiva será um presente
nosso. —Disse Heitor.
Os dias passaram rapidamente.
No dia 25 de
maio de
1963,
na Catedral São Francisco de Paula, Rose entrava no templo pelo braço de seu
Heitor, para dar-se em casamento ao seu noivo Etienne Arles.
Rose estava linda, vestida de noiva. Era um
vestido de veludo branco, de manga longa e com um discreto bordado de pedrarias
no decote. A grinalda com flores brancas segurava um longo véu.
Etienne a esperava no altar com um sorriso
de felicidade. Eles estavam unindo as suas vidas diante de Deus, para formarem
uma família.
Dona
Ana chorava emocionada. Estava feliz, Deus havia atendido as suas preces, pois
Rose encontrara uma família para amar e ser amada. Ela era uma pessoa
maravilhosa e merecia toda a felicidade do mundo.
Uma bonita recepção aconteceu nos salões do
casarão, que reviveu seus tempos de festa. Os convidados foram selecionados, e
os amigos mais queridos, de Etienne, se fizeram presente com as suas esposas.
Após a festa eles fugiram para a suíte de
um hotel. Precisavam de privacidade. No dia seguinte viajaram para Montevideo.
---
Rose mudou-se para o apartamento do marido
e muito feliz ela dizia:
-- Agora não precisamos mais namorar pela
janela. Podemos ficar bem juntinhos no sofá.
A vida seguia seu ritmo.
Logo a vida matrimonial deu frutos.
Primeiro nasceu Luís e dois anos depois chegou a Anete.
Heitor e Raquel viveram para conhecer as
crianças.
Etienne foi agraciado no testamento, para
surpresa dele.
Rose e Etienne viviam o amor verdadeiro e
duradouro. Formavam uma família feliz.
Agosto de 2022
Essa
história não é real, mas os fatos nela relatados sim. De fato, foi através da
janela que eles se conheceram, namoraram e casaram...
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